Esqueça as imagens clássicas da Caatinga com a terra rachada, a paisagem marrom, seca, e com uma caveira de gado para compor o cenário. Essas fotos registram uma visão repetida até a exaustão nos noticiários em épocas de seca e nos teledramas regionais. É um recorte. O único bioma exclusivamente brasileiro é maior e mais atraente. Possui cores e diversidade, desafios e soluções, como retrata o livro Flora das Caatingas do Rio São Francisco – História natural e conservação.
O trabalho tomou 4 anos e foi organizado pelo professor José Alves de Siqueira. Ele apresenta 1.031 registros de espécies de plantas e comprova, com rigor científico, a riqueza da flora da Caatinga. Ou melhor, das Caatingas, como prefere o titular do Centro de Referência em Recuperação de Áreas Degradadas (Crad) da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). “Queremos quebrar um mito que, em algum momento, se formou. Diferentemente das reportagens sensacionais, somos diversos e heterogêneos e isso é bom”, avisa o autor.
José Alves liderou o trabalho, mas teve companhia. Ele divide a autoria com mais 99 pesquisadores e 39 instituições, além da Univasf. O prefácio é do professor Marcelo Tabarelli, coordenador da área de biodiversidade da Capes, além de autor de Ecologia e conservação da Caatinga. O capítulo sobre cactos tem a participação de Nigel Paul Taylor, estudioso do Royal Botanic Gardens, com trabalhos em ecossistemas áridos em diferentes recantos das Américas.
Os autores rodaram 340 mil quilômetros em 212 expedições para escrever as suas 515 páginas. O livro é um profundo trabalho sobre a flora da Caatinga, mas vai além e propõe estratégias para conservação do bioma, faz um estudo detalhado das plantas aquáticas do semiárido mais populoso do mundo e produz um modelo analítico sobre a distribuição de árvores nativas. Dedica um capítulo inteiro aos cactos (dos quais 90% estão ameaçados), revisa o que já foi escrito sobre as sementes da biota e alerta sobre a ameaça de invasão biológica que a região enfrenta, diz Siqueira.
A professora Dilosa Carvalho de Alencar Barbosa afirma que o livro acaba com um hiato de publicações científicas a respeito da fisiologia das plantas da Caatinga. “Mário Guimarães Ferri, da USP, publicou, em 1955. Depois, em 1981, eu também publiquei um trabalho científico”, lembra Diloso. “Até agora, nenhuma outra publicação voltou a tratar a flora da Caatinga”. Ela é uma das 4 autoras do capítulo sobre sementes.
O trabalho surgiu como subproduto da transposição do Rio São Francisco, uma vez que o Crad assumiu um dos 38 programas ambientais exigidos pelo Ibama para a execução da obra. Professores e alunos do Crad se depararam com uma obra de engenharia que se estende por 700 quilômetros, em 2 canais cimentados, 29 reservatórios, estações de bombeamento e pequenas usinas. “Uma obra colossal”, sintetiza Siqueira. Ele coordenou e executou o programa de conservação da flora com a coleta de plantas (vivas e mortas) e sementes, além do monitoramento da da flora sob impacto da obra. “Com olhos de biólogo da conservação, posso afirmar que, muito do que vi, foi chocante”, diz.
Siqueira compara a abertura dos canais que levarão as águas do Velho Chico para os rios da Paraíba e do Ceará com feridas no ecossistema feitas por tratores e escavadeiras. O corte exposto dos canais abre espaço para organismos oportunistas. No obra, verificou-se 62 espécies de plantas exóticas, 6 destas invasoras, e 3 espécies vistas pela primeira vez no país: Azolla pinnata R, Physalis pruinosa L e Enneapogon cenchroides. Siqueira e o pesquisador Juliano Fabricante classificam a invasão biológica como a segunda maior ameaça à biodiversidade, perdendo só para a destruição de habitats provocada pelo homem.
