O excesso de gás carbônico na atmosfera elevou ainda mais a demanda por água em plantações que formam a base da alimentação humana: soja, milho, arroz e trigo, revela um estudo publicado na terça-feira (28) pela revista científica Nature Climate Change. Uma plantação de um hectare consome hoje cerca de 5 mil litros de água a mais, por dia, do que consumia em 1958, e isso se deve apenas ao acréscimo de carbono no ar.
A necessidade de irrigação extra – a ponto de tornar algumas culturas quase insustentáveis – não é uma novidade em si. Ela se deve também a outros dois fatores relacionados às mudanças climáticas: o aumento da temperatura do ambiente, de cerca de 1° Celsius em média desde o período pré-industrial; e à distribuição desigual das chuvas, hoje mais concentradas ou deslocadas de seus pontos originais. Esta foi a primeira vez, no entanto, que a variação do carbono na atmosfera foi incluída em um simulador de sistemas de produção agrícola, o APSIM, para avaliar o efeito do gás em cada um dos cultivares, de 1948 até 2013, em regiões dos Estados Unidos, da Europa, da América e da Ásia.
As condições atmosféricas mudaram bruscamente nesse período. A quantidade de carbono, por exemplo, passou de 316 partes de carbono por milhão em 1958 para 403,3 partes por milhão no ano passado, de acordo com a Organização Meteorológica Mundial – e a tendência é bater novos recordes nos próximos anos. “Se somarmos o clima mais quente às chuvas escassas e ao carbono em excesso temos uma equação muito desfavorável às plantações”, diz o climatologista Daniel W. Urban, da Universidade Stanford, um dos autores do estudo. Segundo ele, a demanda por água vai crescer à medida que as mudanças climáticas se tornarem mais severas
O efeito de elevar alguns décimos na temperatura e aumentar a concentração de gás carbônico no ar é uma fotossíntese mais intensa e, consequentemente, uma necessidade maior de água, para que seja absorvida pelas raízes. Isso porque o aumento da temperatura eleva a evaporação a partir do solo e faz as plantas transpirarem mais. O mesmo acontece com a uma presença maior de gás carbônico na atmosfera, intensificando o processo de fotossíntese. “Nestas condições, as raízes pedem mais água do que o solo pode oferecer e acontece o que se chama de déficit hídrico. O resultado é uma grande perda de água para o ambiente e uma fragilidade maior das culturas relacionadas, o que pode ameaçar a segurança alimentar da população”, diz o engenheiro agrícola Eduardo Assad, da Embrapa.
A produção de trigo nos locais pesquisados foi a que mais sofreu com as mudanças climáticas. Cerca de 86% das plantações registraram um aumento na demanda por água de 2,3% a 3,6% por década, se comparada ao registrado em 1981. O trigo é hoje um dos alimentos mais consumidos mundialmente, algo em torno de 737,8 milhões de toneladas ao ano, ao lado do milho e do arroz. Outra característica desfavorável ao trigo é que ele depende de temperaturas mais amenas para se desenvolver. No Brasil, pesquisadores investem em melhoramentos genéticos para tentar aprofundar as raízes da soja e diminuir dependência da demanda de água.
Republicado do Observatório do Clima através de parceria de conteúdo. |
Leia Também
Cerrado pode ser um dos grandes afetados pelo aquecimento global
Leia também
Cerrado pode ser um dos grandes afetados pelo aquecimento global
Este hotspot de biodiversidade pode se transformar em grande emissor de carbono caso a temperatura se eleve. Menos de 8% do Cerrado está protegido. →
Panamazônia sofre com mudanças climáticas
Variações climáticas têm afetado a sociobiodiversidade dos países amazônicos. Cientistas divergem sobre futuro da floresta no Brasil. →
Mudanças climáticas: ameaça silenciosa aos polinizadores
Mariposas, abelhas, borboletas, aves e morcegos estão em perigo e nós também, pois eles garantem a produção de um terço dos cultivos mundiais. →