Análises

Caatinga: o bioma quase esquecido que resiste com ciência, conservação e esperança

As iniciativas de conservação, a produção constante de pesquisas científicas e o envolvimento cada vez maior da sociedade oferecem novas perspectivas para a Caatinga

Jaquelyne Costa ·
9 de maio de 2025

Num país de florestas tropicais e cerrados vastos, a Caatinga ainda luta para não ser esquecida. Exclusivamente brasileira, moldada pela seca e pela resistência, ela abriga uma biodiversidade tão rica quanto ameaçada. Passado o Dia Nacional da Caatinga, comemorado no dia 28 de abril, a pergunta que ecoa é urgente: o que estamos fazendo para proteger este bioma que insiste em sobreviver, mesmo diante do desmatamento, da desertificação e das mudanças climáticas?

A situação da Caatinga é alarmante. O bioma já perdeu cerca de 40% de sua cobertura original – um impacto que corresponde a mais de 34 milhões de hectares, área comparável ao tamanho do estado de Goiás. Para agravar o cenário, 112 municípios já foram classificados como Áreas Suscetíveis à Desertificação (ASD), com níveis que vão de grave a muito grave. A perda da vegetação nativa não só empobrece o solo, como também compromete a vida das comunidades que dependem diretamente dos recursos naturais da região.

Biodiversidade em risco

Mesmo enfrentando tantas pressões, a Caatinga abriga uma diversidade impressionante: são 548 espécies de aves, 386 de peixes, 224 de répteis, 183 de mamíferos, mais de 220 espécies de abelhas, 98 de anfíbios, além de uma infinidade de invertebrados. Mas o alerta é grave: aproximadamente 15% das mais de 3.200 espécies analisadas estão ameaçadas de extinção, incluindo figuras emblemáticas como o tatu-bola e a jaguatirica. A caça ilegal e o tráfico de animais silvestres continuam a pressionar a fauna, e ações de fiscalização têm revelado apreensões de centenas de animais em apenas um estado, em operações recentes.

Impactos das mudanças climáticas

As mudanças climáticas tornam o futuro da Caatinga ainda mais incerto. Pesquisas apontam que, até 2060, 99% das comunidades de plantas poderão sofrer perdas severas de espécies, com a substituição gradual das árvores por vegetação de menor porte. Para os mamíferos terrestres, o cenário também é crítico: 91,6% das comunidades estão ameaçadas, com espécies como o tamanduá-bandeira e o tatu-canastra em risco de desaparecer da região. As alterações climáticas não impactam apenas a biodiversidade; afetam diretamente os serviços ecossistêmicos que sustentam a vida humana, como a regulação do clima e a disponibilidade de água.

Iniciativas de conservação: o trabalho do CEMAFAUNA, NEMA e CEBIVE

Diante de tantos desafios, a ciência e a conservação vêm como aliados da Caatinga. Instituições ligadas à Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), sediadas no Campus de Ciências Agrárias, como o Cemafauna, o NEMA e o CEBIVE, têm se destacado no esforço de proteger o bioma.

CEMAFAUNA: o Centro de Conservação e Manejo de Fauna da Caatinga é sediado em Petrolina (PE), realiza ações de resgate, reabilitação e reintrodução de animais silvestres. Também desenvolve projetos de educação ambiental e pesquisas que ajudam a ampliar o conhecimento sobre a fauna da região.

NEMA: o Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental tem como foco a flora, promove estudos para entender e conservar a biodiversidade vegetal da Caatinga, além de atuar fortemente na educação ambiental e no envolvimento de comunidades locais.

CEBIVE: o Centro de Estudos em Biologia Vegetal guarda o Herbário de Referência do Sertão Nordestino (HRSN) e contribui para o mapeamento e preservação da diversidade de plantas do bioma, além de desenvolver pesquisas sobre a flora local, auxiliando na preservação e recuperação da vegetação nativa.

Essas instituições também atuam em projetos de reflorestamento, monitoramento da biodiversidade e formação de redes de conhecimento, buscando mitigar os impactos das ações humanas e das mudanças climáticas.

As iniciativas de conservação, a produção constante de pesquisas científicas e o envolvimento cada vez maior da sociedade oferecem novas perspectivas para a Caatinga. A atuação comprometida de instituições como o CEMAFAUNA, NEMA e CEBIVE mostra que é possível recuperar áreas degradadas, reintroduzir espécies e fortalecer a consciência ambiental sobre um bioma muitas vezes esquecido. Caatinga resiste – e a ciência, a conservação e a esperança seguem sendo seus aliados mais fiéis.

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

  • Jaquelyne Costa

    Assessora de Comunicação do Centro de Conservação e Manejo de Fauna da Caatinga (Cemafauna), do Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (NEMA) e do Centro de Estudos em Biologia Vegetal (CEBIVE) - Univasf

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