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O Panamá é um pequeno país centro-americano de 75.420 km2 e 3.360.000 habitantes, números mais ou menos equivalentes aos da Paraíba (56.500 km2 e 3.700.000 habitantes). Sua importância para o mundo, entretanto, extrapola em muito essas cifras. É que o Panamá abriga um canal de 77 km de extensão, construído pelo homem em 1914, para ligar os Oceanos Atlântico e Pacífico encurtando em muitos dias a navegação entre a Europa e a Costa Oeste dos Estado Unidos entre outras rotas marítimas. Pela alternativa, ao redor do Cabo Horn, um navio que estivesse indo de uma costa dos Estados Unidos à outra teria que navegar cerca de 13 mil quilômetros a mais.
O Canal é o centro nevrálgico da economia panamenha, gerando milhares de empregos e muitos milhões dólares em taxas de uso. Nem sempre, entretanto, sua administração esteve sob a responsabilidade do Governo do Panamá. Com efeito, desde sua abertura até 1977 foi administrado pelos Estados Unidos que mantinham o Canal cercado e isolado do resto do país, tratando-o de fato como uma parte do território estadunidense. De 1977 até 1999 a administração foi feita de forma conjunta entre os governos panamenho e norte-americano e somente a partir de 31 de dezembro de 1999 o Canal foi definitivamente entregue aos panamenhos.
O momento histórico, não sem razão, é comemorado com júbilo em todo o país. Poderia igualmente ser aclamado pelo movimento ambientalista, afinal a devolução do Canal ensejou a criação de três Parques Nacionais em suas margens e na bacia do principal rio que o supre de água. Omar Torrijos, o general do exército panamenho que negociou a devolução do Canal com os Estados Unidos era um sujeito com visão de longo prazo. Entendia a importância econômica da Hidrovia. Ora, Canal sem água não funciona, e água sem rios não existe. Torrijos sabia que precisaria contar com os serviços ambientais da natureza que circunda a Hidrovia para garantir seu pleno funcionamento. Mas como fazer isso em um país pobre e sem muita infraestrutura, justamente em sua área mais populosa e entre suas duas maiores cidades, Colón e a Cidade do Panamá? Simples: Toriijos tornou-se um dos maiores conservacionistas de seu país.
Com isso, de imediato deslocou para longe do Canal a pressão para construir novos bairros populares e estender a fronteira agrícola com plantações para abastecer os mercados urbanos do país. Em 1980, sob sua inspiração foi decretado às margens da Hidrovia, o Parque Nacional Soberania, com 19.341 hectares. Anos mais tarde, em 1992, ainda de acordo com projeto visionário do agora falecido Torrijos e sua equipe, foi criado o Parque Nacional Caminho de Cruzes, com 4.590 hectares. Este último é contíguo ao primeiro e se estende até a periferia da Capital onde se conecta com o Parque Metropolitano, servindo assim também de corredor ecológico ente os dois.
Entre a criação dos PNs Soberania e Caminho de Cruzes, foi estabelecido em 1985, com 129 mil hectares, o Parque Nacional de Chagres, que não é ribeirinho ao Canal mas protege a bacia do rio do mesmo nome, responsável por cerca de 40% de toda a água da via artificial. As águas do rio Chagres dão vida ao Canal. Foram elas que foram represadas em 1914 para criar o lago Gatún, fundamental na regulação do fluxo da Hidrovia. Por outro lado, graças ao Canal, o Rio Chagres é o hoje o único do mundo que desemboca em dois oceanos.
Chagres, Soberania e Caminho de Cruzes conformam um mosaico perfeito com os 35.929 hectares do Parque Nacional Portobello, criado no litoral caribenho do país em 1976. Como é comum no mundo em desenvolvimento, nenhum dos quatro Parques tem um manejo topo de linha. Portobello por exemplo se assemelha mais a uma APA brasileira do que a uma unidade de preservação integral. Em seu interior há fazendas, estâncias de fim de semana e até mesmo uma pequena cidade cujas fortalezas coloniais espanholas são Patrimônio Mundial da Humanidade. Caminho de Cruzes, por suas vez, quiçá pela proximidade com a Cidade do Panamá, encontra-se muito degradado e infestado por espécies exóticas. Mas há um esforço consciente de investir em sua recuperação. Nesse sentido estão em curso ali vários projetos de reflorestamento custeados com fundos de compensações ambientais, muitas delas oriundas de obras de expansão e manutenção do próprio Canal. Também está sendo feito um trabalho de restauração da estrada colonial que ligava um lado ao outro do país, permitindo assim o escoamento do ouro entre o Peru e a Espanha: o metal era desembarcado na Cidade do Panamá, carregado por terra até Colón e Portobello e daí embarcado para a Europa. O Caminho das Cruzes dá nome ao Parque. Espera-se que, quando restaurado, possa servir como ponta de lança para a atração de empresas de ecoturismo, atividade que, ao contrário da vizinha Costa Rica ainda é muito incipiente no país.
Soberania e Chagres, por outro lado são Parques Nacionais bastante bem preservados, com mata primária onde já foram catalogadas 1.300 espécies vasculares e onde se destacam as figueiras (sobretudo, mas não somente, ficus insipida), sobressaem as ceivas (ceiba petandra) e abundam as orquídeas de vários tipos. Entre os quatro parques há ampla troca genética de uma fauna que ainda parece estar em bom estado de conservação. Ao longo de uma rápida trilha de seis quilômetros no Parque Nacional Soberania é possível ver sem dificuldade macacos, preguiças, quatis e tucanos. Segundo os estudiosos, há muito mais: gatos do mato, onças, antas e jacarés são apenas alguns dos animais inventariados em um estudo da Autoridade Nacional do Ambiente do Panamá. Esse mesmo documento lista no mosaico do Canal a ocorrência de 105 espécies de mamíferos, 525 de aves, 79 de répteis, 55 de anfíbios e 36 de peixes de água doce. No Parque Soberania, em 1996, foi batido o recorde mundial de observação de pássaros em um só dia Na ocasião foram observadas na Trilha do Oleoduto todas as 525 espécies que ocorrem na região.
De certa forma é incrível que uma via de transportes por onde passam cerca de 15 mil navios todos os anos seja a razão de ser de um mosaico de quatro Parques Nacionais. Mas é. E embora a necessidade de sua criação fosse óbvia, ela não teria sido possível sem o pulso firme de um sujeito conhecido por ser grande entusiasta da reforma agrária, o General Torrijos que, ao assinar o Tratado que devolveu o Canal ao seu país afirmou: “Vamos fazer das terras revertidas pelos novos tratados do Canal do Panamá o uso mais coletivo possível para que a maior parte do Povo panamenho possa desfrutar do esforço da sua luta”. Em um continente de ditadores e coronéis quase sempre associados com o interesse de uns poucos membros da elite é admirável que Torrijos tenha conseguido implementar sua visão.
Omar Torrijos morreu em 1981 quando seu avião explodiu em pleno ar, episódio que o historiador americano John Perkins atribui à CIA e ao Governo Reagan. Cinco anos depois a História reconheceu o seu valor para a causa ambiental, não importando se a motivação foi econômica ou não. Em 1986, com 25.275 hectares, foi criado em uma das regiões mais bem preservadas do país, a Cordilheira Central do Panamá, o Parque Nacional General de Divisão Omar Torrijos Herrera.
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