A contestada obra de construção de uma tirolesa nos morros do Pão de Açúcar e da Urca, cartões-postais da cidade do Rio de Janeiro, teve mais um capítulo nesta terça (18). Foi quando o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) emitiu nota afirmando que os morros não correm riscos estruturais decorrentes das construções, segundo parecer do Instituto Geotécnico do Rio de Janeiro (Geo-Rio). O documento foi elaborado quatro meses após a obra ter sido autorizada pelo Iphan, em fevereiro, mesmo com as perfurações tendo sido iniciadas ainda sem as licenças necessárias.
A nota (na íntegra abaixo) afirma que o Iphan é o responsável pela análise dos impactos do empreendimento na “paisagem cultural” dos morros, mas que a análise técnica é o que “subsidia” a decisão final do órgão. O parecer assinado pelo engenheiro civil Sidney Crisafulli Machado, diretor de Licenciamento e Fiscalização do Geo-Rio, conclui que “os projetos e relatórios apresentados demonstraram adequadamente que as intervenções que se pretende implantar […] não evidenciaram possibilidade de deflagração de rupturas no maciço”. Porém, como mostrou a ONG Grupo Ação Ecológica (GAE), a autorização inicial do Geo-Rio veio apenas no dia 21 de março, um mês após a autorização por parte do Iphan, concedida no dia 2 de fevereiro. Já o parecer divulgado pela nota é datado do dia 14 de julho.
A obra de instalação da tirolesa no topo do Pão de Açúcar está embargada por liminar concedida no início de junho pela 20ª Vara Federal do Rio de Janeiro. A decisão veio após o Ministério Público Federal (MPF) protocolar ação civil pública baseada em denúncia do Grupo Ação Ecológica. O MPF argumentou que a obra fere o Decreto-Lei 25/1937, que diz que “as coisas tombadas não podem ser destruídas, demolidas ou mutiladas”, e que a empresa de engenharia contratada para a execução da obra confessou ter feito todo o projeto baseado apenas em “inspeções visuais”.
Segundo a engenheira mecânica Gricel Osório Hor-Meyll, integrante do GAE, a conclusão do último parecer do Geo-Rio “não permite de forma alguma inferir que não há possibilidade de rupturas no maciço”. Segundo ela, a vistoria deveria ter sido mais aprofundada, de acordo com geólogos consultados pela ONG. “Para um projeto como esse, é imprescindível que sejam feitas sondagens e ensaios na rocha. A rocha não dá sinais prévios quando vai haver ruptura”, alertou. A vistoria da Geo-Rio foi feita de forma apenas visual.
Até o momento da suspensão, 128 m³ de rocha dos dois morros já haviam sido extraídos. Por isso o MPF pede, na ação civil pública, que o Iphan e a Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar (CCAPA), que administra os bondinhos do monumento e é também responsável pela obra, sejam multados em R$ 50 milhões cada. A peça, assinada pelo procurador da República Sergio Gardenghi Suiama, pede ainda a abertura de um inquérito policial contra a empresa, o instituto e os servidores envolvidos na liberação por suposto crime ambiental.
Íntegra da nota do Iphan
NOTA – Intervenções nos morros do Pão de Açúcar e Urca (RJ)
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) informa que, ao receber solicitações de várias entidades da sociedade civil relacionadas às intervenções nos morros do Pão de Açúcar e Urca, no Rio de Janeiro (RJ), iniciou processo administrativo para analisar a situação. Desse modo, o Instituto solicitou à Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, por meio da Fundação Geo Rio, informações sobre os possíveis riscos às estruturas geológicas que compõem o bem tombado.
Ao avaliar o projeto da tirolesa, o Iphan considerou, dentre outros fatores, a autorização emitida pela Fundação Geo Rio, órgão competente para a avaliação dos impactos geológicos e que, à época, concluiu pela viabilidade do projeto. Em vistoria técnica realizada recentemente no local, a Fundação reforçou o entendimento de que o projeto não apresenta riscos ao bem tombado, considerando que não há possibilidade de rupturas no maciço da região em que as intervenções serão realizadas e, portanto, não há comprometimento do morro, conforme é detalhado no parecer técnico encaminhado pelo órgão ao Iphan.
Cabe destacar que o Iphan tem o papel de analisar os impactos na paisagem cultural e que, por isso, precisa considerar possíveis riscos aos morros. No entanto, o parecer sobre os impactos geológicos não é dado pelo Instituto, mas pela Geo Rio, que possui competência para tal. Considerando as avaliações do órgão competente, o Iphan subsidia sua avaliação sobre os possíveis prejuízos ao bem tombado como um todo.
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