Análises

Esperança ou decepção em Copenhague?

O que esperar da negociação climática que começou nesta segunda? Artigo de pesquisador do IPAM propõe um debate sobre porque ter esperanças em um acordo. Dê sua opinião.

Paulo Moutinho ·
2 de dezembro de 2009 · 15 anos atrás

Como funciona o Debate (((o))) eco:  A partir do artigo abaixo , leitores e pesquisadores são convidados a apresentar seu ponto de vista. A submissão dos pontos de vista pode ser feita pela ferramenta de comentários, os editores de O Eco vão destacar em um quadro abaixo trechos das opiniões. O colunista convidado vai então debater, enviar respostas e pode ao fim do período de debate escrever um artigo-resposta. Os comentários estarão abertos durante uma semana, até a próxima quarta, dia 09 de dezembro.

O primeiro convidado do Debate (((o))) eco é Paulo Moutinho: Coordenador de Pesquisas do Programa de Mudanças Climáticas do IPAM – Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia

A expectativa mundial sobre a 15º Conferência da Partes (COP15) da Convenção Quadro da ONU sobre Mudança Climática que será realizada em poucos dias em Copenhagen, Dinamarca, tem sido um misto de esperança e decepção pré-anunciada. Por um lado, a velha e sincera esperança por um mundo melhor é depositada sobre um possível acordo duradouro e efetivo que reduza as emissões globais de gases que aquecem o planeta, brindando as próximas gerações com um pouco de responsabilidade e respeito. Por outro, a não menos velha desconfiança de que, por mais que expressem, os países não superarão suas diferenças e a defesa de seus próprios interesses, sejam estes nacionais ou políticos. A opinião da sociedade, nestes casos, muitas vezes é o que menos importa.

Mas, então, o que esperar de Copenhagen, além do já não tão frio inverno nórdico? Particularmente, acredito na esperança. Na responsabilidade e respeito com aqueles que nos sucederão. Digo isto por alguns motivos básicos, em relação aos quais o Brasil e a sociedade brasileira têm um papel importante. Primeiro, o sentido de urgência hoje é muito maior do que aquele no passado e que permeou a negociação do Protocolo de Quioto. As evidências dos impactos climáticos, especialmente sobre as economias dos países são muito mais fortes agora.

Em 2006, Nicholas Stern já anunciava uma potencial perda de muitos trilhões de dólares na economia mundial se ficássemos de braços cruzados sobre o assunto. Estudo recente, estimou que o Brasil perderá 2 trilhões de dólares até 2050 com os impactos econômicos da mudança climática sobre a agricultura, florestas e energia se seguirmos com a mesma trajetória de desenvolvimento carbono-intensiva e demandadora de desmatamento. Se servir de consolo, o mundo gastou vários trilhões para conter a recente crise financeira, mostrando que se quisermos combater a mudança do clima dinheiro pode não ser um problema intransponível.

Fico mais crente na esperança em Copenhagen ao ver os recentes posicionamentos dos países sobre os esforços de redução de emissões e o Brasil teve um papel importante neste caso. O país sempre encarou com reservas a questão de metas de redução de emissões para países em desenvolvimento, mas foi capaz de dar um salto e estabelecer uma meta para o desmatamento (80% de redução abaixo de uma média histórica – 19 500 km2 – até 2020), e, em seguida, uma meta nacional (aprox. 35-40% de redução sobre as emissões projetadas para 2020; em outras palavras, entre 15-17% abaixo das emissões de 2005).

Mesmo que voluntária e ainda insuficiente (poderíamos fazer muito mais), a meta brasileira tem um potencial enorme de mudar o curso das negociações internacionais em Copenhagen. Pela primeira vez um país em desenvolvimento e grande emissor assume um discurso que poderá derrubar o principal argumento dos países ricos para não fazerem mais do que já estão fazendo: que os países em desenvolvimento não querem assumir compromissos mais sérios de redução de emissões. Nos últimos anos, o Brasil já vinha dando sinais de mudança em sua posição sobre como tratar as emissões de carbono oriundas do desmatamento. O lançamento do Fundo Amazônia, que teve apoio inicial do governo Norueguês, é uma amostra desta mudança. Coincidência ou não, a reversão de posição conjunta da anunciada intenção americana e chinesa de expressar em Copenhagen somente pretensões políticas de redução pode ter sido um resultado do constrangimento provocado por iniciativas como as do Brasil que, sem ser obrigatório, assumiu metas voluntárias.

Ambos os países acabaram de anunciar suas metas. Tímidas ainda, mas anunciaram algo quantitativo. É também interessante notar a timidez e a cautela com que os governos apresentam quando o assunto são as metas de redução de emissões. O medo de que reduzir emissões levará a uma redução de crescimento econômico é evidente. Não foi diferente no Brasil. A discussão sobre as metas brasileiras sobre o quanto o país poderia reduzir de emissões mostrou o receio do governo de que as metas anunciadas prejudicariam o crescimento do PIB.

Aparentemente, a falsa ideia de que não será possível crescer economicamente no futuro a não ser através do atual modelo carbono (fóssil) intensivo ainda é arraigada nos governantes. Assume-se que, para crescer, muito óleo terá que ser ainda queimado. Desconsidera-se totalmente o fato de que um crescimento econômico futuro vigoroso num mundo aquecido, se dará em países que tomarem as decisões certas hoje: conservação de florestas (grandes armazéns de carbono e biodiversidade), desenvolvimento tecnológico de energias limpas e renováveis, uma indústria e agricultura sustentáveis e ambientalmente amigáveis e um destino mais nobre ao petróleo. Esquecem-se ainda que decisões em favor da conservação das florestas brasileiras, da redução do desmatamento, combinado com a redução de emissões de outros setores (transporte e energia) representa um tipo de poupança ou investimento de longo prazo.

Aquilo que parece ter um custo econômico elevado hoje representa prevenção de grandes prejuízos econômicos no futuro, advindos da mudança do clima. Basta dizer que a conservação da Amazônia, por exemplo, representará na prevenção de bilhões de dólares em prejuízos para o Brasil e para o mundo como um todo. O que quero dizer é que parte significativa do crescimento futuro do PIB do Brasil poderá ser resultante da uma economia de baixo carbono que decidirmos implementar hoje. Em Copenhagen estarão sendo debatidos os mecanismos de Redução de Emissões de Desmatamento e Degradação florestal (o tal REDD), do qual o Brasil poderá se beneficiar economicamente. Com metas e aproveitando bem o que o REDD poderá oferecer em termos de compensação pelos esforços de redução do desmatamento, o Brasil poderá entrar na nova década na van- guarda da economia de baixo carbono. Só depende de nós brasileiros.

  • Paulo Moutinho

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