Manaus, AM – O avanço da agricultura sobre o cerrado está deixando o pica-pau-do-parnaíba (Celeus obrieni) cada vez mais isolado e solitário. Com o cerrado preservado, ele se desloca com facilidade de um tabocal (bambuzal) a outro – onde encontra uma espécie de formiga da qual se alimenta – faz ninhos, e encontra parceiros para acasalar. As roças derrubam árvores e arbustos, aumentando a dificuldade para o bicho ir de um lugar para outro. A consequência são encontros cada vez mais raros entre machos e fêmeas.
A situação do pica-pau-do-parnaíba é tão grave que Renato Pinheiro defende que ele entre na lista vermelha dos animais ameaçados de extinção do Instituto Chico Mendes. Pinheiro lidera uma equipe que estuda a espécie desde 2007 e que também elaborou um plano de conservação com sugestões de estratégias para proteger a ave. A ideia principal do plano é criar Unidades de Conservação nas áreas onde o pica-pau-do-parnaíba ocorre.
Os estudos da equipe demonstraram que eles voam no máximo 20 ou 30 metros sobre as roças, antes de desistir e retornar para a mata. A razão pode ser a dependência do pica-pau em encontrar árvores pelo caminho para descansar, pois ele pousa na vertical. Outro dado importante é que a ave precisa de uma grande área para sobreviver, em média de 250 hectares.
“O pica-pau-do-parnaíba depende da hábitats muito específicos, mata ciliares que possuem os tabocais”, explica Pinheiro. “Esses tabocais não se distribuem uniformemente, estão dispersos nos ambientes florestais. Então, ele precisa de uma área considerável para se alimentar e fazer suas necessidades, como o ninho”, completa.
O pica-pau-do-parnaíba é uma ave que atinge aproximadamente 26 centímetros de comprimento (machos chegam a 25 centímetros) e pode pesar pouco mais de 100 gramas (machos chegam a 96 gramas). O ventre e as laterais do corpo são amareladas, já o dorso, a parte superior das asas e a causa possuem estrias. A cabeça dele é marrom-avermelhada, com bico claro, pescoço amarelo, garganta e peito negros.
Ele é encontrado em uma região que se estende desde o Mato Grosso até o divisa do Maranhão com o Piauí, passando por Goiás e Tocantins. Mas não é muito fácil de ser encontrado. Não é à toa que depois de ser registrado em Uruçuí (PI), em 1926, passou 80 anos desaparecido e só foi reconhecido novamente em 2006, no Tocantins. E isso porque dois indivíduos, coletados em 1967 e 1988, ficaram anos repousando em coleções científicas, antes de serem identificados. Agora, pesquisadores buscam o bicho em vários pontos do cerrado. Alguma vezes, com sucesso. Outras, sem conseguir nada. Em Uruçuí, onde foi registrado a primeira vez, nunca mais foi visto.
O Cerrado, considerado a savana com maior biodiversidade do mundo, abriga aproximadamente 14 mil espécies de animais e plantas. Apenas 20% da cobertura original está intacta e só 8,21% do bioma é protegido por UCs (só 2,85% do total são de proteção integral). A pesquisa do biólogo Renato Pinheiro é apoiada pela Fundação O Boticário, que administra a Reserva Natural da Serra do Tombador, onde conserva 8,7 mil hectares de Cerrado na região de Cavalcante, em Goiás, a 22 km do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.
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