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Entre Belém e a Mata Atlântica: a contribuição da SPVS e da conservação da biodiversidade na COP30

Durante décadas, clima e biodiversidade foram tratados como temas distintos. Hoje, porém, há um consenso crescente de que se trata de dimensões interdependentes

Clóvis Borges ·
13 de novembro de 2025

A Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), que há mais de 40 anos atua pela conservação da biodiversidade no Bioma Mata Atlântica, chega à COP30 destacando iniciativas inovadoras que conectam, de forma direta, a proteção da biodiversidade ao enfrentamento das mudanças climáticas. Seguindo uma trajetória sistemática de diálogo e cooperação, a instituição buscará interlocução com atores públicos e privados para amplificar o alcance de seu trabalho, que, em última instância, busca promover mudanças de comportamento capazes de responder aos desafios globais que afetam o nosso patrimônio natural.

Durante décadas, clima e biodiversidade foram tratados como temas distintos. Hoje, porém, há um consenso crescente de que se trata de dimensões interdependentes: quanto maior a degradação dos ambientes naturais, mais intensos se tornam os impactos das alterações climáticas; e, inversamente, quanto mais avançam os desequilíbrios climáticos, maior é a perda de biodiversidade. O fato de a COP30 ocorrer no Brasil – e na Amazônia – favorece a integração entre esses dois eixos centrais da agenda ambiental global.

Embora a atenção internacional costume se concentrar na região Norte, o Bioma Mata Atlântica, onde a SPVS desenvolve a maior parte de suas atividades, tem relevância equivalente. É ali que vive mais de 60% da população brasileira, dependente de serviços ecossistêmicos cada vez mais escassos em razão da destruição acelerada das últimas décadas. A biodiversidade da Mata Atlântica é comparável à da Amazônia, com inúmeras espécies endêmicas, muitas delas criticamente ameaçadas.

Entre as iniciativas que a SPVS apresentará em Belém, destaca-se a Grande Reserva Mata Atlântica, ação supra institucional que reúne dezenas de parceiros, abrangendo o maior contínuo ainda bem conservado do bioma. São quase três milhões de hectares entre as porções leste de São Paulo, Paraná e Santa Catarina, englobando 110 unidades de conservação e 60 municípios. Baseada nos conceitos de “Produção de Natureza” e economia restaurativa, a iniciativa articula atores locais para fazer da boa conservação o motor do desenvolvimento territorial sustentável.

SPVS atua há 40 anos, com ações concentradas na Mata Atlântica. Foto: Zig Koch

No coração dessa região, nos municípios paranaenses de Antonina e Morretes, a SPVS mantém, desde o ano 2000, um projeto pioneiro de restauração e conservação florestal. Foram adquiridas 40 antigas fazendas com pastagens degradadas, que deram origem a três Reservas Naturais próprias. Com apoio de empresas privadas, o projeto foi uma das primeiras experiências brasileiras a unir mitigação das mudanças climáticas à recuperação de ecossistemas. Hoje, gera cerca de 40 empregos diretos, proporciona aproximadamente R$ 10 milhões anuais em ICMS Ecológico aos municípios e garante água de excelente qualidade a mais de 20 mil habitantes. Além disso, tornou-se referência em educação para conservação, uso público e turismo de natureza na Grande Reserva Mata Atlântica.

Em outro contexto, o planalto do Sul do Brasil, onde predominam a Floresta com Araucária e os Campos Naturais, abriga remanescentes fortemente pressionados desses ecossistemas. Foi nesse cenário que a SPVS criou, no início dos anos 2000, o Programa Desmatamento Evitado e o Programa Condomínio da Biodiversidade. Essas iniciativas estabeleceram uma das primeiras parcerias de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) entre um proprietário de área conservada, a Mata do Uru, no município da Lapa (PR), e uma corporação privada – a Posigraf, do Grupo Positivo –, relação que permanece ativa há mais de duas décadas e figura entre os modelos de PSA mais longevos do Brasil. Desde então, mais de 40 propriedades privadas, distribuídas entre Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, passaram a contar com suporte técnico-financeiro para sua proteção efetiva.

Buscando ampliar o engajamento do setor empresarial, a SPVS também foi protagonista, em 2010, da criação do Instituto Life Global, uma acreditadora internacional com metodologia inovadora e robusta para certificar empresas que reconhecem seus impactos ambientais não mitigáveis e assumem ações adicionais e voluntárias de conservação. Hoje, o Instituto Life possui atuação global e diversas corporações certificadas no Brasil. A SPVS é uma delas e, com base em suas Reservas Naturais, emite Créditos de Biodiversidade Life, instrumento pioneiro que reconhece o “custo de natureza” dos negócios. O comprador inicial desses créditos foi o Complexo Pequeno Príncipe, concretizando a primeira transação de Créditos Life de Biodiversidade no país.

Ainda que não participe diretamente das negociações diplomáticas entre países na COP30, a SPVS buscará, em Belém, ampliar redes e espaços de colaboração para fortalecer suas ações e inspirar novas parcerias em outros territórios. Se esta for, de fato, a COP das ações práticas, o conjunto de iniciativas inovadoras que a SPVS leva à Conferência comprova que é possível alinhar conservação e desenvolvimento. Algo que a instituição vem fazendo, de forma concreta e consistente, há muitos anos.

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

  • Clóvis Borges

    Clóvis Borges é formado em Medicina Veterinária e possui mestrado em Zoologia. Dirige a Sociedade de Pesquis...

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