A conservação da biota e restauração de áreas afetadas pela ação do homem é outro tópico. Siqueira conta que foram selecionadas 17 espécies de árvores e feito um estudo sobre suas preferências de tipo de solo, índice pluviométrico e clima. Cruzou-se os dados com levantamentos sobre os diferentes tipos de solo, quantidade de chuva e variação de temperatura de localidades ao longo da bacia hidrográfica do São Francisco. O resultado permite saber onde é mais provável encontrar indivíduos de cada espécie. Um gestor ambiental interessado em restaurar um ambiente pode descobrir, com o levantamento, quais espécies de árvores se adaptam ou têm chances em cada região. “Esse trabalho apenas começou, nossa meta é estender essa modelagem para 100 espécies de arbóreas”, diz Siqueira.
O livro impressiona pela quantidade de dados científicos, mas também captura os olhos pelo plasticidade das fotografias, a maioria produzida pelo próprio Siqueira.
As imagens permitem conferir texturas e detalhes entre as penugens nas folhas, mostra flores que só desabrocham na escuridão. Em outras, revelam a fauna local, como as fotos do raro tatu-bola.
O leitor ainda lerá relatos dos primeiros naturalistas que viajaram pela região. Esse material mostra como a região se transformou e o quanto já perdeu.
Flora das Caatingas do Rio São Francisco acaba de chegar às prateleiras das livrarias, onde seu tamanho, maior que um dicionário Aurélio, a torna fácil de encontrar. Mas é longa a viagem para conhecer as maravilhas que a Caatinga pode oferecer. Ou melhor, as várias Caatingas descobertas pelos autores.
Paisagem desenhada na expedição de Martius, no início do século 19, exibe vegetação rarefeita com cactos, palmeiras e até uma barriguda (Cavanillesia umbellata). Fonte: Flora brasiliensis online, Centro de Referência em Informação Ambiental, CRIA. |
Flora das Caatingas do Rio São Francisco tem edições em português e em inglês. Terá lançamento no Jardim Botânico, do Rio de Janeiro, dia 10 de novembro de 2012.
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A caatinga por um grande período foi considerada como um ecossistema pobre e desértico, acarretando na falta de pesquisadores que se interessassem por tal. Por isso, é notável a importância de obras como essa, o livro “Flora das Caatingas do Rio São Francisco”, supracitado na matéria, ,que procuram demonstrar a riqueza de diversidade florística encontrada na Caatinga, assim como Spix e Martius em sua expedição pelo sertão bahiano no século XIX.
Atualmente é considerado um dos ecossistemas brasileiros mais degradado, onde a principal causa é a desertificação. Além de apresentar a ausência de práticas de manejo do solo e com a monocultura e pecuária extensiva, inúmeras queimadas. Atualmente, as principais causas de desmatamento estão associadas à extração de mata nativa para a produção de lenha e carvão vegetal destinado às fábricas gesseiras e para a produção siderúrgica. Tal impacto é sentido na fertilidade do solo e na extinção de espécies da fauna e flora.
A produção dessa obra permeia por variadas questões, quebrando paradigmas e reconstruindo novas perspectivas. O livro Flora das Caatingas revela aquilo que estava implícito para a sociedade, esclarecendo os “dois lados da moeda”, levando o leitor a um pensamento crítico a respeito de questões político-ambientais e sócio-ambientais. Além de explorar o bioma exclusivamente brasileiro, por um outro ângulo. Comparando a diversidade das caatingas de décadas, diagnosticada e descrita por Theodoro Sampaio (2002) como sendo um inesgotável tesouro, com a diversidade atual. Despertando no leitor o desejo de vivenciar aquilo que já foi imensurável, podendo promover uma mudança de hábitos. Por tanto. Esse, sem dúvidas, é um livro que todo brasileiro deveria ler.
