As mudanças na composição do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), introduzidas no ano passado pelo Decreto 9.806/19, preocupa entidades ambientalistas e científicas. As alterações reduziram o número de conselheiros de 96 para apenas 22 e aumentaram a participação proporcional de representantes do governo federal de 29,5% para 41%, enquanto diminuiu a da sociedade civil em 4 pontos percentuais, de 22% para 18%.
O decreto também muda a forma de escolha dos membro do Conselho. “O sistema eletivo, que era democrático, com eleição por votos para o setor ambientalista, que escolhia livremente seus representantes, passou a ser um mero sorteio, critica o presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), conselheiro titular do Conama, “Perdeu-se a representatividade regional, em um país megadiverso como é o Brasil. Para a questão ambiental representa perda de transparência e controle social.”
Próximo de completar um ano, colegiado só se reuniu uma vez para sortear os novos conselheiros.
Para Luiza Lima, da campanha de políticas públicas do Greenpeace Brasil, o Decreto 9.806/19 esvaziou o Conama, restringindo a participação de segmentos importantes da sociedade civil e dando grande poder ao governo federal. “Com a reestruturação, perderam assentos representações indígenas (Conselho de Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Brasil), a Ciência (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC) e a Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente (Anama)”, diz. “Além disso, as entidades ambientalistas passaram a ter apenas quatro assentos e a ser selecionadas mediante um sorteio. Literalmente, o governo fez um bingo para definir.”
De acordo com a pesquisadora Vera Maria Almeida-Val, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e membro da diretoria da SBPC, ao aumentar a participação governamental, “o Conama corre o risco de passar a atender prioritariamente demandas de grupos não comprometidos com a preservação e conservação do meio ambiente, com os quais o atual Governo tem muita afinidade, como os ruralistas e latifundiários”.
Ainda segundo Vera, a exclusão do Conselho de representantes das populações indígenas, dos trabalhadores, sanitaristas, comunidade científica e catadores de materiais recicláveis terá implicações severas. “Ao retirar todas essas classes de representantes, o Conama deixará de ouvir as demandas de populações que vivem em harmonia com o meio ambiente, como é o caso das populações indígenas, bem como de especialistas que contribuem muito com a recuperação do meio ambiente e com estudos e levantamentos sobre agentes poluentes em nossos ecossistemas”, critica.
De acordo com ela, o Governo vai na contramão das tendências mundiais. “Em particular ao excluir a participação de cientistas, uma vez que a grande maioria das empresas que poluem direta ou indiretamente o meio ambiente com sua atuação vem se valendo de especialistas para mitigar os danos ambientais que causaram ou ainda possam causar”, acrescenta.
Segundo Bocuhy, o Conama é o maior conselho ambiental do país, estabelecendo normativas que regulamentam inúmeros aspectos da gestão ambiental brasileira, como padrões de qualidade e proteção da biodiversidade, entre outros. “O espaço de participação social no Conama exige um alto nível de especialização e de responsabilidade para se atuar, de forma eficiente, nas políticas públicas ambientais com escopo nacional”, diz.
Por isso, ele também condena o decreto por estabelecer mandatos de apenas um ano para os ambientalistas, sendo vedada a recondução, o que levará à alta rotatividade dos membros. “Neste tempo tão curto, quando as entidades começarem a aprimorar sua eficiência e utilizar de forma eficaz o regimento interno, serão substituídas sem direito à reeleição”, reclama. “A nova norma destrói condições essenciais para a atuação eficiente da representação da sociedade civil, ao volatizar por meio de mandatos relâmpago as possibilidades de evolução por experiência.”
De acordo com Luiza, com o decreto “Bolsonaro deixa claro que não quer a participação da sociedade nos conselhos e na política brasileira”. “Além do Conama, extinguiu outras dezenas de conselhos e colegiados, reduziu ou excluiu os assentos da sociedade civil dos que manteve – como foi no caso do próprio Conama e do Fundo Nacional do Meio Ambiente – e recentemente declarou que gostaria de confinar os ambientalistas que criticam sua política”, lembra.
Apesar de ser excluída do Conama, a SBPC, diz Vera, não se furtou e nunca se furtará em opinar sobre as questões relacionadas ao meio ambiente. “Mesmo perdendo a representatividade no Conselho – e protestamos contra isto –, continuaremos a acompanhar criticamente a condução das políticas ambientais, mas sempre apontando também alternativas e soluções”, assegura. “O acompanhamento das ações do Conama vai continuar ocorrendo e será permanente por meio de grupo de trabalho, organização de debates ou manifestações da entidade.”
Para Bocuhy as alterações introduzidas pelo decreto são inconstitucionais, por isso o Proam encaminhou à Procuradoria Geral da República (PGR) uma representação conta elas. “A PGR, por sua vez, ingressou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para que se reestabeleça a participação social”, conta. “As consequências das mudanças para o meio ambiente são a possibilidade de alterações menos protetivas negativas das normas de qualidade ambiental editadas pelo Conama, como padrões para ar, água e solo, entre tantas outras, que perderiam qualidade técnica devido à restrita participação social.”
Presidência
- Presidente do Conama – Ricardo Salles
- Secretário-Executivo – Luis Gustavo Biagioni
Entidades ambientalistas de âmbito nacional
- Associação Novo Encanto de Desenvolvimento Ecológico – Titular: Carlos Teodoro José Hugueney Irigaray.
- Associação Rare do Brasil – Titular: Monique Barreto Galvão.
- Comissão Ilha Ativa – Titular: Luciano Silva Galeno
- Instituto Internacional de Pesquisa e Responsabilidade Socioambiental Chico Mendes – Titular: Aurelino Menarim Junior
Entidades empresariais
- Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA – Titular: João Carlos de Petribú dé Carli Filho
- Confederação Nacional da Indústria – CNI – Titular: Wanderley Coelho Baptista
Governos Municipais
- Belém – Titular: Pio Menezes Veiga Netto
- Porto Alegre – Titular: Germano Bremm
Governos Estaduais
- Governo representante da região Centro-Oeste – Mato Grosso do Sul – Titular: Jaime Elias Verruck
- Governo representante da região Nordeste – Piauí – Titular: Sádia Gonçalves de Castro
- Governo representante da região Norte – Tocantins – Titular: Renato Jayme da Silva
- Governo representante da região Sudeste – Rio de Janeiro – Titular: Altineu Côrtes Freitas Coutinho
- Governo representante da região Sul – Rio Grande do Sul – Titular: Artur José de Lemos Júnior
Governo Federal
- Casa Civil da Presidência da República – Titular: Vinícius Barbosa Salles de Azeredo
- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) – Titular: Eduardo Fortunato Bim
- Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) – Titular: Elvison Nunes Ramos
- Ministério do Desenvolvimento Regional (DR) – Titular: Elianeiva de Queiroz Viana Odísio
- Ministério da Economia – Titular: Ana Luiza Oliveira Champloni
- Ministério da infraestrutura – Titular: Larissa Carolina Amorim dos Santos
- Ministério de Minas e Energia – Titular: Dione Macedo
- Secretaria de governo da Presidência da República – Titular: Alex Fabiane Teixeira
Conselheiros sem direito a voto
- Ministério Público Federal (MPF) – Titular: Fátima Aparecida De Souza Borghi.
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Cade os ambientalistas que apoiaram esse governo contra o suposto comunismo?
Este Salle$, pode joga fora.