De Flavya Mendes de AlmeidaMédico veterináriaWorld Society for the Protection of Animals Editor Jornal O EcoGostaríamos de tecer alguns comentários e fazer alguns esclarecimentos a respeito da matéria publicada por Pedro da Cunha e Menezes neste jornal. Antes de mais nada, discordamos que o gato (Felis catus) seja uma espécie exótica invasora, muito pelo contrário, assim como o cão (Canis familiares), gatos encontram-se espalhados pelo mundo todo desde a sua domesticação e a adaptação é apenas uma das etapas do sucesso evolutivo de uma espécie. Na realidade, todas as espécies, em algum momento são invasoras (não existiam originalmente em determinado local, e após passarem por processos de adaptação, são encontradas nesses diferentes lugares). Além disso, quem realmente invade o espaço e destrói florestas é o ser humano, e assim a fauna urbana simplesmente é obrigada a se adaptar a essa condição de destruição.Porém, realmente concordamos que o controle populacional de colônias de gatos domésticos nos centros urbanos deva ser realizado, não somente por razões de saúde pública, mas principalmente de bem-estar animal e assim, as duas estratégias mundialmente utilizadas como formas de controle de populações de gatos domésticos são exatamente a Erradicação das colônias e a Esterilização.A erradicação é realizada de várias formas: através da introdução de agentes patológicos específicos (ex: viroses felinas), envenenamento, caça, captura e eutanásia ou ainda captura / remoção / recolocação em uma nova colônia ou santuário. Embora sejam muitas vezes ineficientes e eticamente inaceitáveis devido ao sofrimento que causam aos animais, tais métodos de erradicação continuam a ser utilizados em locais nos quais a presença de gatos é considerada uma ameaça às populações humanas (casos de raiva ou outras zoonoses) ou de animais silvestres (predação por gatos domésticos). Nos Estados Unidos da América (EUA), onde se dispõe de informações técnicas atualizadas, há muita controvérsia em relação à manutenção de gatos em áreas ricas em biodiversidade, por outro lado, a eliminação dos animais já se mostrou ineficiente, pois a remoção de indivíduos de um grupo, seja por adoção, translocação ou eutanásia desestrutura a hierarquia e a organização social da colônia, colaborando para o aumento da população pela migração de novos indivíduos. Após um período de “ajustes sociais”, tais colônias tendem à “auto-regulação”; assim, modificar a estrutura social pela eliminação de indivíduos não é recomendável como forma de controle populacional. Além disso, observou-se que a própria população humana (essa sim, a espécie mais invasora de todas – Homo sapiens) colabora intensamente para a superpopulação de gatos, abandonando animais nas áreas controladas e monitoradas. A população de gatos ferinos, que conhecidamente apresenta alta taxa de mortalidade infantil, é mantida e sustentada exatamente pela entrada de gatos trazidos por pessoas que imaginam estar fazendo um bem aos animais ao deixá-los onde há uma colônia estabelecida. Gostaríamos ainda de esclarecer que a Toxoplasmose e não, Toxicoplasmose é uma doença cujos hospedeiros definitivos são os felídeos. Entretanto a transmissão se dá por diversas formas, e a mais freqüente é exatamente a ingestão de alimentos e água contaminados por esporocistos, ou seja, para que ocorra a transmissão direta de toxoplasmose de gatos para seres humanos ou para quaisquer outras espécies, é necessário que se ingira fezes de gatos contendo oocistos esporulados - presentes no ambiente por pelo menos três dias.E por falar ainda em espécies invasoras, Challithrix jaccus (sagüi de tufo-branco) é também um bom exemplo. Originária do Nordeste e introduzida no Rio de Janeiro é amplamente conhecida pelo seu potencial predador da fauna silvestre, pois sagüis são excelentes “saqueadores” de ninhos, além do fato de já terem se adaptado por completo ao ambiente urbano. Esses animais (não domésticos!) colocam em risco à saúde humana, uma vez que podem ser portadores assintomáticos de Herpes simiae, uma virose fatal para nós, humanos. Já com os gambás (Didelphis marsupiallis) aconteceu o caminho inverso, animais originalmente silvestres que se adaptaram ao estilo de vida urbano, sendo encontrados em qualquer local nas cidades. Daí a importância em se conhecer as espécies e identificar até que ponto o equilíbrio entre elas, seres humanos e ambiente encontra-se comprometido, para que então, dessa forma, medidas de controle possam de fato serem adotadas.Dessa forma, o que cabe aqui não é culpar o cão, o gato, o sagüi ou o gambá, na realidade, concordamos que o controle sanitário e populacional de todas as espécies, inclusive o homem, se faz necessário e urgente. Porém o que não se pode permitir é que algumas poucas espécies paguem o preço da desinformação oriunda de idéias errôneas e distorcidas sobre o assunto, divulgadas de qualquer forma, sem conteúdo e embasamento científico e pior ainda, que incita a população em geral a condenar e a cometer um crime contra os gatos, baseado nessa imagem cruel e não verdadeira divulgada sobre eles.Assim, gatos, domesticados há 4000 anos pelos egípcios e originalmente (e até nos dias atuais) utilizados pelos humanos no controle de roedores, hoje se vêem massacrados exatamente por manterem nos seus genótipos traços de animais de topo de cadeia, predadores por natureza. Mais uma vez, de nada adianta culpar os gatos, o que precisamos fazer é unir esforços para que medidas cabíveis e sensatas de controle de suas superpopulações sejam implementadas e que tornem a convivência entre eles e humanos a melhor possível, principalmente para aqueles que não apreciam o agradável convívio com felinos. →
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Redação ((o))eco
24 de agosto de 2005