Análises

Capacitação insere açaí do Marajó em novos mercados da bioeconomia

São mudanças simples, mas com impactos enormes, pois permitem que as famílias que vivem da cultura do açaí melhorem sua renda ao mesmo tempo em que cuidam da floresta

Rubens Magno ·
5 de setembro de 2024

Típico da Amazônia, o açaí é conhecido por seu sabor único e por oferecer diversidade de possibilidades de preparo, do doce ao salgado, além da versatilidade, que permite desde a utilização na indústria cosmética até a fabricação de tijolos com seu caroço. Para as populações ribeirinhas, o fruto é também essencial para garantir segurança alimentar e fonte de renda. Essa cadeia de valor movimenta, somente no Pará, responsável por 90% da produção nacional, cerca de 1,5 milhão de toneladas e quase R$ 3 bilhões por ano, segundo o IBGE. 

O Arquipélago do Marajó tem dois municípios entre os dez maiores produtores de açaí do Brasil – Bagre e Anajás –, segundo a Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa). No entanto, apesar do enorme potencial econômico do fruto, a região ainda tem um dos índices de desenvolvimento humano (IDH) mais baixos do país. Como então mudar essa realidade, tendo em vista o valor do produto e seu interesse internacional? Com capacitação. 

No Marajó, uma iniciativa do Sebrae do Pará, em parceria com a Embrapa, tem mostrado que esse é o caminho. No projeto Sustenta e Inova, que já beneficia indiretamente cerca de quatro mil famílias, nos 17 municípios da região, os ribeirinhos que vivem da extração do açaí estão aprendendo novas formas de manejo que melhoram a produtividade, ajudam a restaurar áreas degradadas e são menos agressivas para o ecossistema da floresta. Com a implantação de tecnologias e boas práticas de preparar a terra e cultivar o açaí, os produtores relatam que, além de aumentar a produção, melhoraram a qualidade dos frutos e prolongaram o tempo de safra – o que tem um impacto direto na venda do produto, que passa a valer mais no mercado.

A capacitação também está se mostrando essencial para o acesso a novos mercados, que estão cada vez mais exigentes. Além de ganharem mais dinheiro com o uso sustentável da terra, as famílias aprendem a mapear as exigências dos mercados institucionais e privados, recebem treinamento e se familiarizam com o processamento de produtos e a agroindustrialização. Paralelamente, esses mercados passam a conhecer essas comunidades e seus produtos. Com isso, o trabalho de capacitação ajuda a aproveitar a riqueza biológica, cultural e social presente no Marajó para a promoção de um desenvolvimento que insira essas comunidades em circuitos da bioeconomia.

Esse é um programa que está alinhado à agenda da COP 30, que acontecerá no Pará em 2025, pois ajuda a plantar a semente para o fortalecimento de uma das mais promissoras cadeias baseadas na bioeconomia amazônica, já que os visitantes da conferência provavelmente repetirão a predileção, já identificada em mercados internacionais, pelo consumo da fruta. 

Nosso objetivo é reverter um contexto de empobrecimento ambiental, econômico e social, causado pelos sucessivos ciclos de exploração de recursos na ilha – borracha, castanha, madeira, palmito e, mais recentemente, açaí – que resultaram em uma degradação não só do ecossistema, mas também da qualidade de vida de quem vive do extrativismo. 

São mudanças simples, mas com impactos enormes, pois promovem a economia local e permitem que as famílias que vivem da cultura do açaí melhorem sua renda ao mesmo tempo em que cuidam da floresta, que é onde vivem e trabalham. 

Neste dia da Amazônia e também do açaí, fica a reflexão e o exemplo de que é possível produzir respeitando a natureza e seus ciclos para devolver ao produtor ganhos econômicos e mais qualidade de vida.

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