Manaus, AM — A motosserra pode causar traumas irrecuperáveis na floresta, mesmo quando está a serviço do manejo dito sustentável. Um estudo publicado na revista científica on-line PLOS ONE, por pesquisadores da Universidade de East Anglia, Inglaterra, sugere que espécies nobres, de alto valor, quando retiradas da floresta não retornam a níveis comerciais e correm o risco de desaparecer.
Foram estudados 824 áreas de exploração madeireira, espalhadas pelos 124 milhões de hectares de extensão do estado do Pará. Os dados coletados indicam a extração de 17,3 milhões de metros cúbicos de madeira, de 314 espécies diferentes. O Pará é responsável por quase metade da produção de madeira a partir de floresta nativa da Amazônia.
O estudo revelou que, para manter o retorno econômico, os madeireiros são obrigados continuamente a explorar novas áreas de floresta primária. “Nossa análise mostra que até mesmo o chamado ‘manejo de impacto reduzido’ em florestas tropicais pode não ser definido como sustentável em termos da composição e dinâmica florestal a longo prazo, sem considerar ainda a maior suscetibilidade das florestas exploradas a incêndios catastróficos“, afirma o professor Carlos Peres, um dos responsáveis pelo estudo.
Além de não encontrar evidência de que a composição volumétrica de espécies madeireiras recupera o valor inicial após o primeiro corte, os pesquisadores verificaram que apenas nas operações em frentes de atividade madeireira mais recentes e remotas, longe de estradas de tráfego pesado, ocorrem as espécies de alto valor comercial.
A tendência da atividade madeireira, além de buscar áreas ainda não exploradas, é manter um portfólio de abate, concentrado nas espécies de maior valor comercial. Para os pesquisadores, gerenciar os ganhos nas áreas de exploração de florestas é crucial para a integridade da biodiversidade e da viabilidade econômica da atividade a longo prazo.
De acordo com a autora principal do artigo, Vanessa Richardson, estudos prévios na Ásia sugerem que a atuais práticas comerciais podem levar a exploração de espécies até elas se tornarem raras a ponto de não ter mais viabilidade econômica. “Nossos estudos na região Neotropical reforça essa ideia”, afirma. “Nós já podemos ver uma mudança no mercado, em que madeireiros na fronteiras mais antigas e empobrecidas da Amazônia são forçados a dependerem de espécies de crescimento rápido, de madeira macia”, completa.
Durante o trabalho de campo, Vanessa Richardson calculou também o estrago que a derrubada de uma grande árvore, mesmo com corte seletivo e certificado de baixo impacto, provoca ao redor. De acordo com ela, morrem em média 12 árvores pequenas, por acidente, criando clareiras, onde ocorre a proliferação de espécies de crescimento rápido e madeiras leves.
Ela destaca que quando a exploração deixa a floresta totalmente diferente, mais suscetível ao fogo, à construção de estradas, à conversão do solo para a pecuária e entrada de caçadores, que podem reduzir as espécies de animais responsáveis pela dispersão de sementes.
“Todos estes fatores são conectados, mas é como se o primeiro ciclo de corte fosse a primeira facada na degradação da floresta”, compara a pesquisadora. “Para garantir a recomposição dessas árvores nas concessões florestais, ideal seria proibir o segundo ciclo, ou no mínimo adiar, ou diminuir o limite do volume legal para o corte, porque no modelo atual vai demorar muito mais do que 30 anos para recompor todas as espécies”, completa.
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Há um artigo de 2006 publicado aqui no Eco sobre o mesmo assunto que mostra como mentiras confortáveis há muito são base para nossas políticas florestais: http://www.oeco.org.br/colunas/fabio-olmos/18324-…
Ainda bem que saiu um artigo sobre isso, esse "manejo sustentável" devidamente autorizados, inclusive, é a coisa mais furada do mundo!
Isso é sobre a vegetação! o impacto sobre a fauna destas áreas nunca sequer foi considerada neste "manejos" !!!
Cabe divulgar a matéria abaixo editada hoje no OECO para referendar o que é o óbvio. Mas que continua sendo negado pelas estruturas que regem as regras de "uso" de áreas naturais para extração de madeira. Não bastou o que fizemos na Mata Atlântica ao longo de décadas, ao legalizar o corte raso a partir de planos de manejo que nunca foram minimamente consistentes. E que nem foram cumpridos dentro do que inicialmente permitiu o licenciamento. Nos enganamos conscientemente para trocar as florestas pela agricultura, pecuária e silvicultura.
E hoje reascendem movimentos aqui no Sul pleiteando pelo "manejo" das últimas florestas nativas de FOM como "única maneira para conservá-la". Uma intenção descarada e imoral para colocar no chão o que ainda resta de esperança de restaurar o que foram essas áreas naturais no passado recente. E o aval do poder público é parte integrante desse movimento falacioso e devemos enfrentar esse desvio adicional de favorecimento ilícito.
Na Amazônia, onde se corta mais ilegalmente do que legalmente, a discussão do impacto sobre áreas manejadas com técnicas minimamente coerentes, pode ser um exagero. No entanto, se a meta for a conservação da biodiversidade (quase nunca é), a melhor fórmula admitida como economicamente factível, é falsa do ponto de vista de efetividade para a conservação. Carlos Peres e Fernando Fernandez podem explicar isso muito melhor do que ninguém. A ciência que afirma isso é mais elaborada e respeitável do que a "ciência do manejo", que impõe suas verdades a partir de argumentos secundários, como o aspecto econômico e as vantagens frente ao desmate puro e simples. Não são argumentos aceitáveis para permitir a condução das práticas em curso.
Um verdadeiro oxigênio esses produtos mais contundentes a espelho da matéria abaixo. Pelo menos para baixar a crista de quem afirma que já encontrou a fórmula mágica do "manejo sustentável". Estão mentindo esses camaradas. Seja lá onde para onde estejam mirando suas motosserras. Divulgar melhor essas evidências é muito necessário.
Concordo! Devemos viver de luz mesmo.
É corriqueiro que os argumentos que motivam a continuidade da destruição estejam limitados a "não existir outra alternativa", ou "temos que alimentar o mundo", ou "do que as pessoas irão sobreviver". Uma desculpa atrás da outra para não se mexer no que está gerando resultados econômicos de curto prazo, mesmo que com um evidente comprometimento com o futuro. Uma fórmula que precisa ser melhor discutida. Ou ficaremos nessa retórica esfarrapada de sempre. Cavando um poço cada vez mais fundo e mais difícil de sair. A observação do colega é exemplar nesse sentido.