Teve início nesta quarta-feira (8), a Cúpula Mundial de Povos Indígenas e Natureza (World Summit of Indigenous Peoples and Nature), que ocorre em paralelo ao Congresso Mundial da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). É a primeira vez que o encontro – que reúne mais de 100 lideranças de todo mundo em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos – ocorre de forma presencial. O evento, que segue até o dia 10, abriu os debates com falas fortes sobre a necessidade de não apenas reconhecer a contribuição dos indígenas para proteção da biodiversidade e do enfrentamento e adaptação à crise climática, mas também de financiamento e inclusão dos povos originários em espaços de tomada de decisão.
“Mais do que reconhecer a importância dos indígenas para conservação, os indígenas precisam ser colocados nos espaços de tomadas de decisão e ocupar cargos estratégicos”, afirmou a presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) do Brasil, Joenia Wapichana, uma das painelistas do primeiro dia da cúpula.
Por vídeo, a ministra dos Povos Indígenas do Brasil, Sônia Guajajara, também participou do evento, reforçando a importância da participação indígena nos debates sobre conservação.
A cúpula mundial foi organizada conjuntamente pela IUCN, o Fórum Internacional Indígena sobre Biodiversidade (IIFB) e a Iniciativa PODONG de Povos Indígenas. O evento ocorre de forma paralela ao Congresso Mundial de Conservação da IUCN e reúne lideranças indígenas, organizações filantrópicas, de conservação e atores do setor privado.
Os discursos das lideranças de diferentes países que falaram no primeiro dia da cúpula estavam alinhados: não é possível discutir soluções para crise climática sem incluir os povos originários. O reconhecimento ao direito sobre os territórios e o financiamento dos povos também foram tópicos muito mencionados.
“Estamos falando há muito tempo das mudanças climáticas e que os povos indígenas têm as soluções. É tardio [esse reconhecimento], mas é a hora certa. O planeta começou a entender que não dá mais para falar de qualquer pauta ambiental sem trazer o indígena para o centro do debate, se não falar de financiamento climático para a ponta, de quem mais precisa e quem mais faz a proteção, que são os povos indígenas. E a demarcação de territórios indígenas também, que é o que, comprovadamente, ainda está fazendo a Amazônia e o planeta respirar”, disse a secretária estadual de Povos Indígenas do Pará, Puyr Tembé, em entrevista a ((o))eco.
A representante da sede da COP 30, outra palestrante da cúpula, adiantou ainda a expectativa sobre a participação dos indígenas na conferência do clima – que ocorre no próximo mês em Belém – que será “a maior da história”.
Em conversa com ((o))eco, a presidente da FUNAI reforçou as ambições sobre a conferência. “A expectativa é ter mais de 3 mil indígenas em Belém, de vários biomas do Brasil, não só da Amazônia. Isso vai dar visibilidade ao fato de que os povos indígenas têm interesse nos resultados da COP”, indica Joenia.
“Vamos levar a bandeira da demarcação das terras indígenas. Eu espero que isso sensibilize [os líderes] e que a demarcação e proteção de terras indígenas seja incluída como estratégia importante não só para conservação da biodiversidade e dos povos, mas para o enfrentamento da crise climática”, acrescenta.

As lideranças também adiantaram seus anseios sobre a participação dos indígenas na COP da Biodiversidade (COP 17), que ocorre na segunda quinzena de outubro, na Armênia.
“Precisamos parar de pensar em caixas separadas. Biodiversidade e clima. Para os povos indígenas é tudo uma coisa só, que faz parte da nossa vida”, destacou Eileen Mairena Cunningham, do povo indígena Miskito, na Nicarágua, ponto focal de Povos Indígenas no United Nations Framework on Climate Change (UNFCCC). “Não somos apenas beneficiários, estamos liderando ações no território. Ações de adaptação e enfrentamento da crise climática”, acrescentou.
A colaboração dos povos indígenas no enfrentamento da crise climática foi reforçada por um estudo global, publicado no final de setembro, que compilou informações de mais de 700 iniciativas climáticas lideradas por ou em parceria com povos indígenas em todo o mundo.
“Essa é a primeira cúpula global presencial de povos indígenas em um Congresso Mundial de Conservação da IUCN. E é uma afirmação de que os povos indígenas não são partes interessadas periféricas, mas sim legítimos guardiões da vida na Terra”, reforça a diretora geral da IUCN, Grethel Aguilar.
As vozes dos povos originários, continua ela, são uma parte essencial na transformação da agenda global de conservação, com novas prioridades e compromissos.
O Congresso da IUCN terá ainda, também pela primeira vez, um pavilhão de povos indígenas que dará visibilidade ao conhecimento tradicional, práticas indígenas de conservação, inovações lideradas pela comunidade e liderança intergeracional.
Oceanos, juventude, filantropia e negócios
Outras três cúpulas foram realizadas em Abu Dhabi nesta quarta-feira (8): de oceanos (que segue até o dia 11), da juventude e da filantropia. Os eventos foram um aquecimento para o Congresso Mundial de Conservação da IUCN, que começa nesta quinta-feira (9) e vai até o dia 15. Realizado a cada quatro anos, o congresso é o maior encontro de conservacionistas do mundo.
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