A educação ambiental surgiu como resposta a necessidades que não estavam sendo plenamente atendidas pela educação formal tradicional. Em outras palavras, a educação deveria incluir conhecimentos, valores, capacidades e responsabilidades, aspectos que fomentassem relações éticas entre seres humanos, e entre as pessoas e a vida no planeta. Se educação fosse plenamente abrangente, prescindiria de adjetivos como educação ambiental, educação sanitária, educação sexual, e tantas outras. Todas as áreas estariam contempladas, o que facilitaria a formação de cidadãos atuantes e engajados em melhorias que afetam a coletividade.
As primeiras grandes crises ambientais da década de 70, decorrentes de práticas industriais insustentáveis, começavam a indicar a necessidade de se repensar a educação. Foi assim que as concepções iniciais de educação ambiental emergiram. As definições de educação ambiental evidenciam uma expectativa ampla, bem maior do que meramente informar ou transmitir conhecimentos. Segundo a ‘Carta de Belgrado’ de 1975:
(…) a juventude precisa receber uma nova educação, o que requer um novo tipo de relacionamento entre estudantes e professores, entre escola e comunidade, entre sistema educacional e a sociedade. É nesse sentido que devem ser lançadas as fundações para um programa mundial de Educação Ambiental que torne possível o desenvolvimento de novos conhecimentos e habilidades, valores e atitudes, visando à melhoria da qualidade ambiental e, efetivamente, à elevação da qualidade de vida para as gerações presentes e futuras (Czapski, 1998).
Em 1977, realizou-se em Tbilisi, então União Soviética, a Primeira Conferência Inter-governamental de Educação Ambiental, quando foram identificados seus objetivos e princípios, visando ser: “orientada para a resolução dos problemas do meio ambiente através de enfoques interdisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e da comunidade” (UNESCO-UNEP, 1978:24).
Nesta ocasião, foram definidos os objetivos da educação ambiental que compreendem: (1) o desenvolvimento de consciência e sensibilidade entre indivíduos e grupos sobre problemas locais e globais; (2) o aumento de conhecimentos que possibilitem uma maior compreensão sobre o ambiente e seus problemas associados; (3) mudanças de atitudes e valores que encorajem sentimentos de preocupação com o ambiente e motivem ações que o melhorem e o protejam; (4) o desenvolvimento de capacidades que possam ajudar indivíduos e grupos a identificarem e resolverem problemas ambientais; e (5) a promoção de participação, que essencialmente significa envolvimento ativo em todos os níveis da proteção ambiental (Czapski, 1998; Dias, 1993; Pedrini, 1998).
Esses princípios têm sido a base de discussões sobre educação ambiental no mundo e no Brasil. As diversas reuniões que se seguiram não contestaram o referencial teórico proposto em Tbilisi, mas preocuparam-se em analisar meios de colocá-lo em prática. O desafio tem sido sair de generalidades e visões amplas e adequar os princípios propostos aos diferentes contextos. Nos países em desenvolvimento sempre houve uma preocupação maior de envolver o social ao ambiental, do que nos países desenvolvidos. Com certeza os contrastes que os países pobres enfrentam são mais acentuados, tendo maiores diferenças entre ricos e pobres, e entre áreas degradadas e em estado natural, que muitas vezes se tornam fontes de renda disponíveis para suprirem necessidades básicas.
A educadora ambiental canadense Lucie Sauvé, em 1996, descreveu as tendências dos quase 20 anos que sucederam a reunião de Tbilisi, mostrando que o mesmo termo tem sido interpretado de diversas maneiras. A autora analisa ‘ambiente’, ‘desenvolvimento sustentável’ e ‘educação ambiental’ e descreve como os três são muitas vezes interpretados de maneiras distintas e até com visões contraditórias. Ambiente pode ser visto como natureza intocada e digna de reverência, ou como um problema a ser resolvido. Desenvolvimento sustentado é encarado como uma conseqüência do neoliberalismo, confiando às grandes corporações e ao livre comércio o rumo a ser tomado, ou pode ser uma busca de novos paradigmas, nos quais a coletividade trabalha em prol de bens comuns. O significado de educação ambiental varia da transmissão de conhecimentos com abordagens tecnicistas, a um processo de reflexão, cooperação, inclusão e fortalecimento comunitário, cujos objetivos visam benefícios coletivos.