A desconstrução de cenário pobre, marcada pela paisagem de terra seca e mata acinzentada, retratada por clássicos da literatura brasileira como “O Sertanejo”, de 1875, do cearense Jóse de Alencar, livro-reportagem “Os Sertões”, publicado em 1902, de Euclides da Cunha, “O Quinze” ,em que a autora Rachel de Queiroz descreve a seca de 1915, o romance “Vidas Secas” de Graciliano Ramos , entre outros, encaminha-se para substituição de Caatingas heterogênea de composições da flora, evidenciada pela obra "Flora das Caatingas do Rio São Francisco – História natural e conservação", constatada de embasamentos científicos, bem como se utilizando da leitura visual pelo emprego de imagens que permitem concepção sensível de detalhes.
O livro é um marco para a história de flora exclusivamente brasileira em que se ressalta a riqueza do bioma Caatingas ao mesmo tempo em que chama atenção para questões sociais, políticas e econômicas, retratando impactos causados mediante a transposição do Rio são Francisco, introdução de espécies exóticas como bode (Sampaio et al., 2009) e Tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) (Attayde et al., 2007), que contribuem para modificação das comunidades dos respectivos ecossistemas.
* Rio São Francisco
A educação ambiental além de atuar na formação ecológica do cidadão, despertando a compreensão sobre interações dos sistemas naturais, precisa ser crítica, valorizando discussões de cunho social e ideológico sobre as temáticas ambientais, que é um dos enfoques abordados no livro Flora das Caatingas do Rio São Francisco – História Natural e Conservação, se tornando assim uma importante ferramenta transformadora. Referente a obra de transposição do Rio São Francisco (PISF), trabalhos já catalogaram cerca de 14 espécies exóticas, pertencendo a dez famílias botânicas, sendo Nicotiana glauca, Prosopis. juliflora e Calotropis. procera as mais disseminadas nos eixos (Ferreira, 2016), contudo constantemente novas espécies são inseridas nesse ecossistema, diante a intervenção humana.
O bioma Caatinga possui menos de 2% de sua área protegida com unidades de conservação de proteção integral (Casteletti et. al. 2003), apresentando características peculiares, com localização geomoforlógicas em depressões interplanálticas, porém com exceções, solos pedregosos e rasos com muitos afloramentos rochosos, alta radiação solar, baixa nebulosidade, altas temperaturas, demanda evapotranspirométrica elevada e precipitações pluviométricas baixas e irregulares. Contudo se sobressai pela riqueza de espécies, pelo grau de endemismo e ainda por ser um bioma exclusivamente brasileiro (Queiroz 2009).
Pobre, miserável, desértico e cruel, adjetivos que quando juntos, trazem a tona no imaginário do brasileiro a que região estamos citando. Quando nos referimos a exuberância de biodiversidade, decerto não associamos às Caatingas. Em filmes, musicas, obras literárias, livros didáticos e noticiários é retratado uma figura marcada pela seca e pela escassez pluviométrica, algo morto e que não incita atenção. Por que estudar e conservar esse lugar de incipiências?
