Simón Veléz, arquiteto colombiano, é um especialista em construir obras de grande porte com bambu. Com projetos em mais de 10 países, ele utiliza o chamado “aço vegetal” para erguer teatros, pontes, igrejas e até terminais rodoviários, que se distinguem pela aparência de leveza das suas estruturas.
Na sabedoria do Oriente, o bambu é tido como um material que acalma quando usado para revestir interiores. Por qualidades como estas, Veléz defende sua inclusão como um recurso que, brinca, pode levar a uma “dieta mais balanceada” no menu de materiais arquitetônicos.
Durante o Encontro de BioArquitetura (EBA 2012), realizado entre 8 e 10 de novembro em Nova Friburgo, ele discorreu sobre as técnicas que utiliza e que o tornaram uma referência no assunto. Em seguida, os Xavantes presentes mostraram como se constrói uma oca.
Técnica sem improviso
O uso do bambu pode soar como uma prática artesanal, mas, ao contrário, trata-se de refinada técnica. Veléz é meticuloso e trabalha em parceria com engenheiros para garantir a robustez dos seus projetos.
No Expo Shangai 2010, ele projetou e construiu o pavilhão da Índia, uma metáfora do mercado e do templo, o último coberto por um grande domo, claro, todo construído de bambu. Para aguentar estruturas com pesos de até 250 kg por m2, como foi o caso desse projeto, o segredo de Veléz é injetar cimento diluído com água, dentro dos colmos (nome dado aos segmentos ocos do caule do bambu) antes das perfurações com parafusos. Dessa forma, evitam-se rupturas de conexões, sem diminuir a flexibilidade do material.
Outra peculiaridade é utilizar os rizomas do bambu – parte mais forte da planta e geralmente encurvada – para obter “figuras primitivas” no acabamento de tetos e paredes. Veléz trabalhou essa solução em sedes de fazendas, casas particulares e lobbys de hotéis.
Para afastar os fungos que levariam à decadência das estruturas, sua equipe aplica injeções de cipermetrina, um inseticida biodegradável, nos entrenós das centenas ou até milhares de ripas utilizadas. Para impedir a transmissão da humidade do solo, a ponta dessas ripas é isolada por suportes de aço inox. O contato com a terra reduziria a vida útil do bambu.
Além do visual orgânico, suas obras evitam materiais não renováveis. O bambu cresce rápido e, por isso, é fácil de repor. Essa velocidade o transforma em um bom sequestrador de carbono da atmosfera. Há espécies de bambu que crescem em média 23 centímetros por dia.
Durante a conferência, Veléz disse: “Incentivo uma dose mais vegetariana a essa arquitetura mineral que apenas usa cimento, aço, vidro e ladrilho. É como na culinária, que se vêm incentivando o consumo de mais proteína vegetal, em vez da animal”.
Oficina de Oca
No último dia do Encontro de BioArquitetura, no município de Bom Jardim, 4 índios Xavantes se uniram a monitores do Tibá (Centro de Tecnologia Intuitiva e BioConstrução) para construir uma oca.
Peter van Lengen, curador do evento, explicou aos cerca de 50 participantes que houve uma mistura de métodos na preparação do protótipo. “Fizemos uma fundação de pedras, técnica típica de ‘não-índios’, para reforçar a base da casa e impedir que o revestimento entre em contato com a umidade do chão, garantindo durabilidade.”
As paredes da oca foram feitas de pau-a-pique de bambu, amarrado com fibras internas do caule de árvores, cobertas com uma inusitada mistura de terra, água e esterco de equinos.
Lengen explicou que os 25% de esterco contidos no material das paredes produz uma reação química com a argila da terra, transformando-se em um concreto natural bastante resistente à erosão.
Arquitetura ritual
O formato circular adotado na construção foi uma referência à cultura indígena. Um dos Xavantes explicou que em suas aldeias as ocas também estão dispostas em círculo, de forma que o espaço entre elas se torne um local de encontros e comemorações.
No centro da oca, um tronco de pau-canela fez o papel de coluna estrutural. A distância dali até as paredes foi medida da maneira mais simples e funcional: igual ao comprimento de uma rede de dormir.
A forragem do teto com fardos de folhas de palmeira foi uma novidade que os índios apresentaram aos “Tibanos” – como são chamados os aprendizes do centro. Segundo Lengen, funcionou como inversor térmico, mantendo o ambiente mais fresco em dias quentes. “O que fizemos aqui foi um brinquedo. Com mais tempo e material poderíamos fazer uma ótima casa ou restaurante”, disse.
Reconstrução
Thiago Mello, diretor do Instituto Serrano de Economia Criativa (ISEC), um dos parceiros do evento, acredita que casas bioconstruídas seriam soluções mais inteligentes para pessoas desalojadas pela enxurrada de 2011, ocorrida em Nova Friburgo. “Fomos vítimas da maior catástrofe natural do Brasil e podemos nos tornar paradigmáticos reconstruindo áreas da cidade segundo princípios da permacultura, que são conscientes ecologicamente e estimulam princípios de economia localizada.”
Mello conta que o ISEC fez um acordo com o Sindicato de Construtores de Nova Friburgo (Sinduscon) para promover à diminuição de resíduos, através da capacitação dos construtores, e, também, para ajudá-los a obter certificações ambientais para as novas construções. “Empreiteiros da cidade estão assistindo as palestras. Fomentar a assimilação desses novos conceitos é um resultado positivo desse encontro”.
Apesar dos esforços, Mello declara que a resistência a mudanças pode estar próxima: “Estou em vias de construir minha casa e abraço essas propostas, já minha esposa, nem tanto”.
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