Agora podemos ficar tranqüilos. Choveu nos reservatórios do Sudeste e nos livramos do perigo iminente do apagão. Na falta de opções técnicas ou soluções econômicas viáveis para a segurança energética de longo prazo do país, o presidente Lula aproveitou a crise para lotear o ministério das Minas e Energia e as estatais do setor entre os apadrinhados do PT e do PMDB. A insegurança energética não ameaça mais a segurança nacional. Mas, infelizmente, a segurança nacional nunca está segura. Agora sofre grande perigo com a ameaça de divulgação do cardápio servido ao presidente e seus amigos e dos gastos de sua filha pagos com o dinheiro do impostaço.
É claro que a ameaça energética que ronda o Brasil não passou. A nossa tolerância com o risco e o desmazelo é que continua robusta. Oficialmente, o perigo passou quando os reservatórios do Sudeste-Centro-Oeste atingiram 56,3%, menos de um ponto percentual acima da margem de risco. No Nordeste estão em 35,6%, no Norte, em 33,96% e no Sul, 62,06%, mas caindo. O que há, realmente, é uma superexploração das hidrelétricas, operando sempre no limite de capacidade, entra ano, sai ano. Mas o maior perigo é a estreiteza com que abordamos a questão energética. Antes que a tropa da picuinha se manifeste: o governo Fernando Henrique também foi medíocre na sua política energética e pagou caro pela imprevidência.
Um balanço do que se discutiu sobre o problema da energia no Brasil, durante esses meses de dedos cruzados, esperando que a meteorologia resolvesse no curto prazo o risco criado por erros sucessivos de política energética no país, mostrará que foi uma discussão pobre, enviesada, carregada de velhos interesses e discutíveis motivações. O que se discute é porque o modelo elétrico concebido para o país nos anos 40 e 50 do século passado, não anda funcionando e o que é preciso fazer para que volte a funcionar. Não passa pela pauta de discussão a idéia de que o modelo está exaurido, fez o seu papel, quando era contemporâneo das necessidades que vinha suprir. Ninguém admite que ele precisa ser substituído por um projeto energético diferente, contemporâneo dos desafios e possibilidades do século XXI, para que tenhamos segurança energética de longo prazo.
O debate energético brasileiro sofre um bloqueio praticamente impenetrável e de muito longa duração contra qualquer iniciativa a favor de fontes de energia elétrica, que não sejam as “mega-hidrelétricas”. O mundo inteiro está investindo em energia eólica e fotovoltaica (eletricidade solar). O mercado de energia eólica cresceu 30%, em 2007. Na China, ele triplicou. No EUA, dobrou. Na Espanha cresceu 30%, com adição de 3500 MW à rede. Na Alemanha, cresceu 8%, em meio a notícias de desaquecimento do mercado de energia no país. Ainda assim, foram adicionados 1700 MW ao parque eólico, que totalizou quase 22,500 MW, ainda o maior do mundo. O Brasil não chega a 250 MW de potência instalada.
Em todo o mundo, hoje, as estratégias energéticas são definidas tendo como objetivo central buscar o caminho de uma economia global de baixo carbono – ou seja, de baixas emissões de gases de efeito estufa – e para isso combinam soluções de grande escala para a indústria e outras atividades intensivas em energia elétrica, com soluções de pequeno porte – e até “microsoluções” – para dar segurança energética, por meio de fontes diferenciadas de baixo carbono, para cidades, bairros, novas edificações e assim por diante. Diversificação de fontes, soluções e escalas técnicas se tornou a diretriz estratégica dominante no resto do mundo. Livres dessa mentalidade da grande obra, que aprisiona o Brasil numa posição com pouquíssimas soluções alternativas, a diversificação da matriz elétrica – e energética – se tornou parte integrante das discussões sobre a segurança futura da maioria dos países desenvolvidos e emergentes do mundo. Dos grandes, só o Brasil está de fora. Mas, no Brasil, tudo é diferente.
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