Contraditoriamente, no âmbito científico a realidade não é esta, trabalhos substanciais como os que estão presentes no livro "Flora das Caatingas do Rio São Francisco – História Natural e Conservação”, analogamente ao que foi criado na mente das pessoas no que tange a este local, indicam a realidade que se tem de biodiversidade nas Caatingas e, a partir daí concordo veementemente com Euclides da Cunha em afirmar que o nordestino é um forte, a ciência feita aqui mesmo nesta região tornou essa associação à pobreza faunistica e florísticas totalmente desqualificada, errônea. Entretanto, é triste saber que, ao passo com que essas pesquisas são pouco disseminadas, não há como se formar reflexões e, a partir daí pensamentos críticos nas pessoas, principalmente as que vivem nestas áreas que da natureza retiram comida e renda, mas pouco se faz para que isso se mantenha. O umbuzeiro (Spondias tuberosa) que ficava "carregado" em Janeiro, proporcionando o preparo de doces, umbuzadas, cachaças e remedios, a cada ano fica menos denso e farto, e é aí que o sertanejo se pergunta em suas rezas, toadas, missas e vaquejadas quando atravez de suas preces exclamam, esperando divinamente uma resposta e uma solução. Contudo, afirma Tabarelli "das espécies de plantas existentes na região, 30% não ocorrem em nenhum outro lugar do mundo". Algo que merece muita atenção. Como supracitado pelo MMA, devemos reconhecer que a Caatinga ainda carece de marcos regulatórios, ações e investimentos na sua conservação e uso sustentável. Embora, existam centros de recuperação dessas áreas, a citar o CRAD localizado no estado do Pernambuco, que realiza uma tarefa árdua na busca da conservação de espécies vegetais ameaçadas de extinção, pelos impactos antropizados, é preciso ainda um maior investimento e disseminação no ideário popular, visando a compreensão da importância de se preservar para manter esse ecossistema.l
Com uma variedade de tipos vegetacionais, a Caatinga trata-se de um ecossistema rico e exuberante, compondo a paisagem da maior parte do Nordeste brasileiro. No entanto, a desvalorização desse ecossistema ainda perdura, sobretudo por parte da população local. Com isso, é válido o estudo que exponha e ainda melhor, quantifique a riqueza da flora que está sob os olhos dos nordestinos. O livro “Flora das Caatingas do Rio São Francisco – História Natural e Conservação” alcança esse impacto e é um trabalho excepcional.
Se tratando da obra de transposição do Rio São Francisco (intitulada “Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional – PISF”), é uma obra que causa danos irreversíveis ao meio ambiente. Segundo estudos de monitoramento da vegetação sob influência do PISF, espécies exóticas como Eragrostis ciliaris (Poaceae) e Oxalis corniculata (Oxalidaceae), não descritas na região até 2007, foram encontradas nas áreas próximas à obra, o que altera a paisagem biótica. No entanto, é necessária uma melhor investigação sobre o impacto que essas espécies podem causar na biodiversidade local, mantendo o monitoramento da área. Se tratando de O. corniculata, essa espécie não é nativa do Brasil, mas ocorre em todos os domínios fitogeográficos do país, comum em áreas antrópicas.
Construções civis comumente ocorrem na Caatinga, algumas sem os projetos de consultoria ou apoio necessário por parte dos biólogos ou demais profissionais das áreas ambientais. Nesses casos, na medida em que ocorre a supressão vegetal para instalação dos empreendimentos, espécies são retiradas sem que ocorra a identificação e o estudo correto da área. Além disso, a introdução de espécies como a Prosopis juliflora, que foi introduzida em 1942 como uma opção econômica (Andrade; Fabricante; Oliveira, 2008) ou a tilápia-do-nilo (Oreochromis niloticus) em ambientes aquáticos do Nordeste (Attayde et al., 2007), contribuem para modificação das comunidades dos respectivos ecossistemas.
Tendo em vista a alteração da paisagem ao longo do tempo, seja diretamente pela ação do homem no que se refere aos empreendimentos; introdução de espécies invasoras ou, em maior escala, mecanismos que delineiam a evolução como a seleção natural, o livro “Flora das Caatingas do Rio São Francisco – História Natural e Conservação” é mais do que um livro, explicitando as espécies da flora que ajudam a compor as paisagens nativas das Caatingas. Logo, é um trabalho de valor para a conservação e conhecimento acerca desse ecossistema.
A desmistificação de uma Caatinga pobre em biodiversidade e adverso a vida (imagem que foi criada no ideário popular) deve ser o primeiro passo a ser tomado ao se pensar em conservação desse ecossistema, historicamente, explorado pelo homem. O livro “Flora das Caatingas do Rio São Francisco”, supracitado na matéria, cumpre esse papel ao revelar a riqueza de diversidade florística encontrada na Caatinga, contrariando a imagem criada da "Caatinga morta, seca e da terra rachada". É na Caatinga que vive e se reproduz a Cyanopsitta spixii (Aves; Psittacidae)(Wagler, 1832), espécie de ave, popularmente conhecida como ararinha-azul e que está ameaçada de extinção devido a perda do seu habitat (como a mata de galeria que margeia os riachos estacionais da Caatinga) ocasionado pelo desmatamento (Barros, 2001). Iniciativas que objetivem a conservação da Caatinga, devem estar associadas a propagandas que provoquem uma reflexão a respeito desse ecossistema, substituindo do imaginário popular a arcaica visão criada durante anos da Caatinga morta e dando lugar a uma ideia mais moderna, de uma Caatinga rica em biodiversidade de espécies.
