A proposta de criação do Parque Nacional Altos da Mantiqueira (veja material técnico aqui) tem provocado reações fortes dos que desejam que a Serra da Mantiqueira continue a ser privatizada e detonada por interesses de especuladores imobiliários, grileiros e plantadores de eucaliptos, inclusive com manifestações televisivas dignas do Tea Party.
Os dois principais argumentos dos contrários ao Parque são a falta de informação sobre a região e a falta de participação da população no processo. A verdade é que não falta uma coisa nem outra.
Há dezenas de estudos científicos sobre a importância da região, sintetizados na proposta oficial, que inclui anexos, mapas, documentação fotográfica e o levantamento socioeconômico dos municípios incluídos na área protegida. Vale lembrar que os estudos que subsidiam a proposta do parque incluem, além de pesquisas acadêmicas, planos de gestão de bacias hidrográficas, estudos para definição de Áreas Prioritárias para Conservação do Probio (MMA), levantamentos do Projeto Biota/Fapesp, o Atlas da Biodiversidade de Minas Gerais e estudos de áreas prioritárias para conservação feitos pela BirdLife International.
A proposta do parque inclui também um detalhado mapeamento do uso e vulnerabilidade da terra baseado em imagens de satélite de alta resolução. Um destes mapeamentos, produzido pelo Centro de Ciências do Sistema Terrestre do Inpe, mostra que 98,1% da área proposta para o parque tem algum tipo de risco físico natural para atividades humanas, e 87,75% riscos altos de deslizamentos e inundações. As imagens recentes na TV mostram o que isso significa e só esta vulnerabilidade, sem contar as fontes de água e a estabilização do clima regional, já justificariam a proteção da área.
Quanto à participação da sociedade, que alguns mentem ao dizer que não existe, a primeira consulta pública foi realizada no dia 7 de dezembro de 2009, com outras quatro feitas até o dia 10 do mesmo mês, todas com a participação de mais de 400 pessoas. Quarenta dias antes das consultas, nos dias 22 e 23 de outubro, foi feita uma apresentação da proposta aos prefeitos dos 16 municípios. Foram ainda feitas apresentações da proposta ao Conselho da APA Mantiqueira e ao Conselho do Mosaico de UCs da Serra da Mantiqueira nos meses de setembro e outubro, e uma reunião pública destinada a organizações com atuação regional em novembro de 2009, na cidade de Cruzeiro, SP, três semanas antes das consultas públicas. No total foram feitas 5 reuniões regionais para apresentar e discutir a proposta de criação do parque nacional, antes das consultas públicas.
Depois das consultas, o ICMBio esteve na região por uma semana (8-12 de fevereiro/2010) realizando reuniões com as prefeituras e comunidades. Além das duas reuniões que realizaram recentemente com o Grupo de Trabalho da Mantiqueira.
Um total de 29 instituições também apóia o ICMBio na tarefa de criar o Parque Nacional, de ongs a agências estatais. A lista inclui o Instituto Florestal – SP, a Fundação Florestal de SP, a Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo, o Instituto Estadual de Florestas/MG, a Comissão de Montanhas da UICN, a Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, a SOS Mata Atlântica, a Conservation International, a Rede de Ongs da Mata Atlântica, o Instituto Oikos, o departamento de Botânica da Unicamp, a The Nature Conservancy, além de pesquisadores reconhecidos, autoridades científicas e pessoas com notório serviço à causa ambiental.
O que se vê é um processo totalmente diverso do que ocorreu com os parques de Itatiaia (criado em 1934) e Serra da Bocaina (1971), sempre lembrados como maus exemplos de parques nacionais “impostos” à sociedade”, o que é outra bela bobagem. Os tempos mudaram e não apenas o processo de criação é participativo e transparente, mas o nó das desapropriações e seu pagamento está sendo desatado com recursos do Fundo de Compensações Ambientais. O problema aí é menos de dinheiro e mais de pretensos proprietários não terem títulos reconhecidos, o que emperra os processos.
Apesar de extensamente divulgada e discutida, quatro meses depois da primeira audiência pública sobre a criação do parque nenhuma prefeitura, nenhuma instituição, nenhuma pessoa ou técnico fez uma avaliação formal da proposta. Ao contrário, a única coisa que se viu foram discursos inflamados, acusações sem provas e mentiras ululantes como a de que 400 mil empregos seriam afetados na região – número quase igual ao da população total dos municípios afetados, incluídos os moradores das áreas urbanas, que são a maioria, além de todas as crianças recém nascidas e todos os velhinhos.
E quando se vê quem está por trás da gritaria há uma notável participalção de quem tem condomínios, plantios de eucalipto e outras detonações que não combinam com uma Mantiqueira conservada.
A proposta de um parque nacional na Serra da Mantiqueira é arrojada. Ela tem que ser. De outra forma eucaliptais, condomínios e mineração,terminarão por descaracterizar toda a serra, com prejuízos irreversíveis à biodiversidade e aos serviços ambientais. A Serra da Mantiqueira está sob alto risco de ser totalmente fragmentada na porção proposta para a criação do parque por iniciativas como novas estradas asfaltadas ligando Campos do Jordão a condomínios que pipocam nas regiões mais conservadas da Serra. Por sinal, alguns dos mais vocais opositores ao parque são pessoas que pleiteiam estas estradas enquanto se dizem muito preocupados com a natureza.
Sob a máscara de protetores da natureza vestida por muitos que são contra a criação do Parque Nacional Altos da Mantiqueira está a face bem conhecida dos hipócritas que privatizam benefícios enquanto socializam prejuízos. (Fábio Olmos)
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