O Observatório do Clima (OC) publicou nesta segunda-feira (27) um novo relatório sobre a política ambiental do governo Bolsonaro. Chamado “Nunca mais outra vez – 4 anos de desmonte ambiental sob Jair Bolsonaro”, o documento é referente ao ano de 2022, último da administração do ex-presidente, e faz uma retrospectiva do governo. Em suas 104 páginas, são listados indicadores e feitas análises sobre temas como a execução orçamentária do Ministério do Meio Ambiente – a menor desde 2000 –, desmatamento, impactos sobre povos indígenas, conflitos agrários e programas ambientais.
Nesse cenário, os 4 anos de governo Bolsonaro viram um aumento de 59,5% do desmatamento na Amazônia e uma queda de 38% no número de multas aplicadas pelo IBAMA por crimes contra a flora, em comparação com o período 2015-2018 – indo ao encontro da promessa do ex-presidente de acabar com o que chamava de “indústria da multa”.
Outro ponto destacado foi a grande participação de militares na execução da política (ou “necropolítica”, como classifica o relatório) ambiental do governo anterior. Só entre 2019 e 2020, o número de militares, principalmente do Exército, nomeados em funções civis da administração pública federal saltou de 3.515 para 6.157, um aumento de 75,1%. Segundo o Observatório do Clima, isso viabilizou o uso de estratégias militares para a destruição da política ambiental, com táticas como ataques, subversões e sabotagens a normas, instituições e à participação popular, listadas pelo relatório.
Assim, apesar de não ter conseguido cumprir a promessa de extinguir o Ministério do Meio Ambiente, Bolsonaro e os militares conseguiram cercear ao máximo a sua atuação. A média anual de liquidação orçamentária do MMA no período foi de R$ 2,8 bilhões, a mais baixa de um mandato presidencial na série histórica disponível no Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (SIOP), iniciada no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002). A liquidação no ano de 2022, de R$ 2,5 bilhões, foi a menor desde 2000, com valores corrigidos pelo IPCA.
Na parte de pessoal, o MMA, o Ibama, o ICMBio e o Serviço Florestal Brasileiro (transferido para o Ministério da Agricultura por Bolsonaro) estão com grandes déficits. Entre os fiscais do Ibama e do ICMBio, com cargos de analista ambiental (nível superior), mais de 1.500 postos estão vagos pelo país. Considerando cargos de nível médio e superior dos 4 órgãos, o déficit é de 4.100 servidores.
Na política indigenista, o governo Bolsonaro manteve a promessa de não demarcar nenhuma nova terra indígena, e permitiu o aumento de invasões a TIs, como as feitas pelo garimpo ilegal. A média anual de incursões não autorizadas mais que triplicou, segundo dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), passando de 88 entre 2016 e 2018, para 275 entre 2019 e 2021, ano em que foi registrado o maior número desde 2003: 305 invasões.
Segundo levantamento realizado pelo Instituto Socioambiental e pela Hutukara Associação Yanomami, o garimpo na TI Yanomami cresceu 54% de 2021 para 2022. O documento relembra também os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, cometido por criminosos ambientais que invadiam a Terra Indígena Vale do Javari, no Amazonas.
Nessa toada, a violência direta contra os indígenas também aumentou. Com uma média de 157 assassinatos entre 2019 e 2021 – número 30% maior que a média de 121 entre 2016 e 2018. Outra triste estatística foi a de suicídios, com 148 registrados em 2021. “Das 19 categorias de violência contra povos indígenas sistematizadas pelo Cimi, houve aumento em 15 no ano de 2021, na comparação com o ano anterior”, diz o relatório.
Na política fundiária, a paralisia da reforma agrária, que deu apenas títulos provisórios a antigos beneficiados, representou queda tanto no número de famílias assentadas (9,2 mil no governo Bolsonaro, 11,8 mil no governo Temer e 133,6 mil no governo Dilma) quanto nas áreas desapropriadas e incorporadas ao Plano Nacional de Reforma Agrária (2,8 mil hectares no governo Bolsonaro, 664 mil no governo Temer e 3,1 milhões no governo Dilma). Isso resultou em aumento da insegurança nas áreas rurais. “As mortes em decorrência de conflitos no campo também tiveram aumento recorde no período, passando de 27 em 2020 para 113 em 2021 – um acréscimo de 318%”, diz outro trecho.
O relatório cita ainda os programas ambientais “fake” criados na administração do ex-presidente. São listados o Floresta+, o Lixão Zero, o Adote um Parque, o Programa Nacional de Crescimento Verde e outros projetos para diminuição da poluição marinha, atmosférica e para criação de um mercado de carbono no país. Todos eles têm algo em comum: a total ausência de resultados significativos – ou de qualquer resultado, por menor que seja, alerta o relatório do OC. O Lixão Zero, por exemplo, reivindicou o fechamento de lixões que já estavam desativados ao menos desde 2018.
Para o novo governo Lula, o relatório cita três medidas classificadas como “fundamentais” para reverter o processo de degradação da política ambiental: aumentar a Contribuição Nacional Determinada (NDC, na sigla em inglês), a meta de emissões de carbono do Brasil no Acordo de Paris, reduzida pelo ex-ministro Ricardo Salles; barrar o “Pacote da Destruição”, como são chamados o conjunto de projetos de lei antiambientais em tramitação no Congresso; e anular a licença prévia da BR-319 (Manaus-Porto Velho), concedida pelo Ibama contra pareceres técnicos do próprio órgão, e cujo mero anúncio fez o desmatamento aumentar 122% na região.
O “Nunca mais outra vez” é o quarto e último relatório produzido pelo Observatório do Clima sobre a política ambiental do governo Bolsonaro. A primeira análise, publicada no fim de 2019, foi “O pior está por vir”, que alertava “investidores e parceiros comerciais do Brasil de que havia uma tentativa em curso de legalizar o ilegal”, diz a rede de ONGs. No ano seguinte, “Passando a boiada” detalhou os retrocessos nas pautas ambiental e climática do país, em referência à infame frase de Ricardo Salles em reunião ministerial. Para o terceiro ano de mandato, “A conta chegou” estampava as consequências de toda essa destruição – o “amplo descrédito sobre a agenda ambiental do governo dentro e fora de casa”.
“Está claro que a destruição ambiental promovida nos últimos quatro anos foi planejada e cumprida de forma consciente, assim como as ações genocidas contra os povos indígenas. Chegou a hora de investigar e punir os responsáveis, para que o Brasil não se esqueça, e para que nunca se repita”, afirma Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
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O cara que escreveu é avestruz esquerdista.