Qualquer país em desenvolvimento que queira crescer, vai precisar de mais energia. Este fato é inconteste e não há ser humano que queira viver na escuridão hoje em dia. O que se discute muito em um país emergente como o Brasil é quais são as fontes mais propícias e mais baratas. Prefere-se em geral a hidroeletricidade porque, também se vende a falácia ou, melhor, a meia verdade, que é uma energia renovável e pouco poluente. Ainda, uma vez mais, se está favorecendo radicalmente a bio-energia porque, segundo seus promotores, também é renovável, além de “limpa” Essa, lamentavelmente, é outra media verdade.
A HIDROELETRICIDADE
“Apenas” 27% do potencial hidroelétrico do Brasil foram usados. Na Amazônia foram “somente” 6,7%. No sudeste 53%. E como, para obter essa energia, se destruiu ambientes naturais. Acontece que “usar só uma percentagem” do potencial não significa que algum rio se salvou de ser barrado. Apenas quer dizer que mais barragens podem ser feitas nesses e em outros rios. O Tietê é um rio com um barramento atrás do outro. No Estado de São Paulo, praticamente não existe rios sem represas. Não há ictiofauna que resista. Não tem paisagem que resista.
Na natureza os elos alimentares determinam o extermínio daqueles animais que dependem dos peixes e outros seres aquáticos, que são os mais afetados pelas barragens. Mesmo em hidroelétricas onde se tomou muitos cuidados ambientais, suas conseqüências são visíveis para o bem estar da flora e fauna silvestres. Por exemplo, a do Manso em Mato Grosso, vem determinando a impossibilidade de reprodução de muitas aves que nidificam nas praias do rio Cuiabá, na seca. Esta barragem igualmente ocasiona severos distúrbios na reprodução dos peixes, confundidos pelas variações inesperadas do caudal. Aumentaram em muito os aguapés nas baías, que também interferem na reprodução de peixes e no escoamento de vários igarapés e baías pantaneiras. Isto por causa da diferença de vazão em um bioma que naturalmente intercala um biótopo seco, com um biótopo úmido. Mas, talvez a usina de Balbina na Amazônia, que inundou mais de 200 mil hectares para uma produção ínfima de megawatts, seja um dos mais tristes exemplos no Brasil.
O plano do atual governo prevê um aumento de cerca de 31 mil MW, até o ano 2015, com 84 novos empreendimentos. Várias hidroelétricas estão prestes a serem licenciadas. Muitas, ou a grande maioria, na Amazônia, incluídas algumas enormes como as previstas no rio Guaporé.
OS BIOCOMBUSTÍVEIS
A mania das energias “renováveis” promovidas sem nenhum cuidado, esconde um grande perigo ambiental. O programa do álcool que já destruiu nas décadas passadas grande parte da Mata Atlântica, prevê um aumento de 17%, significando mais de 2 milhões de hectares de novas áreas para plantio de cana de açúcar. Pior ainda: quanto se precisará para “o maior programa do mundo”, segundo disse nosso Presidente na televisão, de obtenção de biodiesel com plantas passíveis de produzirem óleos, como, por exemplo, soja, mamona e dendê? Será que serão usados os 60 milhões de hectares já desmatados na Amazônia, ou os outros milhões com pouco uso em outras regiões do país? Ou será que vão desmatar outra vez, a exemplo do que já foi feito com a Mata Atlântica no nordeste e em solos de primeira no Estado de São Paulo para a cana de açúcar? Será que vão continuar com a queima da cana de açúcar?
Afinal estamos no quarto lugar do mundo em emissões de gás carbônico e outros tóxicos, devido, em grande medida, às queimadas e incêndios florestais. De outra parte como pode o governo acreditar e, pior, fazer o povo do Brasil acreditar que se pode produzir tanto bio-combustível sem usar quantidades massivas de agro-químicos, inclusive pesticidas? Como então dizer que são fontes “limpas” de energia? Além da poluição atmosférica, os agrotóxicos e fertilizantes, assim como o processamento da matéria prima muito frequentemente poluem rios e outras fontes de água e, acabam com nascentes e matas ciliares e esgotam os solos. A água é outro bem precioso para o futuro do Brasil.
É demagogia apresentar soluções mágicas, escondendo o outro lado da equação. Não se trata de se opor a uma ou outra medida para resolver as necessidades energéticas. Trata-se, isso sim, de avaliar cuidadosa e responsavelmente todas as opções disponíveis, sem dissimular os prós e os contras.
OUTRAS FONTES ENERGÉTICAS
Assim mesmo é evidente que as termoelétricas a carvão mineral e de derivados podem ser bem mais poluentes e indesejáveis. Já as usinas de energia nuclear são evitadas porque, por décadas, foi uma fonte bem mais cara que as outras e pelos seus resíduos atômicos. Se não fosse o problema do lixo atômico e a perversidade das seqüelas de remotos, mas possíveis acidentes nucleares seria uma fonte bem menos dramática para o meio natural que a hidroeletricidade ou a termoeletricidade. Fiquei pasma estes dias ao escutar um candidato à Presidência dizer que é favorável à energia nuclear. Teve peito, ah se teve. Foi Cristóvão Buarque. Claro está que se investir em fontes energéticas como a solar e a eólica é altamente desejável em um país com as condições climáticas do nosso, mas precisamos de mais energia, grandes quantidades e porque não a nuclear?
CONSCIENTIZAÇÃO
Um ponto ainda muito pouco levado a sério no Brasil é o de economia de energia, seja de que fonte for. Nós desperdiçamos, esbanjamos energia. Não nos importa saber quantos rios foram mortos, quantas espécies foram exterminadas, quanta mata foi engolida, queremos é nos banhar de preferência duas vezes por dia, usando água aquecida, em geral por energia hídrica. Lavamos carros só para que fiquem brilhantes e bonitos. Os lavamos até na seca. Não temos pejo de deixar luzes acesas, TVs ligadas todo o tempo pela casa, de utilizar aparelhos elétricos ou eletrônicos velhos e pouco eficientes. Ou será que a maioria não se dá conta do que está fazendo com aquele meio ambiente de que tanto gosta?
CONCLUSÃO
Será mesmo que queremos tantas hidroelétricas como as planejadas e previstas para os próximos 10 anos? Será que queremos ver muitos outros rios, eminentemente na Amazônia, sem vida? Será que vamos mesmo precisar de todos estes megawatts que querem nos entrouxar? Porque não economizamos muito, muito mais, para ver se podemos contribuir para diminuir a degradação ambiental provocada pela hidroeletricidade, como, também, por muitas outras fontes de energia, até que a eólica, a solar ou outra fonte menos drástica para o ambiente possa suprir as necessidades desenvolvimentistas da nossa nação? Porque embarcarmos sem restrições nos programas do biodiesel e do álcool que ocasionaram danos irreversíveis à tão apregoada biodiversidade nacional? Porque não se considerar, também, a nuclear? A solução de como obter toda a energia necessária para o desenvolvimento do país, agora e no futuro e quais as melhores fontes, passa por uma análise estratégica que tem de levar em consideração os reais impactos ambientais e sociais. Minimizá-los ou camuflá-los é postergar problemas ou, pior, criar novos ainda mais complexos.
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