De Hamilton J. Ferraz de Mello
Recebeu a atual Administração a incumbência de preparar o Parque Nacional do Itatiaia para o evento dos 70 anos, em 14 de junho de 2007. Lembro as dificuldades.
No próprio decreto nº 1.713, de junho de 1937, consta: “… tendo sido alienado a particulares pequenos lotes de terras encravadas nas que foram conservadas na posse e domínio pleno da União…”. Passaram-se 68 anos e os lotes particulares, originados do ex-Núcleos Coloniais, passaram para herdeiros ou foram adquiridos por novos proponentes e hoje constituem um núcleo urbano, com casas de bom padrão, embora não possa ser chamado, a não ser por ironia, de “condomínio de luxo”. Têm o duplo conforto: de estar em um parque nacional e contarem com acesso por uma estrada BR, não completada, e mais luz, água e serviço de coleta de lixo. Absurdo? Não, decorrência dos fatos.
A situação de fato é de que esse núcleo urbano não tem os requisitos para integrar um parque nacional. Se ativermo-nos ao §1º do Art.11 da lei nº 9.985 de 18 de junho de 2000 (SNUC) [4 dias após o PNI completar 63 anos], e alienarmo-nos da situação de fato, deveríamos tomar todas as iniciativas para desapropriar essas propriedades. Seria essa a postura natural de uma nova administração do Parque Nacional do Itatiaia. No entanto, avaliando de forma realista a questão, tenho certeza que não será essa a postura. Atendo-nos à situação real de urbanização dessa área do PNI, onde aliás se concentra todo o complexo administrativo do Parque e inúmeras casas de funcionários do IBAMA, procurar-se-á outra solução que não a desapropriação: onerosa e de baixo índice custo-benefício. A solução é ter a coragem de, nos 70 anos do PNI, isolar essa área urbanizada, dar a mesma outra configuração legal e incorporar todos esses moradores na grande tarefa de preservar o meio ambiente onde vivem, integrada e pertinente que está à atual área de visitação da denominada “parte baixa do Parque”.
Vamos admitir já ter ocorrido a desapropriação: o que fazer com essas 190 propriedades, algumas com mais de uma casa por lote. Destruí-las, como ocorreu na Faixa de Gaza? O que fazer com o formidável entulho resultante? Não destruí-las, e mantê-las para aluguel, cessão ou uso de pessoal do IBAMA e ou convidados? Que “solução” é essa que, em relação ao Parque como um todo, mantém a mesma situação de urbanização. É preciso ter sabedoria para, a partir de uma constatação encontrar uma solução não burocrática, solução criativa, integradora e harmonizadora de interesses. Some-se a situação das propriedades citadas, do ex-Núcleo Colonial, com as propriedades particulares incorporadas ao PNI com a ampliação gerada pelo Decreto nº 87.586, de 20 de setembro de 1982, passando o PNI de 11.943 hectares para 30.000 hectares. A soma dessas resoluções e omissões resulta no fato de que a União é proprietária de somente 1/3 do total dessas áreas. Se mantivermos a visão de fazer com que os fatos novos se ajustem às decisões anteriores, muito recurso irá ser consumido nessa tarefa. Recurso esse que deve ter destinação mais profícua. Instrumentos legais como os de “Áreas de Proteção Ambiental” ou “Reservas Particulares do Patrimônio Natural”, podem e devem ser manejados com sabedoria e eficácia, para termos uma estrutura harmoniosa e evolutiva na preservação do meio ambiente. A postura ortodoxa leva a conflitos, desgastes, e não é sempre sábia. Vista de mais alto, como em um vôo de águia, ter-se-á a verdadeira dimensão da questão e poder-se-á chegar a adequada solução.
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