Enquanto este estudo refere-se especificamente à situação no México, tem relevância no Brasil?
Sim. A importância dos manguezais enquanto ambiente crítico para várias espécies de peixes comercialmente importantes vale tanto para o México quanto para o Brasil. Na verdade, como nossos manguezais são muito maiores do que os do Golfo da Califórnia, espera-se que por aqui tenhamos um peso ainda maior desse ecossistema na sustentabilidade das pescarias costeiras e no provimento de serviços ambientais essenciais para a sociedade.
Existe algumas estimativas do valor de mangues e outros sistemas costeiros aqui?
Ainda carecemos de uma síntese. Os estudos no Brasil são mais pontuais, mas apontam na mesma direção do estudo feito no México. Já sabemos que espécies de grande importância comercial no Norte e Nordeste passam períodos críticos da vida nos estuários e manguezais, geralmente enquanto jovens. Depois, ao crescer, migram para o mar, onde são capturadas. Um bom exemplo são os pargos, ou vermelhos (família Lutjanidae), que utilizam manguezais e estuários como berçários, sendo importantes recursos pesqueiros, ocupando a sexta posição em termos de importância relativa (cerca de 15,000 toneladas/ano).
Você acha importante ter uma idéia do valor econômico destes sistemas, e porque?
Sem dúvida. Estimativas de valor econômico permitem uma avaliação mais lúcida quando a sociedade se depara com escolhas. Por exemplo, a geração de empregos ou renda por fazendas de criação de camarão pode parecer uma boa opção de desenvolvimento econômico, mas pode acarretar em um prejuízo muito maior ao suprimir serviços ambientais e reduzir a biomassa de recursos pesqueiros.
Uma conclusão do estudo foi que o governo mexicano deu um valor aos mangues muito menor do que o valor real em termos da importância pelas pescas etc – o mesmo problema existe no Brasil?
No Brasil a situação é ainda mais crítica. Os governos estaduais, em sua maioria, tem sido coniventes com a destruição dos manguezais, concedendo licenças de supressão de vegetação em áreas que deveriam ser de proteção permanente, inclusive em unidades de conservação. É um bom exemplo de contabilidade ambiental mal feita (ou melhor, não feita!), uma vez que apenas o retorno financeiro de determinados empreendimentos é considerado. Ignora-se todo o resto, inclusive o papel dos manguezais enquanto fonte de vida para os oceanos. Via de regra, a sociedade perde muito mais do que ganha com a destruição desse tipo de ecossistema crítico.
Caso o valor real dos mangues fosse entendido, como isso afetaria o desenvolvimento do litoral no Brasil?
Afetaria de forma positiva, uma vez que recursos públicos atualmente utilizados para subsidiar atividades que acarretam em prejuízos compartilhados por toda a sociedade, tal como a redução nos estoques pesqueiros e seu conseqüente impacto nos preços do pescado, poderiam ser mais bem direcionados. Ainda que acarretem em retorno financeiro para os investidores, alguns dos “milagres azuis” propalados para o desenvolvimento da aqüicultura, especialmente quando envolvem prejuízos aos ecossistemas costeiros, jamais se concretizaram. Atualmente, há um consenso crescente entre os cientistas pesqueiros de que precisamos de uma gestão ambiental com foco no ecossistema como um todo. Sem falar que a compreensão do real valor dos manguezais melhoraria nossa visão, ainda míope, sobre os benefícios relacionados à conservação da biodiversidade, a proteção da zona costeira, e assim por diante.
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