Criados como uma alternativa sustentável de renda a pequenos proprietários ou posseiros de terra, Planos de Manejo Florestal Sustentável em Pequena Escala, para áreas de até 500 hectares, estão sendo fraudados e usados para esquentar madeira retirada ilegalmente da floresta amazônica. O golpe não é novo, já era conhecido em assentamentos no Sul do Amazonas, mas já chegou também a municípios da região do Baixo Rio Amazonas, extremo leste do Estado.
Esta frente de desmatamento fica na divisa com o Pará, de onde estariam chegando as madeireiras que agem irregularmente no Amazonas. Elas estariam sendo acuadas pelas ações de combate a crime ambientais em território paraense. Antes da derrubada da floresta nesta área ficar evidente, as atenções tanto do Ibama quanto do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) estavam voltadas para o Sul do Estado, ameaçado pelo avanço da fronteira agrícola do Mato Grosso e Rondônia.
No ano passado, o Ipaam licenciou 368 Planos de Manejo nos 61 municípios do interior do estado. Apenas 220 deles passaram pela vistoria após o licenciamento. De acordo com o próprio instituto, não é possível fiscalizar todos os planos devido ao enorme território do estado do Amazonas. Mas, ainda segundo instituto, em nenhum dos planos vistoriados foram encontradas irregularidades sérias ou fraudes.
A denúncia de que o manejo era usado para encobrir atividades ilegais foi feita pela presidente da Câmara Municipal de Barreirinha (552 quilômetros de Manaus) e entregue, em uma carta escrita pelo poeta Thiago de Melo, à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. O poeta é um ilustre morador da Zona Rural de Barreirinha, onde vive desde que voltou do exílio durante a ditadura militar.
Thiago de Melo inspirou o nome da operação que comprovou as irregularidades. Na Operação Poeta, realizada no início deste ano em seis municípios da região (Parintins, Maués, Nhamundá, Boa Vista do Ramos, Barreirinha, Urucará e Urucurituba), embora a documentação da madeira encontrada nas serrarias indicasse origem legal do produto, o Ibama descobriu que ela vinha de áreas sem planos de manejo ou, quando havia plano, a extração não obedecia ao licenciamento.
O esquema funciona inclusive em áreas onde não existe a comprovação de propriedade da terra. Desde 2004, o Instituto de Terras do Amazonas (Estiam) entrega cartas de anuência a posseiros de boa fé que vivem em áreas públicas no interior. O documento não serve para comprovar a propriedade da área, mas é suficiente para licenciar o Plano de Manejo junto ao Ipaam.
De acordo com o superintendente do Ibama no Amazonas, Henrique Pereira, com procurações de colonos ou posseiros, as madeireiras obtêm o licenciamento para a extração de madeira da propriedade ou posse, mas não respeitam o Plano de Manejo. No início do ano, o Ibama realizou vistorias em sete planos de manejo na área, a maioria estava irregular.
“Em um dos planos de manejo vistoriados no início do ano, não havia saído nenhuma árvore cortada, embora a documentação informasse que a extração tinha sido feita”, conta Pereira. O Ibama recomendou a suspensão destes planos de manejo e ofereceu denúncia ao Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea) contra o engenheiro responsável pela elaboração dos planos, segundo Pereira.
Nova estratégia
O presidente do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável de Parintins, Eraldo Albuquerque denuncia que a quantidade de prevista de madeira a ser explorada em alguns planos de manejo não são compatíveis com a área licenciada. “Com promessa de grana e orientação de madeireiros para facilitar, o parceleiro consegue a aprovação do plano e entrega a madeira”, afirma. Albuquerque promete levar a denúncia ao Ministério Público Estadual. Para ele, a falha está na falta de fiscalização.
A descoberta do esquema levou o Ipaam a mudar as prioridades nas ações de combate ao desmatamento em 2008. Segundo a assessoria de imprensa do instituto, as irregularidades eram conhecidas desde o início de fevereiro, quando superintendentes do Ibama na Amazônia e entidades estaduais de proteção ao Meio Ambiente se reuniram em Belém para discutir o Plano de Combate ao Desmatamento.
Até então, a prioridade no Amazonas eram os municípios no Sul do Estado. Com a mudança de estratégia, municípios da fronteira com o Pará entraram na lista de vistorias em planos de manejo durante este ano. O instituto admite a dificuldade para fiscalizar todo o estado, mas espera amenizar o problema com a contratação de 61 novos analistas ambientais ainda este ano. O edital deve ser publicado ainda em março.
Para não que o Ipaam não seja pego novamente de surpresa com o aparecimento de novas frentes de desmatamento, deve ser criado um grupo de inteligência para auxiliar a fiscalização, que têm até nome escolhido. O Grupo Especial de Combate a Crimes Ambiental (Gecam) deve contar com 31 integrantes, contratados em concurso público.
Vandré Fonseca é repórter em Manaus.
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