O Ministério de Minas e Energia do Brasil insiste em explorar petróleo na foz do rio Amazonas, apesar de demonstração, nas manifestações do IBAMA, sobre a vulnerabilidade ambiental da região.
Especialistas têm contribuído nessa avaliação, apoiando a proteção dos ecossistemas envolvidos e para evitar que o Brasil se veja internacionalmente desmoralizado por demonstrar posições contraditórias com relação à proteção da Amazônia.
“Amazônia é o nosso passaporte para uma nova relação com o mundo”, afirmou recentemente o presidente Lula na abertura da Cúpula de Belém.
Dicotomias entre combustíveis fósseis e proteção do meio ambiente estão sendo clarificadas nos tribunais. No estado de Montana, nos Estados Unidos, um grupo de jovens obteve nesta semana sentença favorável contra novos projetos de combustíveis fósseis.
A decisão judicial marca vitória histórica contra o governo, por sua aprovação de projetos de petróleo, gás e carvão. Faz referência à garantia dos direitos constitucionais ao meio ambiente saudável, legislação que guarda semelhança à garantia constitucional brasileira, com relação ao meio ambiente equilibrado e à saudável qualidade de vida.
A juíza americana Kathy Seeley reconheceu que a questão climática gera danos psicológicos aos jovens. E foi além: “Montana contém uma quantidade significativa de combustíveis fósseis ainda a serem extraídos”, escreveu Seeley. “O Estado e seus agentes poderiam considerar as emissões de GEE (gás de efeito estufa) e os impactos climáticos e rejeitar projetos que levariam à degradação irracional do meio ambiente de Montana.”
A decisão valerá para o Estado de Montana, estado produtor de carvão e gás que gera um terço de sua energia com a queima de carvão. O estado tem 5 mil poços de gás, 4 mil de petróleo, quatro refinarias e seis minas de carvão. Os impactos da extração são conhecidos: 53% dos poços usam fraturamento hidráulico, (fracking), tecnologia que provoca severos impactos nos aquíferos subterrâneos.
“À medida que os incêndios grassam no ocidente, alimentados pela poluição dos combustíveis fósseis, a decisão de hoje em Montana é um divisor de águas que marca um ponto de virada nos esforços desta geração para salvar o planeta dos efeitos devastadores do caos climático causado pelo homem. Mais decisões como essa certamente virão”, afirmou Julia Olson, da entidade Our Children’s Trust, uma ONG que ajuizou a ação em nome dos jovens.
O governo promete recorrer.
Para Sandra Zellmer, professora da Escola de Direito Blewett da Universidade de Montana, a decisão é um marco na litigância climática. Se a sentença for mantida, o governo estadual será obrigado a considerar as mudanças climáticas na renovação do licenciamento ou na aprovação de novos empreendimentos de combustíveis fósseis.
“Isso foi ciência climática em julgamento, e o que o tribunal descobriu de fato é que a ciência está certa”, disse Michael Burger, da Universidade de Columbia. As emissões contribuem para as mudanças climáticas, os danos climáticos são reais, as pessoas podem experimentar os danos climáticos individualmente e cada tonelada de emissões de gases de efeito estufa importa. Essas são descobertas factuais importantes, e outros tribunais nos EUA e em todo o mundo olharão para essa decisão.” O resumo do caso e os documentos estão acessíveis em Held v. Estado.
Vale a pena ressaltar alguns pontos da decisão judicial:
“Cada tonelada adicional de GEE emitidos na atmosfera exacerba os impactos ao clima; os danos dos demandantes se tornarão cada vez mais graves e irreversíveis sem ações baseadas na ciência para enfrentar as mudanças climáticas; os demandantes provaram que, como crianças e jovens, são desproporcionalmente prejudicados pela poluição por combustíveis fósseis e pelos impactos climáticos; o Estado autoriza atividades de combustíveis fósseis sem analisar GEE ou impactos climáticos, que resultam em emissões de GEE no exterior que causaram e continuam a exacerbar as mudanças climáticas antropogênicas.”
O governo federal americano analisa, há mais de uma década, emissões de gases de efeito estufa de projetos de petróleo, gás e carvão – muitas vezes sob ordem judicial, mas continua a aprovar projetos de exploração de combustíveis fósseis.
A onda de calor extremo que está varrendo os Estados Unidos começa a trazer efeitos na jurisprudência. É previsível que, de forma gradual, os impactos dos eventos extremos demonstrarão de forma crescente sua periculosidade – e isso irá superar a influência política e o poderio econômico dos setores de combustíveis fósseis, motivando judiciário a decisões positivas e estimulando governos a repensar novas extrações de combustíveis fósseis, passando assim a agir de forma efetiva contra o aquecimento global.
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