As Caatingas por vários anos permaneceram nesta dicotomia: pobre e rica. Acontece que a partir de estudos e trabalhos como o supracitado, é demonstrada uma realidade pouco conhecida que traz a luz novas perspectivas, uma floresta biodiversa com características particulares que abriga espécies raras e endêmicas (Giulietti et al., 2004). Os pensamentos distorcidos associados a este ecossistema, exige em contrapartida, grande esforço e investimentos em pesquisas científicas que refutem os esteriótipos sedimentados ao longo dos anos. Apesar dos problemas atuais ocasionados pelo projeto político-ideológico do governo, que intensificou os cortes nos programas de fomentação das pesquisas, a implantação do Projeto de Integração do Rio São Francisco em 2005 pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva possibilitou uma valoração das Caatingas por promover e destinar incentivos para a região, mesmo o programa apresentando falhas.
Sou Mayara Galvão, estudante de biologia da UNIVASF e o livro Flora das Caatingas do Rio São Francisco escrito pelo ilustre professor José Alves, quebra o paradigma dos pensamento das pessoas leigas que não conhece o ecossistema Caatinga, sendo que o mesmo corresponde uma área de aproximadamente 734.478 km, o que representa 70% da região Nordeste e o mesmo é exclusivamente brasileiro. Tendo em vista um cenário morto e de sofrência, no entanto, isso se contradiz ao abrir o livro e ver a gama de diversidade de espécias de flora e suas peculiaridades de estruturas de resistências adaptadas as condições do semiárido, assim, concretizando que é um ecossistema rico em espécies. Além disso, o livro trás sugestões e soluções de problemas acometidos no ecossistema abordado.
Decerto, o ecossistema Caatinga por muito tempo e até hoje é relacionado a uma pobreza tanto da paisagem quanto da biodiversidade. Deve-se portanto, desnudar-se desses preconceitos e conceitos errôneos que são construídos, como a reportagem cita ao apontar as repetidas imagens deste ecossistema como terra rachada, paisagem marrom, seca e uma caveira de gado. Essa diversidade pode ser denotada nas espécies endêmicas, em especial as angiospermas, com 12 gêneros e 183 espécies, de acordo com Prado (1991). Ademais, de acordo com alguns trabalhos muitas espécies são empregadas por seus atributos medicinais, a exemplo da aroeira (Myracrodruon urundeuva), da qual muito se utilizam suas cascas e raízes, como apontado no artigo Uso e diversidade de plantas medicinais da Caatinga na comunidade rural de Laginhas, município de Caicó, Rio Grande do Norte (nordeste do Brasil).
O livro Flora das Caatingas do Rio São Francisco – História Natural e Conservação, desconstrói essa falsa visão do ecossistema Caatinga ou melhor, Caatingas, em vista das contrastantes fisionomias.