No México, Esteva e Reyes (1998:36), descrevem o papel da educação ambiental na construção de uma sociedade sustentável por meio dos seguintes aspectos: (1) criar e fortalecer uma consciência ética que promova o respeito à vida humana e não humana e articule uma renovada visão do mundo, na qual prevaleçam valores que permitem uma relação harmônica e de longo prazo entre a humanidade e a natureza; (2) elevar o nível de compreensão entre os membros da sociedade sobre a complexidade e a gravidade dos problemas socioambientais de tal maneira, que estes não sejam menosprezados ou percebidos com fatalidade; (3) aportar elementos conceituais e práticos que permitam às sociedades regionais e aos indivíduos ampliarem seus níveis de participação política e social para formular propostas de desenvolvimento sustentável; (4) difundir conhecimentos e alternativas específicas que permitam a indivíduos e a coletividade assumir condutas e adotar tecnologias coerentes com o desenvolvimento sustentável; e (5) contribuir para estreitar vínculos de solidariedade e respeito entre diversos grupos sociais, na busca da construção de justiça econômica e, a partir daí, reforçar os esforços que visem romper a relação entre pobreza e depredação ambiental. Com essas bases conceituais, a educação ambiental facilita a criação de uma nova cultura ambiental, que os autores concluem estar intimamente ligada ao campo da ética, pois incorpora caminhos que incluem todos os seres, e aposta na transformação social com base em novos modelos de desenvolvimento.
O mexicano Edgar Gaudiano (1998) compara a evolução da educação ambiental nos países desenvolvidos aos em desenvolvimento. Enquanto para os primeiros a preocupação era mais voltada à proteção da natureza, nos países mais pobres sempre houve um enfoque de envolvimento comunitário, visando à inclusão social. No entanto, são os países menos abastados que, em geral, abrigam a maior concentração de biodiversidade. Pela falta de recursos disponíveis para sua proteção e para iniciativas ambientais em geral, esses países acabam sofrendo perdas de áreas naturais, poluições, contaminações, desertificações e outros danos ambientais, que, muitas vezes, não chegam a se tornar problemas nos países mais ricos, por serem tratados antes das crises tomarem proporções maiores.
O autor também identifica distintas vertentes de pensamentos ligados ao modelo de desenvolvimento industrial que dependem e incentivam o “opulento modo de vida ocidental” (Gaudiano, 1998: 21). Alguns consideram a pobreza o mais grave dos males e a causadora dos impactos socioambientais. Outros responsabilizam o crescimento demográfico pelo aumento da pobreza e conseqüentemente pelos impactos ambientais. De modo a contrapor a constatação da insustentabilidade deste modelo, um otimismo tecnológico-economicista é alimentado, a partir do princípio de que tudo se resolverá com o progresso e o livre comércio. O efeito dos benefícios, no entanto, é cada vez mais palpável nos países desenvolvidos e o dos malefícios, vivenciado entre os menos favorecidos. A educação ambiental sofre por essas diferenças de visão, pois o termo é usado com significados distintos e, muitas vezes contraditórios, ocorrendo o mesmo com a expressão ‘desenvolvimento sustentável’ (Gaudiano, 1998).
O que é importante notar é que educação ambiental é um conceito em construção, mas que evoluiu e hoje demonstra ser um campo maduro. Quando surgiu parecia uma panacéia para a salvação de todos os problemas ambientais. Depois, caiu em descrédito, muito por conta de iniciativas isoladas que não eram avaliadas quanto à sua efetividade no responder dos problemas ou temas a que havia se proposto solucionar. Hoje, já existe no Brasil e no mundo uma massa crítica, ou seja, um grupo considerável de educadores ambientais que tratam a área com seriedade, profundidade e com bases teóricas bem formuladas.
Leia também
O Bruxo e o caldeirão de petróleo
Não há nada de aleatório no rolê lobista de Ronaldinho pela COP →
O uso de meme para esconder desinformação sobre meio ambiente
Em formato de piada e conteúdo divertido, a desinformação invade as telas das pessoas e dificulta o trabalho de educação e preservação ambiental →
Não deixe rastros: como minimizar os impactos da recreação em áreas naturais
Princípios Leave No Trace, para reduzir impactos de atividades na natureza, começam a ganhar força no Brasil junto com aumento da visitação de unidades de conservação →