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Publicado originalmente por Central da COP
Você deve ter visto que Ronaldinho Gaúcho está na COP. A convite do país-sede, o Azerbaijão. Que é governado por um ditador. Que chama a ciência climática de “hipocrisia” e usa um termo bem mais nobre, “presente de Deus”, para se referir às reservas de petróleo e gás, que chegam a representar 50% do PIB. Não me parece que o Bruxo, que viajou do Brasil à Ásia num avião particular, esteja lá para defender a transição energética e a adaptação climática.
Futebol e petróleo sempre andaram de mãos dadas, seja através de patrocínios – a Lubrax na camisa do Flamengo dos anos 1990; a Petrobras nos campeonatos de futebol feminino em 2024 – ou, claro, através dos patronos. Romam Abramovich, o bilionário russo que revolucionou o futebol inglês, adquirindo o Chelsea no começo deste século, era um oligarca do petróleo. Rodolfo Landim, o atual presidente do Flamengo – clube mais vitorioso do Brasil nos últimos cinco anos – é dono de uma empresa de petróleo e gás. Alguns dos mais caros times europeus, como o Paris Saint Germain e o Manchester City, estão ligados aos fundos de petrocalifados como o Qatar e os Emirados Árabes. A última Copa do Mundo, vale lembrar, foi no Qatar. (E a última COP, nos Emirados Árabes…)
Há, por fim, o exemplo caricato da Arábia Saudita. Até três anos atrás o país era conhecido pela peregrinação a Meca e, claro, pelas reservas de petróleo. Hoje é o país onde jogam Cristiano Ronaldo, Karim Benzema, Sadio Mané, Roberto Firmino e Neymar. Lionel Messi não foi jogar na Árabia, mas em contrapartida ganhou ao menos 100 milhões de reais para passar férias e promover o país em suas redes sociais.
Hoje, os cinco maiores salários do futebol mundial estão na Arábia Saudita. Cristiano Ronaldo ganha 200 milhões de euros anuais – ou ou 1,2 bilhão de reais, na cotação atual. É quase o orçamento inteiro gasto pelo Ibama no ano passado. Ou seja: para fazer gols, um único jogador ganha a mesma quantia que uma autarquia recebe para proteger todos os biomas de um país que tem importância crucial no combate às mudanças climáticas. É um bom sintoma da disfuncionalidade do dinheiro gerado pelo petróleo.
O rolê de Ronaldinho no Azerbaijão, chegando em um jato particular, acompanhado de um ex-vice presidente da estatal de petróleo, pode até soar inusitado, mas não tem nada de aleatório. COPs são as principais trincheiras de enfrentamento político ao lobby dos combustíveis fósseis. E, por isso mesmo, são atulhadas de lobistas do combustível fóssil. A COP 26, na Escócia, teve 503 lobistas. A COP 27, no Egito, teve 603. Na a COP 28, nos Emirados Árabes, o número explodiu: 2.456, ou sete lobistas para cada indígena.
A diferença agora é que o lobby, com Ronaldinho, inaugura na COP a prática do “sportswashing”. Hoje, por exemplo, o Bruxo postou, em suas redes sociais, uma visita ao presidente da Socar, a estatal de petróleo. Parafraseando Milton Nascimento, o futebolista costuma estar onde o petróleo está. (ROBERTO KAZ)
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