É de vital importância todo o trabalho que é desenvolvido pelo CRAD da Univasf. Mesmo em meio a tantas dificuldades e desafios, todo o empenho depositado para a conservação do bioma caatinga deveria ser reconhecido pelas autoridades e população como um dos meios mais eficazes de mantermos e conservamos o que ainda resta desse Bioma. No livro Flora das Caatingas do Rio São Francisco, está o relato bastante intenso, científico, resultado de pesquisas e do que foi coletado das várias expedições realizadas pelas equipes coordenadas pelo prof. José Alves, de onde foram feitos diagnósticos da biota da caatinga e do rio São Francisco. Pode-se verificar a degradação da Caatinga. A crescente desertificação e extinção de várias espécies de plantas endêmicas, a exemplo da Maniçoba, Carnaúba, Licurizeiro e o Umbuzeiro. Um reflexo da ação do homem. Um contrassenso, uma incoerência que fundamenta a justificativa de busca por qualidade e melhoria de vida, crescimento econômico. Justificativa essa utilizada por autoridades, instituições empresarias e população, quando, no entanto, há agressão que leva à extinção dos recursos naturais, essenciais para a existência humana. Identifica-se no trabalho do CRAD, a busca por assegurar a conservação das espécies em extinção, que, através de seus atividades e, do livro, vem instigar a todos a compreender a importância do bioma caatinga e a ter um olhar de amor e de respeito, objetivando a luta por políticas públicas que venham dar condições à recuperação dessa riqueza nossa que está em colapso dos seus ecossistemas.
Sem duvida alguma o livro Flora das Caatingas do Rio São Francisco vem para complementar as discussões a respeito desse maravilhoso bioma como também surgiu dentro de um contexto regional que dizer internacional sobre a preservação das nossas ricas e abençoadas águas do Velho Chico como para luta de conservação do nosso belíssimo bioma caatinga. Quando durante suas pesquisas e expedições realizadas em busca de novas descobertas e identificação seja na alteração ambiental e surgimento de novas espécies, vejo a preocupação do professor José Alves e sua equipe do CRAD em tentar conseguir outros olhares dos nossos governantes e toda sociedade na preocupação com a conservação do bioma caatinga. É assim dessa maneira que o CRAD e academia vem trabalhando que conseguimos quebrar o velho mito da imagem preconceituosa que a mídia repassa para sociedade.
Se você pretende fazer uma viagem de conhecimento, reconhecimento ou de pertencimento, esteja preparado, pois irá se deparar com uma variedade de cores e flores que só é possível ser observada na Caatinga Nordestina. Então, você vai perceber-se diante de um Universo de Vidas que lutam incessantemente para sobreviver ante a ação nociva do homem ou sua não ação. Nesse cenário, O Livro Flora das Caatingas do Rio São Francisco vem como um "Grito de Esperança" propondo estratégia para conservação desse Bioma.
A relevância desse livro extrapola, e muito, as barreiras do mundo acadêmico e cumpre o seu papel social quando impacta, causando incomodo, aos que tem acesso a todo esse conhecimento. Em “Flora das Caatingas do rio São Francisco”, o único ecossistema exclusivamente brasileiro é retratado com o grau de importância que sua diversidade biológica merece.
O incomodo sentido logo após o contato com todo esse universo, proporcionado através das pesquisas desenvolvidas pelo professor José Alves, que desembocaram na concepção do livro, trata-se de um processo longo de influências equivocadas sobre a caatinga. Que contribuiu e ainda se mantem como fomento para a propagação de estereótipos e preconceitos, uma vez que a caatinga é mostrada, rotineiramente, como lugar de miséria, pobreza e solo rachado, e nisso, a mídia brasileira tem uma parcela importante de culpa.
Reportagens, séries, filmes e novelas provocam, no cenário nacional e local, forte propagação da construção do nordeste e da caatinga como lugar de seca, atraso e sofrimento. Essa influência é tão forte que até mesmo os noticiários locais, que presenciam outras estratégias de convivência com a região de caatinga, perpetuam a visão nacional sobre esse ecossistema.
É como se os profissionais da imprensa local desconsiderassem o que está a sua volta e fossem guiados pelo recorte pejorativo dado a essa região pela imprensa nacional. E passam, com isso, a contribuir para a propagação de imagens como as do chão rachado, animais mortos, povo pobre e sofredor. E assim se fecham para uma infinidade de possibilidades que a caatinga oferece.
“Flora das Caatingas” atesta, com comprovação científica, a riqueza da flores, animais, rios e lagos desse ecossistema. No livro, 1.031 espécies de plantas foram catalogadas, além da abordagem sobre os impactos da transposição do rio São Francisco, nível de degradação e a relevância da conservação de áreas de caatinga afetadas pela ação do homem.
