Nesta quinta-feira (1º), a Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) debateu a proposta que extingue o Refúgio de Vida Silvestre do Médio Paraíba. A unidade de conservação garante status de proteção integral a um significativo trecho do rio Paraíba do Sul. Em seu lugar, o projeto de lei nº 6.475/22 sugere a criação de uma Área de Proteção Ambiental (APA), da categoria de uso sustentável, que possui um caráter mais permissivo. Durante a sessão, a sociedade civil e o Inea-RJ, órgão ambiental estadual responsável pelo Refúgio, defenderam a manutenção da área protegida. Como resultado da forte pressão contrária, a proposta não foi votada na Comissão e as discussões foram adiadas para semana que vem.
O Refúgio de Vida Silvestre (REVIS) do Médio Paraíba foi criado em maio de 2016 (decreto de criação nº 45.659/16) com objetivos de assegurar a preservação da Mata Atlântica nas margens do Paraíba do Sul, a fauna e flora local, e garantir a segurança hídrica. O rio é um dos mais importantes para o abastecimento da região metropolitana fluminense. Com extensão de 11.133 hectares, o refúgio segue o leito do curso d’água e abrange territórios de 13 municípios: Resende, Itatiaia, Porto Real, Quatis, Barra Mansa, Volta Redonda, Pinheiral, Barra do Piraí, Valença, Vassouras, Rio das Flores, Paraíba do Sul e Três Rios.
A proposta de extinção do Refúgio (PL nº 6475/22) é de autoria do deputado André Ceciliano (PT). Em sua justificativa, o parlamentar aponta que as unidades de conservação de proteção integral possuem muitas restrições que dificultariam o desenvolvimento dos municípios. “Eu fui procurado pelos prefeitos da região, tenho 13 cartas de cada município sobre as dificuldades, especificamente de licenciamento [ambiental]. O que a gente quer é resolver o problema”, resumiu o deputado petista durante a sessão Comissão do Meio Ambiente.
A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN) falou em nome do setor industrial e também defendeu a recategorização. “Desde 2016 há um movimento junto ao órgão ambiental para redesenhar a área, fazendo com que classificação dessa unidade de conservação onde não é permitido nada, apenas pesquisa e visitação, para a realidade já existente ao redor do Paraíba do Sul”, alegou Tatiana Abranches, gerente Jurídica, Empresarial e Cível da Firjan.
Em resposta, o gestor do Refúgio de Vida Silvestre (REVIS), Ricardo Wagner, fez uma apresentação na qual exibiu mapas para esclarecer que o atual território da área protegida está concentrado no leito do Paraíba do Sul, suas 175 ilhas fluviais e as margens, e que as sobreposições com os 13 municípios são apenas parciais.
“Esses 13 municípios que têm sobreposição são, em grande parte, municípios que estão na calha do rio Paraíba do Sul. Foram desenvolvidos na calha do rio. A delimitação da unidade de conservação pega o leito do rio, a margem, faixa marginal de proteção e eventualmente alguns fragmentos de floresta mais conservados que drenam e contribuem com água para a bacia do rio Paraíba do Sul”, explica o gerente do REVIS.
As margens de rio já contam com proteção ambiental por serem Áreas de Preservação Permanente (APP), e as porções de floresta englobadas pelo REVIS contariam com a proteção da Lei da Mata Atlântica. Ou seja, o refúgio apenas reforça e centraliza a gestão pela conservação da natureza no território.
No próprio decreto de criação do REVIS fica estabelecido que não é necessária a desafetação de moradores e sua consequente indenização, tampouco interromper as atividades humanas, que seguem permitidas, desde que ambas estejam de acordo com os objetivos da área protegida. “A unidade não restringe, ela regulamenta”, resume Ricardo Wagner.
O funcionário do Inea explicou ainda que foi assegurado um recurso do governo federal, através de medida compensatória, para elaboração do Plano de Manejo no próximo ano. Com isso, será possível definir o zoneamento e as normas de uso no território, vendo cada situação e buscando soluções para possíveis conflitos.
A zona de amortecimento, perímetro no entorno da área protegida com regras próprias para evitar que os impactos cheguem no refúgio, também deve ser definida por decreto no início de 2023, afirmou o gestor durante a sessão na ALERJ.
Outro ponto levantado a favor da manutenção do Refúgio foi o repasse de ICMS Ecológico. O programa estadual, que transfere uma alíquota do imposto recolhido (2,5% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS) aos municípios, é uma recompensa às cidades pela proteção à natureza e pela gestão ambiental. A presença de unidades de conservação, principalmente de proteção integral, é um dos critérios que mais dão pontos aos municípios.
“Na região, nesse ano de 2022, pros municípios está sendo pago 26 milhões de ICMS Ecológico. E 45% disso são áreas protegidas. Só dessa unidade que estamos falando, pagou pros municípios mais de 2,5 milhões”, destacou o Diretor de Biodiversidade do Inea, Leandro Gomes, em sua fala.
Antes da pauta ser levada à ALERJ, o Inea já havia apresentado um parecer técnico contrário ao PL e à extinção do REVIS.
Já o deputado do PSOL, Flávio Serafini, reforçou a importância da proteção ao rio Paraíba do Sul para garantir a segurança hídrica do estado do Rio de Janeiro. “Às vezes a aparente defesa do que seria mais interessante economicamente, se isso não se dá de forma mais detalhada e de forma mais cuidadosa, isso acaba saindo contra o conjunto da sociedade porque impacta negativamente o meio ambiente e traz outras consequências negativas. É fundamental que ao invés de destruir esse refúgio, se debata claramente o que se tem de projeto para região”, afirmou o parlamentar na Comissão.
“Porque essa reserva é importante, cumpre um papel estratégico pro Rio de Janeiro e não dá para ela ser dinamitada, completamente desfeita, por um interesse econômico difuso, que sequer aparece qual o problema”, completou.
Após uma sessão marcada por uma unanimidade de falas da sociedade contrárias à extinção do REVIS, que se somaram ao coro dos representantes do Inea-RJ, foi acatada uma moção pela retirada de pauta do PL, que nem chegou a ser votado pela Comissão.
Como resultado, o deputado estadual André Corrêa (Progressistas), que presidiu a sessão, solicitou que fosse enviado um ofício, ainda nesta quinta-feira, para a FIRJAN e para as 13 prefeituras dos municípios abrangidos pela área protegida para que especifiquem quais seriam os conflitos com a presença da unidade de conservação de proteção integral.
A expectativa é que o debate da proposta seja retomado na próxima semana, mediante as respostas.
Sociedade civil se manifesta: “Em defesa do Paraíba do Sul“
Um abaixo-assinado organizado pela Articulação de Agroecologia do Médio Paraíba do Sul (AAMPS) contrário ao PL circulou virtualmente e somou mais de 1 mil assinaturas em 24 horas.
Representante da AMMPS, Francisco Schnoor destacou que a proposta é um retrocesso. “Visto a fragilização que isso traria para um rio tão importante para o sudeste brasileiro e o mais importante do nosso estado. Onze milhões de fluminenses têm sua vida afetada por esse rio”, aponta.
“Mas eu fiquei feliz com o resultado de hoje porque eu vi a sociedade em peso sendo unânime na proteção desse rio e desse refúgio”, avalia.
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