Manaus, AM — Uma expedição à Serra do Tepequém, Roraima, liderada pelo herpetólogo Miguel Trefaut Rodrigues, da Universidade de São Paulo, em dezembro de 1992, encontrou um pequeno anfíbio, abundante nos riachos que corriam na região, uma cadeia circular de montanhas, formada a partir da extinção de um antigo vulcão. Na época, ainda não se conhecia muito bem a taxonomia do gênero Anomaloglossus, então não se tinha certeza de que seria uma nova espécie.
Em maio de 2011, sete pesquisadores embarcaram para uma nova viagem à serra, desta vez equipados com muito mais informações sobre esses pequenos animais e com a mesma suspeita de que ele ainda não tinha sido descrito por ninguém. Mas voltaram de mãos vazias. “Depois de um esforço muito grande, não acharam nenhum”, conta o herpetólogo Sérgio Marques Souza. “Achamos que ele esteja provavelmente extinto, pelo menos até que sejam feitos mais esforços para encontrá-lo novamente”, completa.
Apesar da frustração, as viagens serviram para os pesquisadores descrevessem a nova espécie, batizada da Anomaloglossus tepequem. “De volta ao laboratório, eu examinei os espécimes dos anos 90 e pedi a expetise do [herpetólogo] Philippe Kok (ele tem mais experiência com as espécies dos Tepuis, que confirmou que era nova”, conta Antoine Fouquet, um dos responsáveis pelas descobertas.
A descrição foi publicada pelo grupo de pesquisadores está semana em um artigo na revista científica Zootaxa. O artigo apresenta também outra espécie de anuro roraimense, uma prima do A. tepequem, que vive em outra serra, a alguns quilômetros ao Sul, o Anomaloglossus apiau.
Para quem não conhece Roraima, é bom explicar que estas serras, assim como outras que existem por lá, são áreas de vegetação mais densa, que se elevam às vezes a mais de mil metros de altitude, isoladas por uma grande área plana de cerrado, o lavrado roraimense. Ou seja, são locais que favorecem o endemismo.
Serra da Mocidade
Sérgio Marques Souza já estava se preparando para fazer o levantamento da herpetofauna de uma das mais isoladas destas montanhas, a Serra da Mocidade, quando precisou mudar de planos.
A dificuldade de chegar ao interior do Parque Nacional da Serra da Mocidade fez com que ele optasse por um local mais acessível, a Serra do Apiaú, uma cadeia de montanhas que se elevam desde os 100 metros até mais de 1400 metros de altitude. Foram realizadas duas expedição, mas Sérgio só participou de uma delas, a primeira, em outubro de 2011. A outra, em junho do ano seguinte, foi coordenada novamente pelo professor Miguel Trefaut Rodrigues, da USP.
Sérgio Souza conta que foi uma expedição bem estrutura. Ficaram cerca de 20 dias no local, montaram equipamento e abriram uma trilha até o topo da serra. “Por volta de altitudes próximas dos 500 metros, começamos a encontrar o Anomaloglossus”, conta o herpetólogo. “Ele não existe abaixo dessa altitude, então está isolado à Serra”.
Outra expedição à Serra da Maroquinha, que fica bem perto do Apiaú, não encontrou a espécie, confirmando que ela tem uma distribuição bastante restrita. Devido a área pequena de distribuição e também devido à pressão sofrida pela floresta na região, os pesquisadores sugerem que o A. apiau seja classificado como Criticamente Ameaçado de Extinção.
“Eu imaginei que com a publicação desse trabalho, alguma coisa fosse feita para proteger a região”, diz o herpetólogo, hoje cursando pós-doutorado na Universidade de São Paulo (USP). Infelizmente, as notícias não são muito promissoras. O Apiaú continua sofrendo a pressão da agricultura e da pecuária. O Tepequém, que no início do século passado foi um dos principais garimpos de diamante do país, agora é objeto de novo uso econômico, o turismo.
*Artigo atualizado em 12.03.2015 às 14h30
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