O mundo piora quando nasce mais um ser humano? Um novo bebê condena todos a um padrão de vida um pouquinho pior? Ou talvez não… Mais gente pode ajudar a melhorar o conforto material da humanidade como um todo?
Sobre o assunto, evoco dois profetas que, se não tivessem vivido em séculos diferentes, teriam adorado debater. O primeiro é Thomas Malthus (1766-1834), economista inglês que, em 1798, escreveu An essay on the principle of population. O livro previa conseqüências sombrias para o crescimento populacional, que tenderia a exceder a capacidade de produzir comida. O resultado seria a miséria contínua.
Nos últimos 200 anos, Malthus perdeu. Nesse período, a população mundial cresceu 6,5 vezes e a expectativa de vida dobrou. Mesmo assim, a comida ficou cada vez mais barata, graças ao contínuo aumento da produtividade no campo.
Mas Malthus fez escola. Quem já não ouviu ou argumentou que a humanidade, como um todo, jamais poderá ter o padrão de vida dos felizardos que moram nos poucos países ricos? Especialmente americanos, símbolos de opulência. Talvez, o mais ferrenho malthusiano moderno seja Paul Ehrlich, professor da universidade de Stanford, que escreveu, em 1968, The population bomb, onde previa alta probabilidade do mundo experimentar fomes terríveis já na década de 80. Numa tirada famosa, Ehrlich disse acreditar que as chances da Inglaterra existir até o ano 2000 seriam de, no máximo, 50%.
Eis que entrou em cena, Julian Simon (1932-1998), maior antagonista de todos os tempos das idéias de Malthus. Na década de 80, ele desafiou as previsões malthusianas com uma avalanche de evidências históricas, em livros como The state of humanity e The ultimate resource. Suas conclusões? O crescimento populacional era sustentável, os recursos naturais estavam se tornando mais abundantes, a qualidade do meio ambiente estava melhorando e a humanidade estava destinada a ter um padrão de vida cada vez melhor.
Ehrlich, que sobre Simon declarou, “A única coisa na Terra que nunca vai se esgotar são imbecis”, perdeu uma aposta contra ele. A disputa, acertada em 1980, era sobre o preço futuro de cinco commodities metálicas escolhidas por Ehrlich: cobre, níquel, cromo, estanho e tungstênio. Se, em 1990, corrigido pela inflação, o preço delas fosse menor, Simon ganharia. E foi o que ocorreu. Ehrlich propôs uma nova aposta em outras bases, como o aumento da temperatura do planeta, do dióxido de carbono e perda de florestas, mas Simon declinou. Teria perdido.
Simon foi tão apaixonadamente otimista em relação ao futuro, quanto Malthus foi negativo. Segundo ele, o mais importante recurso natural, sempre renovável, é o ser humano e sua mente inventiva. Quanto mais cabeças maior o número de idéias disponíveis para aumentar a eficiência do trabalho e do uso de recursos naturais. “Não ficaremos sem comida, água, petróleo, árvores e ar limpo, porque ao longo da história humana o preço dos recursos naturais caiu”, afirmava. Nós seríamos, de fato, os “criadores” dos recursos naturais. Por exemplo, que valor teria a areia, se o homem não tivesse inventado coisas como o vidro, o chip de computador e a fibra ótica?
Estamos em meio a um fenômeno econômico que, novamente, nos permite otimismo. A economia mundial, em média, está crescendo vigorosamente, com juros e inflação muito baixos, apesar da disparada do preço das commodities, especialmente o petróleo. O contrário da estagflação (recessão com inflação em alta) causada pelos choques de petróleo da década de 1970.
Devemos isso aos chineses. Enquanto o choque dos anos de 1970 foi de oferta, contida com sucesso pelo cartel dos principais produtores, a OPEC. Dessa vez, petróleo e outras commodities estão em alta, porque a China, um gigante de 1,2 bilhão de habitantes, meteu o pé no acelerador. Desde que abandonou a ortodoxia comunista, na década de 1980, sua economia passou a crescer a taxas em torno dos 10% ao ano, altíssimas por qualquer padrão.
O crescimento da economia chinesa colocou enorme pressão sobre os preços das commodities. Só no último ano, o preço do petróleo aumentou 50% e, batendo em 63 de dólares, já se aproxima do pico da crise dos anos 70, quando atingiu 80 de dólares, a preços de hoje. O salto chinês dos últimos 20 anos levou cerca de 300 milhões de chineses do campo para as cidades, onde prosperaram e passaram a consumir num padrão ocidental. Não seria de esperar que o mundo mergulhasse em outro período recessivo?
Não é o que está acontecendo. Aço, soja e petróleo, entre outros, estão muito mais caros. Os chineses estão consumindo commodities como nunca e fazendo os preços dispararem. Em compensação, estão devolvendo ao mundo, via comércio internacional, uma enorme produção de bens de consumo baratos. Também poupam muito, algo como 40% do seu PIB anual. Esse esforço irriga os mercados financeiros internacionais e baixa os juros. O resultado líquido é positivo. Os americanos, viciados em carros, podem se desesperar quando enchem o tanque ao dobro do preço de alguns anos atrás. Em compensação, compram de tecidos a produtos eletrônicos por preços reduzidos e financiam suas casas a juros diminutos. Cortesia dos chineses.
A prosperidade da China também aumenta a do resto do mundo. Como assim? Trezentos milhões de novos consumidores surgiram por aí e o padrão de vida mundial aumentou? Malthus, que viveu num mundo com um sexto da população atual, daria uma cambalhota. Mas é o que está acontecendo. Os salários chineses são baixos? Sim, mas muito maiores do que antes. A China está causando problemas ambientais? Tremendos, causados pela prosperidade rápida e um governo ditatorial omisso, mas que têm solução. Em suma, a China está utilizando bem as commodities que importa, aumentando a produtividade mundial.
Mais uma indicação que, provavelmente, ainda existe muito espaço para a humanidade prosperar. Com uma vantagem ambiental: matérias-primas caras nos farão pensar em como conservá-las melhor. E, no caso do petróleo, encontrar rápido um substituto limpo.
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