Fotografia

Uma ilha verde em São José dos Campos

Um resquício de Mata Atlântica isolado em plena cidade abriga um espécie rara de mico, que sobrevive graças a um guardião apaixonado.

Victor Moriyama ·
27 de julho de 2011 · 13 anos atrás
crédito: Victor Moriyama
crédito: Victor Moriyama

Um resquício de Mata Atlântica secundária insiste em sobreviver em plena São José dos Campos (SP), hoje um centro urbano de 600 mil habitantes e um pólo industrial que abriga nada menos do que a Embraer. A mata em questão já foi a ponta de um corredor verde de Mata Atlântica genuína com extensão de 24km, que desce a Serra do Mar e chega até a cidade de Paraibuna, litoral norte de São Paulo. Com a expansão pecuária e a urbanização local, esse trecho de mata de 5 hectares e meio (cerca de 55.000 metros quadrados) foi isolado do resto do corredor.

Ignorada pelo poder público até poucos anos atrás, a conservação desta área se beneficiou dos esforços incansáveis e solitários de Jairo Santos, 62 anos, treinador do time de futebol local. Autodidata, Seu Jairo, como é conhecido, conhece essa mata como a palma da mão. Ele sabe o nome de cada árvore e apelida os animais que ainda vivem por lá. Dentre eles, destaca-se o Sagui da Serra Escuro também chamado de Sagui do Vale do Paraíba, espécie originária da Mata Atlântica, ameaçada de extinção por perda de habitat.  Sua sobrevivência nesse pequeno pedaço de verde é um fenômeno raro. Esse sagui compete em desvantagem com o Sagui do Tufo Preto e o Sagui do Tufo Branco, espécies mais resistentes e adaptáveis ao meio urbano e que também costumam ser domesticadas.

O Sagui do Vale do Paraíba é tímido frente a presença humana, mas os alimentando regularmente Seu Jairo estabeleceu uma amizade com os bichos:

– Dou banana para eles duas vezes ao dia há mais de 10 anos, conheço todos os macaquinhos que vivem aqui, e eles me conhecem, se comunicam comigo quando chega a hora da refeição.

Apesar das boas intenções, essa aproximação não é boa para os animais, pois tende a fragilizar sua capacidade de obter alimentos por si próprios. Mesmo imperfeita, a atuação de Jairo é importante para a preservação da área. Ele trabalha dia e noite como guardião da sua integridade.

– Outro dia soube que um vizinho pegou um macaco e colocou numa gaiola. Eu fui lá tirar satisfações, mostrar quem é que manda aqui. Mas cheguei tarde, o saguizinho já estava sem dentes.

A Prefeitura de São José nomeou a área de Parque do Alambari e a Petrobrás, que passa dutos pelo local, assumiu a responsabilidade de reflorestá-la e reconectá-la ao restante do corredor verde que se estende até Paraibuna. O processo começa em setembro deste ano. Até lá, o Sagui do Vale do Paraíba e as demais espécies deste fragmento contam apenas com a boa vontade de seu Jairo, que já educa a neta em suas incursões no interior da mata. “Não faço isso para ganhar coisa alguma, acho que cuidar do planeta é dever de cada um. Mas as pessoas esquecem. Por isso o mundo tá desse jeito. As pessoas preferem ver TV.

  • Victor Moriyama

    Victor Moriyama é um fotojornalista brasileiro baseado em São Paulo.

Leia também

Notícias
19 de dezembro de 2024

Desmatamento na Amazônia sobe 41% em novembro, mostra Imazon

Este é o sexto mês consecutivo de alta na destruição do bioma, segundo SAD/Imazon. Degradação florestal tem alta de 84% em relação a novembro de 2023

Notícias
19 de dezembro de 2024

A um mês da posse de Trump, EUA lançam sua meta de corte de emissões

Proposta de Biden é reduzir entre 61% e 66% das emissões até 2035. Governadores dos principais estados dos EUA falam que meta será “estrela guia”

Análises
19 de dezembro de 2024

Restauração muda paisagem em Guaraqueçaba, no litoral do Paraná

Iniciado há 24 anos, plantio de 300 hectares de Mata Atlântica pela SPVS uniu ciência e alta tecnologia, em um casamento que deu certo

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.