De Wladimir Belisário Junior Chefe de Gabinete e Assessor Jurídico do deputado Hamilton Pereira“ANOS TRISTES”(Em resposta ao artigo “Dias Tristes” de autoria do Professor Marc Dourojeanni)Prezado professor Marc Dourojeanni,E lá se vão quase vinte anos de triste descaso, desde a promulgação da Lei Estadual Paulista nº 5.649, de 28/4/87, que criou a Estação Ecológica da Juréia-Itatins, não somente dos órgãos ambientais do poder público paulista, mas também das entidades ditas “ambientalistas”, em sua grande maioria formada e integrada por estrangeiros, cujos países onde nasceram já degradaram seu meio ambiente de tal forma, que se acham no direito de dar-nos lição de preservação ambiental, ou mesmo acerca daquilo que acham que é bom ou ruim, como se alguma autoridade moral tivessem para isso. São quase vinte tristes anos que as populações tradicionais que sempre habitaram a Juréia são privadas dos seus direitos fundamentais garantidos pela constituição federal, sem que, no entanto, tais restrições tivessem garantido a preservação ambiental daquele importante patrimônio da humanidade, professor. E por incrível que pareça, aquela unidade de conservação é mantida, não pelos órgãos ambientais paulista, mas sim graças à convivência harmônica entre aquelas populações tradicionais e o seu meio, a floresta. A degradação é causada pela falta de uma política ambiental por parte do governo do estado, que não investe em estrutura e fiscalização de suas unidades de conservação, aliada às constantes invasões ocorridas, sobretudo, no norte da Juréia, à partir da Fazenda Vista Grande, na qual, dia a dia, novos posseiros chegam oriundos de outros estados da federação e ali se instalam e invadem a Estação Ecológica, promovendo grandes derrubadas de mata nativa para o plantio de bananais. Tais invasores chegaram a derrubar 300 hectares de mata em apenas dez dias, na região do Despraiado, norte da Juréia, no Município de Miracatu, sem que a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, o Instituto Florestal e a Polícia Ambiental movessem “uma palha” sequer, para coibir tal degradação, ou mesmo responsabilizar os autores desse crime ambiental, apesar das reiteradas denúncias das populações tradicionais residentes nas proximidades.É uma utopia, professor, considerar garantida a proteção ambiental de uma unidade de conservação somente com a total exclusão da atividade humana, tentando a administração pública e organizações, impô-la valendo-se das normas legais; principalmente se as referidas normas legais que instituíram as reservas ambientais foram criadas sem solucionar a questão fundiária preexistente, como é o caso da Estação Ecológica da Juréia-Itatins.O Projeto de Lei nº 613, de 2004, de autoria dos Deputados paulistas Hamilton Pereira e José Zico Prado, que altera os limites da Estação Ecológica da Juréia-Itatins e exclui as áreas ocupadas pelas populações que especifica, recategorizando-as, ao contrário do que foi dito, não serão transformadas em reserva extrativista, e sim, em reserva de desenvolvimento sustentável – RDS, baseada num elaborado plano de manejo. Se Vossa Senhoria conhecesse o teor do referido projeto, certamente não teria proferido tais despautérios, como: “... que qualquer pessoa poderá fazer nela (Estação Ecológica da Juréia-Itatins) o que bem quiser... desde cultivar banana ou criar gado a construir pousadas, urbanizar, coletar palmito ou caçar com o pretexto de que é para o sustento familiar”. Tudo indica que sequer leu o mencionado projeto de lei. Mas, resumirei seu conteúdo – O que se pretende com o PL 613/2004, é o “congelamento” da situação atual, para que não haja mais degradação, protegendo a floresta, e ao mesmo tempo possa fornecer condições dignas de sobrevivência àqueles que lá sempre residiram. O mencionado “congelamento” se dará mediante o levantamento das áreas ocupadas e sua respectiva demarcação; o rol e o cadastro dos ocupantes e o levantamento e demarcação das ocupações individuais, para que não haja o aumento das áreas já ocupadas. Feito isso, o Estado outorgará um Termo de Permissão de Uso, à título precário a esses ocupantes, que é intransferível e inalienável. O domínio de tais áreas é, e continuará sendo, do Estado, podendo ser revogado por descumprimento de cláusulas, retomando-se a área.Quanto à questão de que provavelmente os Deputados ou “seus acólitos já tenham escolhido os setores que lotearão para residência de lazer”, a isto não responderei, a não ser mediante competente ação judicial, caso não haja por parte de Vossa Senhoria a devida retratação, a ser veiculada da mesma forma e no mesmo veículo de divulgação utilizado para a triste e equivocada matéria “Dias tristes”, de sua autoria. A atuação desses Parlamentares sempre foi pautada pela ética, e a defesa do povo paulista, sendo sua atuação motivo de elogios e admiração