O acidente que vitimou Juliana Marins no Monte Rinjani, na Indonésia, não é apenas uma tragédia pessoal – é um espelho incômodo sobre as fragilidades do turismo de aventura quando este se distancia do profissionalismo. Precisamos ser diretos: existe uma diferença fundamental entre viver uma aventura pessoal, com seus riscos, perigos e incertezas, e contratar um serviço de Turismo de Aventura. No primeiro caso, há liberdade individual. No segundo, há uma relação comercial de consumo, que exige dever de informação, profissionalismo, segurança e responsabilidade.
Juliana, pelo que se apurou, fazia uma viagem no estilo mochilão, como muitos de nós já fizemos. E nesse tipo de jornada econômica, buscar opções mais baratas é parte do jogo. Mas no turismo de aventura, o barato muitas vezes tem um custo alto demais, e o uso de equipamentos específicos, conhecimento técnico, protocolos de segurança, manutenção e capacitação constante são essenciais para uma experiência com riscos reduzidos. O turismo de aventura sério trabalha com risco, mas nunca com improviso.
O problema é maior quando se constata que o guia contratado por Juliana estava proibido pelas autoridades locais de atuar naquela trilha em razão de problemas anteriores. Era um guia/condutor pirata, fora de qualquer sistema de controle ou credenciamento. Não havia respaldo técnico, não havia um plano de atendimento a emergências. E talvez, mais grave, não havia como o consumidor saber disso com clareza. A ausência de plataformas públicas confiáveis, de fiscalização eficiente e de punição exemplar permite que esses “profissionais” sigam operando impunemente – não só na Indonésia, mas também no Brasil. A informalidade e o amadorismo não elevam os padrões de qualidade, segurança e sustentabilidade do Turismo de Aventura nem aqui, nem acolá!
Trata-se de reconhecer que há responsabilidades compartilhadas: o Estado precisa fiscalizar, os operadores precisam atuar com ética e preparo técnico, e o consumidor precisa escolher com consciência. Porque o turismo de aventura é, sim, uma experiência que transforma. Mas quando é levado a sério.
No caso de Juliana, se não bastasse a situação do guia contratado, que estava legalmente impedido de conduzir turistas, o atrativo natural não dispunha de um plano de busca e salvamento para casos de acidentes. Por se tratar de uma trilha que ascende um vulcão com mais de 3 mil metros de altitude com condições meteorológicas muito instáveis e extremas, o resgate foi, infelizmente, demorado e ineficaz. Mas mesmo quando o contexto é adverso, é preciso haver preparação. No Brasil, já tivemos iniciativas como os GVBS – Grupos Voluntários de Busca e Salvamento criados no âmbito do Programa Aventura Segura da ABETA.
Essa proposta reunia profissionais de turismo de aventura locais, voluntários e organizados para atuar em parceria com a Defesa Civil nas operações de busca e resgates em acidentes com turistas. Essa iniciativa infelizmente não teve continuidade, e penso ser importante uma retomada desses GVBS integrados com os grupos da Defesa Civil. Porque resgatar vidas não é uma operação eventual. É parte da responsabilidade de quem atua nesse segmento. E não se trata de culpar a vítima. Trata-se de reconhecer que há responsabilidades compartilhadas: o Estado precisa fiscalizar, os operadores precisam atuar com ética e preparo técnico, e o consumidor precisa escolher com consciência. Porque o turismo de aventura é, sim, uma experiência que transforma. Mas quando é levado a sério. Quando é operado com responsabilidade, com transparência, com investimentos e com profissionalismo.
O que aconteceu com Juliana poderia ter acontecido com qualquer um e em qualquer lugar onde o risco real se mistura com negligência, imprudência ou imperícia. Que a trágica morte dela nos sirva de alerta e nos mova à ação. Porque o turismo de aventura só faz sentido se for seguro. E segurança, neste caso, não é opcional. É obrigação.
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