Passados quase dois meses da explosão do navio chileno Vicuña, no Porto de Paranaguá (PR), em 15 de novembro, a carcaça da embarcação ainda representa risco ao meio ambiente. Nesta semana, a retirada dos destroços entrou em sua fase mais delicada.
Após a retirada do castelo – uma torre de 12 metros da altura e 190 toneladas – a empresa holandesa Smit Salvage B.V. iniciou o corte do resto da estrutura, que será dividida em sete partes. A operação pode resultar em novos vazamentos, pois ainda há óleo preso em compartimentos do navio, como latrinas e quartos. O combustível dos tanques já foi totalmente retirado. Ninguém se arrisca a prever quanto óleo ainda pode estar no que restou da embarcação.
O Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e o Ibama, que coordenam os trabalhos no local do acidente, exigem a manutenção de barreiras e de equipes de prontidão, para agir assim que for detectado algum novo vazamento. Conforme explica o presidente do IAP, Rasca Rodrigues, a Smit Salvage precisa de anuências dos órgãos ambientais para cada etapa do trabalho, como, por exemplo, em relação às condições do transporte e destino das peças retiradas. “A pressa é inimiga da qualidade ambiental”, afirma.
Somente após a retirada completa dos destroços é que o IAP e o Ibama farão um relatório sobre os impactos ambientais do acidente. Até o momento, foram recolhidos 150 animais (entre mamíferos, peixes, tartarugas e aves) mortos pela explosão ou pelo derramamento de óleo combustível e metanol. Apesar de considerar o número baixo, Rodrigues lembra que os impactos a médio e longo prazo são impossíveis de serem medidos. Segundo ele, é cedo para avaliar as conseqüências para o zooplâncton, fitoplâncton, ostras, mariscos, larvas de peixes e de crustáceos.
As análises de 36 amostras de peixes retiradas das baías de Paranaguá, Guaratuba e Guaraqueçaba resultaram negativas para a presença de contaminação. Por isso, no dia 6 de janeiro a pesca foi liberada, para alívio dos pescadores que estavam sem sua principal fonte de sustento desde novembro. “Achávamos que o impacto seria bem maior. A resposta rápida da natureza foi uma surpresa positiva”, comenta Rodrigues.
Apesar dos testes terem resultado negativo, os danos provocados pelo acidente se estendem ao Parque Nacional da Ilha do Superagüi, Ilha das Peças, Estação Ecológica da Ilha das Bananas, estação da Ilha do Mel, Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaraqueçaba e outras áreas de conservação, onde ainda persistem pontos cobertos de óleo como mangues, praias e rochas.
Muitas das soluções que os órgãos ambientais estão buscando para limpar essas áreas são experimentais. Exemplo disso foi a poda do marisma (espécie de capim do mangue), que estava encharcado de óleo. A ação foi objeto de extensa discussão entre os técnicos, pois parte deles achava que seria melhor tentar limpar a vegetação, em vez de cortá-la. A poda foi testada em uma pequena área, e a rápida rebrota indicou que era uma solução viável.
As ações de limpeza também incluem lavar pedras com jatos de água do mar, sem muita pressão, simulando uma chuva. “É um aprendizado diário”, conta o coordenador de campo do Ibama, João Antônio de Oliveira. “A gente tem de ir até o limite ecologicamente prudente. Há um ponto em que se começa a criar mais problema do que o estrago já feito”.
Oliveira é da opinião de que o impacto real só será conhecido passados alguns meses. E reconhece que muito do estrago poderia ter sido evitado se as primeiras ações de socorro tivessem sido diferentes. “Na hora, ficou todo mundo preocupado com o incêndio. Se um novo acidente ocorresse hoje, faríamos primeiro a contenção do vazamento”, afirma.
Somente após a elaboração do relatório final de impactos ao meio ambiente é que será definida a multa às empresas envolvidas. A Cattalini, dona do atracadouro em que o navio explodiu, pagou meio salário mínimo aos pescadores em parcela única, além de uma cesta básica por mês desde o acidente. Eles tiveram de assinar um documento reconhecendo que o valor será descontado caso a Cattalini venha a ser condenada a pagar uma indenização.
Os trabalhadores já vinham recebendo um salário mínimo por mês do Governo Federal, enquanto durasse a proibição da pesca. Em uma decisão do Tribunal de Justiça do Paraná, que nada tem a ver com o pagamento feito pela Catallini, a Ultragas, dona do navio Vicuña, está obrigada a pagar um salário mínimo mensal aos pescadores pelo período de proibição. Os pescadores do litoral paranaense ganham em média 800 reais por mês, mas dezembro e janeiro, por ser alta temporada, costumam ser os meses de melhor renda.
A operação de retirada dos restos do Vicuña deve prosseguir por mais dois meses.
* Romeu de Bruns Neto é jornalista formado pela UFPR. Trabalhou como repórter especial da Gazeta do Povo. Vencedor do Prêmio Esso Regional Sul 2000, atualmente colabora com reportagens para as revistas Amanhã (do Rio Grande do Sul) e Idéias (do Paraná).
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