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Ampliação do Parque Nacional de Brasília passa para as mãos do Ibama a Fazenda Imperial, modelo de ecoturismo que preserva 4 mil hectares de Cerrado. Pra quê?

Carolina Mourão ·
9 de fevereiro de 2006 · 19 anos atrás

O Senado aprovou, nesta terça-feira, dia 14, um projeto que altera as feições do Parque Nacional de Brasília. O saldo é o seguinte: o Ibama perde 123 hectares de terras semi-urbanas, invadidas e descaracterizadas, e ganha 14 mil hectares de Cerrado bem preservado. O negócio da China se deve à “Cidade Digital”, um pólo tecnológico a ser implantado nos tais 123 hectares, que atualmente pertencem ao Parque Nacional de Brasília. Pelo acordo, o Parque cresce em tamanho e em riqueza natural.

Mas a boa notícia esconde um perigo. Foi aprovada uma emenda que inclui, nos novos limites do Parque, uma única propriedade particular. Não é uma propriedade qualquer. Trata-se da renomada Fazenda Dois Irmãos, mais conhecida como Fazenda Imperial, reserva premiada várias vezes pelo bem-sucedido projeto de turismo ecológico que promove na região.

A Fazenda Imperial fica na Chapada da Contagem e tem 4 mil hectares, 95% dos quais integralmente preservados. O terreno nunca serviu à exploração agropecuária, e há sete anos seus proprietários abriram os portões aos turistas. Sábia decisão. Por 40 reais, os visitantes podem escolher quais das 33 cachoeiras e poços d’água preferem conhecer. Esportistas têm à disposição trilhas com três níveis de dificuldade, e além das caminhadas há espaço para mountain bike, arvorismo, rapel e passeios de jipe. O pacote inclui transporte interno, enfermaria de primeiros socorros e almoço incluindo saladas orgânicas. Guias equipados com rádio acompanham as atividades das 9h às 17h30. Eles recebem treinamento em educação ambiental graças a uma parceria da fazenda com a Universidade de Brasília (UnB), que também investe na profissionalização dos moradores de uma vila que fica dentro da propriedade. Sua qualidade de vida é importante para o bem-estar de seus vizinhos de Cerrado: veados campeiros, tatus, lobos-guarás, porcos-do-mato e onças.

Será que foi a riqueza natural que despertou a cobiça do Ibama pela área? Segundo seus proprietários, as intenções do órgão federal não são tão nobres. “A questão é que temos um empreendimento ambiental que se tornou um bom negócio. O Ibama cresceu o olho e quer terceirizar os serviços por licitação. Eles querem se beneficiar do que a gente construiu, tomar posse”, ataca Márcio Imperial, que atende pela propriedade ao lado do irmão, Marcelo.

Francisco Palhares, gerente-executivo do Ibama no Distrito Federal, rechaça a acusação. “Não conheço esses dois, nunca vi, meus critérios são meramente técnicos. Este assunto está encerrado para mim”, diz ele, que é provável candidato a deputado distrital nas eleições deste ano.

Boicote

Mas os irmãos Imperial não estão dispostos a se calar. Queixam-se de boicote por parte do Ibama, que costumava soltar na propriedade animais do Cerrado apreendidos em suas operações. “Existe uma ordem expressa entre os funcionários do Ibama, dada pelo gerente-executivo Francisco Palhares, de não realizar mais nenhuma soltura de animais na propriedade”, afirma Márcio. “Ele tem o objetivo claro de utilizar o lugar a seu favor. Por isso está sabotando a fazenda, já que os animais são uma das atrações para quem vem”. A Fazenda Imperial já recebeu até onça apreendida pelo Ibama.

Francisco Palhares negou-se a comentar o suposto boicote à soltura de animais na fazenda, e usou um argumento surpreendente para contestar a legitimidade do trabalho: “A propriedade é da União”. O que transformaria os irmãos em grileiros. Marcelo Imperial garante que o Tribunal Regional Federal (TRF) confirmou, em segunda instância, a titularidade da fazenda. E a própria emenda aprovada no Congresso considera a terra privada, uma vez que prevê sua desapropriação.

O deputado José Roberto Arruda (PFL) é um dos defensores da tese de que a área está em boas mãos. “A Fazenda Imperial é um patrimônio do Distrito Federal, graças ao esforço destes empresários que foram felizes em suas ações, sem ajuda nenhuma de governo. Eles seguem todas as normas e não podem ser punidos por terem preservado a área, por terem realizado isso. Deixar o terreno em um parque cujo fiscalizador é o Ibama, cujo aparelho está falido, é certamente entregar o projeto à ruína. Aquilo é um corredor ecológico saudável de 4 mil hectares de Cerrado”, ressalta Arruda, forte candidato ao governo do Distrito Federal.

“Como é que o Ibama pretende manter o nível de qualidade ambiental que hoje existe ali?”, pergunta Arruda. “Do mesmo jeito que se faz em todo o país. Nosso parque é o mais bem conservado do Brasil”, responde Francisco Palhares.

Com a aprovação do projeto pelo Senado, só falta a sanção de Lula para Márcio e Marcelo perdem sua propriedade. Mas eles pretendem brigar até o fim. “Nós vamos acionar a Justiça, entrar com mandado, fazer o diabo”, avisa Márcio, sacando da manga mais acusações contra o Ibama.

Diz ele que em uma propriedade perto dali, pertencente à União, há uma lavra de água mineral da marca Pura e Leve, que recebeu do Ibama autorização para distribuição e venda comercial. “Os consumidores são o próprio Ibama, Congresso Nacional, ministérios e autarquias. É a Praça dos Três Poderes bebendo água da União, vendida irregularmente”, acusa. Por sua assessoria, o Ibama respondeu que as terras pertencem à Terracap, e não à União.


Não que seja esse o plano para as fartas águas da Imperial. Mas a fazenda ecoturística parece ser um caso clássico de time que está ganhando. Daqueles em que não se deveria mexer.

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