E ainda, a descoberta de espécies de plantas vistas pela primeira vez no Brasil e que foram encontradas na caatinga, mas parece que nada disso interessa a mídia, nacional e local, que não foge, jamais, do recorte da seca dada a esse região.
A obra se mostra um importante mecanismo disparador para as riquezas desse ecossistema, unicamente brasileiro e, ainda, pouco pesquisado, quanto a sua relevância em tantas outras áreas como a dos fármacos, por exemplo, que podem contribuir para descobertas importantes em todo o mundo.
Comparado com outras regiões, a exemplo das de mata atlântica, no qual já se pesquisou a exaustão sobre a diversidade biológica, a caatinga sofre de uma anemia profunda pela falta de interesse científico, talvez causado pelos estereótipos construídos ao longo de tempo, e principalmente pela falta de vontade política.
É preciso investir mais em pesquisas, como as desenvolvidas pelo CRAD/UNIVASF, encabeçadas pelo professor José Alves, para que possam ter apoio governamental e institucional para, assim, continuar existindo e revelando mais do potencial e dos cuidados que devemos ter com as caatingas.
O livro Flora da caatingas do Rio São Francisco, é uma obra que retrata toda diversidade e riqueza da flora da Caatinga, e que chama atenção dos problemas que esse bioma vem enfrentando, é uma obra que serve desmistificar a falsa imagem que foi construída da região semiárida. É um trabalho que nos ajuda ampliar o nosso olhar e a compreender melhor os impactos desses projetos, ao mesmo tempo que aponta estratégias para conservação na nossa biodiversidade
A transposição do rio São Francisco é um grande projeto que vem sendo implementado pelo governo brasileiro, como o mesmo discurso de promover o desenvolvimento da região semiárida, esse é um empreendimento bem emblemático. Segundo o Ministério da integração a obra prevê a construção de mais de 700 quilômetros canais de concreto em dois grandes eixos (norte e leste), quando estiver totalmente construindo o mesmo deve levar água para 390 cidades de quatro estados: Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte.
Esse é um empreendimento emblemático que dividiu a população, de forma geral há um questionamento com relação aos impactos ambientais e a capacidade do rio de atender mas essa demanda. É fato que um número de famílias que vivem próximo ao rio continua sem ter acesso a água. O governo federal se comprometeu em levar água para as comunidades que estivesse a 15 km do rio, as obras foram iniciadas por empresas contratadas pela CODEVASF, mas ate hoje essas obras não foram concluídas.
Em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos IHU, em 23/05/17, Ruben Siqueira coordenador da CPT comenta que “Estudos da NASA sobre os rios do mundo constataram que o São Francisco tem o pior quadro, perdeu 35% de vazão constante em 50 anos e vai perder em torno de 25% nos próximos 50 anos, devido também ao aquecimento global”.
Na região estamos presenciando a baixa do Lago de Sobradinho, nos últimos anos vem se registrando baixa no volume de água armazenada. Segundo o Operador Nacional do Sistema – ONS, órgão responsável pela coordenação e controle da operação de geração e transmissão de energia no Sistema Interligado Nacional, no dia 01/06/17 a capacidade do lago é de 13,13%.
Outro segmento que vem enfrentando grande problemas são os pescadores artesanais, a construção da barragem de Sobradinho contribui com a degradação ambiental do Rio São Francisco, situação que vem sendo agravada pela pesca predatória, pela contaminação das águas por agrotóxicos, os ribeirinhos também apresenta como problemas as cercas nas águas que impedem o acesso as áreas de pesca, todas essas situações tem contribuindo para a diminuição da oferta de pescado.