dentre seus Pares e cidadãos do Estado. A bandeira em defesa do meio ambiente sempre foi levantada por esses Deputados, porém, nunca levantada com exclusividade, em detrimento da bandeira da dignidade da pessoa humana. Resposta do Autor: Prezado Senhor Wladimir Belisário Junior:Agradeço seu ponderado e bem escrito comentário sobre meu artigo "Dias tristes", publicado a semana passada nestas mesmas páginas. Com respeito ao que nele opina e diz tenho algumas coincidências, grandes diferenças e, eu aceito isso, uma necessidade de esclarecimento de minha parte.A coincidência é plena com o conteúdo de seu primeiro parágrafo. O Governo do Estado de São Paulo tem sido omisso com a Estação Ecológica Juréia-Itatins e com todas as suas unidades de conservação. Elas nunca receberam a atenção orçamentária mínima necessária para cuidar do patrimônio natural que contêm, para resolver os problemas sociais que confrontam, nem para pôr essas áreas esplêndidas a serviço da educação ambiental e da recreação em ambiente natural. Ou seja, o Estado de São Paulo, tanto como o governo federal no que lhe compete, são os grandes responsáveis pela situação atual das unidades de conservação por eles geridas. Se algo existe ainda de tais unidades de conservação, isso se deve ao esforço de pessoas de boa vontade, muitas vezes funcionários públicos mal remunerados e voluntários, que lutaram contra a burocracia e o descaso dos políticos do Executivo e do Legislativo que determinam as verbas que permitiriam o bom manejo das áreas. É evidente que áreas naturais semi-abandonadas não resolvem eventuais problemas sociais pendentes e que ademais são invadidas por pessoas que ao passar o tempo adquirem direitos, conforme a lei.Com respeito à sua afirmação de que é utópico preservar a natureza em unidades de conservação sem gente, apenas respondo, com muito conhecimento de causa, que é duplamente utópico preservá-las com gente dentro que vive de explorar os seus recursos. Reconheço que se existe gente nas áreas antes do estabelecimento da unidade, como o senhor afirma que é o caso, devem receber um tratamento especial. Evidentemente, a área que ocupam nem deveria ter sido incluída na unidade, salvo que fosse ecologicamente indispensável fazê-lo, o que parece ser o caso. Mas o que agora se propõe fazer é sim, como o próprio senhor confirma, reduzir o tamanho da unidade de conservação existente e entregar uma parte substancial a seus ocupantes. A informação que eu recebi falava de reserva extrativista e o senhor me informa que, na verdade, a porção cerceada seria uma reserva de desenvolvimento sustentável. E, eu pergunto, qual é a diferença? Em ambas as categorias, inclusive se a lei é respeitada, o pessoal pode caçar, pescar, coletar palmito, desenvolver agricultura, praticar ecoturismo, construir postos de venda, atrair visitantes, demandar ou construir infra-estrutura de transporte e energia e obter toda classe de serviços sociais. Se puder fazer tudo isso, sem desmatar mais e sem impactar negativamente a minúscula e isolada amostra da natureza que é a Estação Ecológica Juréia-Itatins, será uma novidade universal. O papel, os projetos de lei e as leis, agüentam tudo. Inclusive os bons propósitos dos proponentes, mas isso sim que é utopia pura. Tanto mais que o custo de compatibilizar esse tipo de atividade com a natureza de unidades de conservação é muito maior que o do manejo tradicional, sem população. E o senhor não menciona quantos milhões de reais por ano será consignado nos orçamentos dos próximos vinte anos para fazer realidade do sonho.No meu artigo, que não se refere única nem exclusivamente ao caso acima discutido, proponho que no lugar de reduzir ou eliminar as unidades de conservação de proteção integral, os políticos votem os recursos orçamentários necessários para reassentar, digna e consensualmente, as populações cujas atividades são incompatíveis com as necessidades de preservar o patrimônio natural nacional. Mas, apesar de que sempre existe dinheiro para reassentar populações que ocupam áreas de influência de obras hidroelétricas ou de estradas, nunca há dinheiro para reassentar invasores ou habitantes de unidades de conservação. O resultado é simples; o país continuará perdendo irremediavelmente seu patrimônio natural, em especial sua biodiversidade, que é de todos.Sobre o último ponto de sua nota, eu admito não conhecer os deputados que fizeram o projeto de lei e, obviamente, não tenho nenhuma evidência de que seu objetivo seja o mencionado por mim. De fato, eu mencionei isso apenas como possibilidade e exemplo, na minha nota e, por isso também, seus nomes nem foram citados. Alegra-me muito saber que seus propósitos, embora em minha opinião equivocados, são honestos.Marc Dourojeanni →
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Redação ((o))eco
6 de outubro de 2005