Colunas

Alternativas limpas

O petróleo dobrou de preço nos últimos três anos. O fenômeno pode decretar a morte dos combustíveis fósseis, com sua substituição por fontes limpas de energia.

17 de junho de 2005 · 19 anos atrás
  • Eduardo Pegurier

    Mestre em Economia, é professor da PUC-Rio e conselheiro de ((o))eco. Faz fé que podemos ser prósperos, justos e proteger a biodiversidade.

Essa semana o preço do barril de petróleo aproximou-se dos 60 dólares. Previsões conservadoras indicam que o barril pode chegar a 100 dólares até 2010. A notícia é ótima para os ecologistas, preocupados com o efeito estufa, decorrente da queima de combustíveis fósseis. Mas, a curto prazo, péssima para os prognósticos de crescimento da economia mundial, ainda altamente dependente da energia gerada por petróleo e gás natural.

Os choques de petróleo dos anos 70 foram causados pela habilidade da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEC, da sigla em inglês) em restringir a oferta mundial da commodity. Os preços voltaram a baixar quando o cartel perdeu força. Enquanto estiveram altos, estimularam o aumento da eficiência no seu uso e incentivaram a prospecção de óleo em outras partes do mundo. Mas, hoje, vivemos um novo choque, muito mais consistente. Os preços do petróleo dobraram recentemente em decorrência do forte aumento da demanda de gigantes como China e Índia, que despertaram para o desenvolvimento econômico. É muito provável que, dessa vez, os preços altos tenham vindo para ficar.

Será que o petróleo vai acabar? A resposta é não. Previsões baseadas no consumo corrente esquecem que o aumento de preço reduzirá o consumo e induzirá ao surgimento de fontes de energia alternativas. E essa é a grande notícia. Se o preço alto do petróleo realmente perdurar, podemos estar perto do fim da era dos combustíveis fósseis, no limiar da sua substituição por fontes limpas e renováveis de energia, um sonho de ambientalistas do mundo todo.

Em agosto de 2004, nos EUA, foi lançado o WilderHill Clean Energy Index, um índice de ações formado por 37 empresas ligadas a conservação de energia e geração por fontes limpas. Em menos de um ano de vida, esse índice subiu 22,7%, uma performance considerada excelente. O valor dessas ações varia na mesma direção do preço do petróleo. Quanto mais alto, maior o volume de recursos para a pesquisa de novas alternativas de energia, em geral, limpas, já que as leis ambientais são cada vez mais estritas. Com isso, esperam-se saltos tecnológicos no setor que as tornem cada vez mais baratas.

A energia elétrica “verde” já tem preço competitivo, especialmente a gerada por turbinas movidas a vento. Os benefícios ambientais são um bônus. A energia eólica custa 4,2 centavos de dólar por Kwh. A gerada por carvão, 4 centavos; gás natural, 6,8 centavos; óleo, 9,1 centavos; e nuclear, 10 centavos. A substituição do combustível dos carros ainda é mais difícil, porque a disponibilidade de biocombustíveis como o álcool e o biodiesel ainda é pequena.

Mas o mercado de carros movidos a bicombustíveis está crescendo. No Brasil, os flexíveis a álcool e/ou a gasolina ultrapassaram, em junho desse ano, as vendas dos carros a gasolina. Nos EUA, carros mistos, que podem consumir energia elétrica na cidade e gasolina na estrada, como o Prius da Toyota, vendem cada vez mais. Essa é uma fase de transição. Tudo indica que, no futuro, os carros usarão hidrogênio, uma possibilidade técnica já real, mas cuja viabilidade prática ainda deve demorar vários anos. Quando acontecer, os carros deixaram de ser uma fonte de poluição, pelo menos do ar.

No centro de Londres, está sendo construído um complexo residencial auto-suficiente em energia elétrica. As casas usam turbinas a vento e painéis solares para gerar energia elétrica. Um isolamento térmico sofisticado evita grandes variações de temperatura, e a arquitetura inteligente reduz o esforço de aquecer ou esfriar o interior. Elas queimam zero de combustíveis fósseis, contribuindo para reduzir o efeito estufa e melhorar a qualidade do ar.

O petróleo será vítima do seu próprio sucesso. A alta dependência do produto e o preço nas alturas decretarão seu fim. Desde os tempos de Malthus, no início do século XIX, fala-se que esbarraremos em limites para o crescimento do bem-estar material humano. Desde então, a população do planeta quase decuplicou, passando de cerca de 700 milhões de pessoas, antes da revolução industrial, para os mais de 6 bilhões atuais. Ao mesmo tempo, a esperança de vida dobrou, beirando os 80 anos nos países desenvolvidos. Embora ainda dramáticos, os níveis de pobreza não param de cair. O preço dos produtos agrícolas e commodities em geral também só fazem diminuir.

O desenvolvimento econômico incentiva a melhoria tecnológica que, por sua vez, o realimenta. Mais uma vez, a tecnologia salvará a economia e, por tabela, o meio ambiente. Se as novas formas de energia limpa vingarem, como tudo indica, o petróleo será paulatinamente substituído. Ironicamente, sobrará.

Leia também

Análises
18 de novembro de 2024

Uma alga desafia o Brasil: Estamos preparados para uma nova arribada massiva de Sargaços?

Enquanto o Caribe vive um embate anual contra estas algas, o Brasil está como que aguardando uma bomba-relógio prestes a explodir a qualquer momento

Podcast
16 de novembro de 2024

Entrando no Clima#36 – Primeira semana de negociações chega ao fim

Podcast de ((o))eco escuta representantes de povos tradicionais sobre o que esperam da COP29 e a repercussão das falas polêmicas do governador Helder Barbalho.

Notícias
16 de novembro de 2024

COP29 caminha para ser a 2ª maior na história das Conferências

Cerca de 66 mil pessoas estão credenciadas para Cúpula do Clima de Baku, sendo 1.773 lobistas do petróleo. Especialistas pedem mudança nas regras

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.