O antropólogo Altair Sales Barbosa, faz a seguinte avaliação do processo de construção da obra da transposição. “As consequências do sistema de transposição serão danosas e num curto espaço de tempo levará à morte a maioria dos afluentes do São Francisco, incluindo o próprio rio. Isto acontecerá porque com a dinâmica alterada o transporte de sedimentos arenosos aumentará de forma assustadora, gerando dentre as consequências o assoreamento, já que a maioria dos afluentes do São Francisco corre por áreas da Formação Urucuia, cuja característica principal é a ocorrência de um arenito frouxo”.
Mesmo diante de tantos problemas, a transposição do Rio São Francisco ainda é apresentada para a sociedade como o empreendimento que irá resolver o problema da seca do Semiárido, mas na realidade considerando o custo desse empreendimento e os seus impactos ambientais percebe que mesma continua sendo pensada para atender demandas de setores empresarial, visando a expansão de áreas para a irrigação. Não há nenhuma preocupação com a vida do Rio que já dar sinais de sua dificuldade de atender a demanda dos diversos tipos de uso de suas águas.
A partir da leitura das imagens e do texto do livro “Flora das Caatingas do São Francisco – História Natural e Conservação” enxerguei a caatinga com um novo olhar, antes nunca percebido por mim.
As acentuadas peculiaridades do clima, da geografia, da fauna e da flora da caatinga, geralmente são retratadas pela mídia através de imagens estereotipadas e desprezíveis, com rachaduras no solo, animais que não têm o que comer, mulheres do campo com um balde na cabeça e camponeses com uma enxada no ombro.
A caatinga é muito mais que esse cenário estereotipado. Após conhecer a obra, percebi o quanto a nossa Caatinga é rica de recursos naturais, com uma fauna e flora singular e o nosso Rio São Francisco que tanto pede socorro.
As imagens fotográficas e um texto bem marcante do livro, revelam a caatinga como ela é, e já foi no passado. Uma das imagens que muito me marcou foi o Rio São Francisco no ano de 1818. Uma imagem reveladora e muito diferente da atual situação, chamou minha atenção por demostrar um “Rio” com uma mata ciliar original, farta e intocável, sua fauna e flora riquíssima com espécies que não se encontram mais, e que foi preciso apenas dois séculos para essa paisagem mudar radicalmente os seus traços, devido a degradação ambiental.
A caatinga e o Rio São Francisco, apresentam grandes riquezas naturais, como o solo, a água, a fauna e a flora, que formam uma biodiversidade particular, seu ecossistema é considerado como o único exclusivamente e legítimo do Brasil. Para o autor do livro, Siquera Filho (2012) a extinção inexorável do Rio São Francisco e da Caatinga é um grande desafio para os biólogos da conservação, pois são patrimônios naturais que pertencem exclusivamente ao Brasil.
A fragilidade do rio São Francisco e da caatinga sofre com a degradação provocada pela sociedade. O autor ressalta que com o processo de povoamento, houve grandes perdas de espécies e que para resgatar a paisagem natural é impossível e como consequência disso, há muitos prejuízos econômicos ambientais, daí é de suma importância de revitalização (SIQUERA FILHO, 2012).
Várias questões sociais, políticas e econômicas são levantadas, como por exemplo a figuras do vaqueiro e suas “cantigas de boi” que estão desaparecendo. Os restaurantes ribeirinhos, não servem mais peixes nativos, são servidas tilápias de cativeiro. Percebe-se que o “Velho Chico” não tem mais as suas riquezas como antes tinha, espécies de peixes, não são mais encontrados. Cidades ribeirinhas com residências luxuosas usam sistemas de saneamento arcaico e que contaminam o rio que dejetos humanos.
Nesse processo, áreas da caatinga são degradadas para dar lugar aos projetos de irrigação, que tem como donos, pessoas com poder aquisitivo, que utilizam tecnologia de ponta e que nem sempre praticam ações sustentáveis de cultivo, prejudicando a vegetação nativa.
Com todas essas problemáticas, percebe-se a necessidade urgente da implementação de políticas públicas voltadas para o ecossistema e, sobretudo, para a qualificação de profissionais dispostos a atuar na conservação da Caatinga e revitalização do Rio São Francisco.