Roberto Schaeffer é um dos pesquisadores brasileiros que compõem o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) e um dos autores do terceiro relatório de 2007, sobre medidas de mitigação e adaptação às previsões nada tranqüilas para o futuro do clima. Engenheiro e especialista em energia, Schaeffer passou a adotar comportamentos que o credenciam a ser verdadeiramente crítico em relação ao que precisa mudar nos hábitos de consumo energético de pessoas e países. Viaja o mundo participando de congressos e pesquisas, mas não tem televisão nem ar condicionado em casa, tampouco usa carro. Por opção. Também por isso enveredou para a área ambiental, e começou a questionar até que ponto os problemas ecológicos do mundo estavam ligados ao uso inapropriado das tecnologias, desafiando o próprio conceito de progresso. Hoje Schaeffer participa da equipe do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, no Rio de Janeiro.
Numa manhã de trânsito caótico no Rio de Janeiro, Schaeffer foi a pé até a redação de O Eco, onde falou sobre as possibilidades de diversificação da matriz energética brasileira e explicou que para amenizar o drama das mudanças climáticas, hoje não é preciso grandes sacrifícios. Embora pequenas transformações no dia-a-dia estejam ao alcance de todos, o pesquisador observa que só mesmo quando a situação se agravar ainda mais as populações devem realmente se empenhar e pagar um preço mais caro para conseguir sobreviver às novas condições climáticas que se impõem.
O que está errado na cabeça do consumidor atual?
Schaeffer – Hoje, quando uma pessoa vai comprar um carro, ela deveria se preocupar com a eficiência do veículo, se ele é estável, se é pequeno para estacionar. Mas o que se procura é banco de couro, tocador de mp3, etc. Enquanto as pessoas enveredarem por isso, aí realmente o planeta vai se aquecer mesmo, e lá na frente você terá um custo muito maior para lidar com o problema. Ainda há tempo de sobra para enfrentar as mudanças climáticas desde que a gente comece a abrir mão daquilo que consideramos importante, mas que talvez não seja.
Mas é preciso uma contrapartida das empresas. No fundo, somos acostumados a pensar um carro desta maneira.
Schaeffer – Não. Se você for à concessionária e disser: “Bom dia, eu quero comprar um carro. Qual o mais eficiente que o senhor tem aí?”. O vendedor vai falar que não sabe. Aí você diz obrigado, eu vou lá na concorrente, onde foram mais prestativos e me mostraram um modelo assim, assado. Quer dizer, as fábricas de hoje não fazem carros eficientes porque aparentemente as pessoas não querem isso.
Como comprar por eficiência?
Schaeffer – Por exemplo: o carro terá que fazer um mínimo de 15km/l. Pronto. Ao determinar isso, uns farão carros melhores que outros. E isso vai impactar as empresas. Se todo mundo faz, cria-se um novo patamar e a competição vai continuar a existir de qualquer maneira. Às vezes, empresas dizem que isso imputa novos custos e elas se tornam menos competitivas. De maneira geral, não é isso que o mundo tem mostrado. No caso americano, a própria relutância em aderir ao protocolo [de Quioto] está fazendo com que indústrias de lá, em particular a automobilística, percam muito em competitividade em comparação à européia ou à japonesa.
O que a população comum pode adotar para ser mais eficiente em termos energéticos?
Schaeffer – Por exemplo, a iluminação nesta sala é absolutamente ineficiente. Eu podia ter um terço ou um quarto das lâmpadas que existem aqui porque esta lâmpada não é reflexiva, então metade da luz dela ilumina o teto. Dessas quatro lâmpadas, seriam necessárias apenas duas. Também não sei se esse ar condicionado daqui é tão eficiente. Poderia haver uma arquitetura bem melhor que usasse mais a ventilação natural. O consumo desse ambiente poderia ser 25% do que é. Isso vale também para os carros, como estávamos falando antes. Um veículo de passeio médio hoje que faz 10km/l, poderia fazer 20km/l sem problema nenhum. Essas nossas caixinhas de TV a cabo têm mais de 30 watts de potência. Uma geladeira média tem o consumo de 80 watts ligada. Ou seja, uma pessoa que tem duas caixinhas de TV a cabo tem uma geladeira a mais em casa. O sacrifício não parece que é nada tão complicado, mas as pessoas relutam nem que seja para mudar minimamente alguma coisa. Hoje seria tranqüilo reduzir consumo de energia à metade facilmente. E isso serviria aparentemente para resolver o problema.
O que falta, então?
Schaeffer – Eu acho que o problema tem que ficar um pouco mais grave do que o que está para que a população se torne mais consciente.
O que é um pouco mais grave para você?
Schaeffer – Você terá que ter um verão ano que vem no Rio de Janeiro em que a temperatura chegue a 45º durante três, quatro dias seguidos. Ou um vendaval em que as janelas quebrem. Mais um furação Catarina no Sul do Brasil, que mostre que a coisa está ficando braba mesmo. Mais casos de malária, dengue. Acho que tem que ser por aí. A gente parece que está preocupado, mas eu não conheço ninguém que tenha jogado o carro no lixo para andar de bicicleta. Quer dizer, estamos preocupados mas não tanto.
Qual é o estímulo que se tem de trocar o carro pelo transporte público sucateado das cidades?
Schaeffer – Uma coisa puxa a outra. Há quinze anos, quando eu cheguei na Coppe como professor, o estacionamento quase não tinha carro. Ficava cheio de gente em uma fila pedindo carona. Hoje, quase todo mundo de classe média possui um carro. Não tem ônibus porque as pessoas não querem, é mais cômodo andar de carro. Acho que tem que ter um pouco os dois lados. Deve haver o investimento público, mas ele só vai existir se de fato as pessoas começarem a cobrar isso. Um sintoma foi claro nas últimas eleições presidenciais. Quando o Lula e o Alckmin eram candidatos, tentamos marcar um debate sobre as mudanças climáticas. Nenhum dos dois topou. Eles não perceberam que aquilo era um assunto relevante. Talvez hoje fosse diferente, mas o fato é que poder público reage ao que as pessoas querem. E não me parece que as pessoas querem isso.
“A GENTE PARECE QUE ESTÁ PREOCUPADO, MAS EU NÃO CONHEÇO NINGUÉM QUE TENHA JOGADO O CARRO NO LIXO PARA ANDAR DE BICICLETA.”
O peso da contribuição da população no enfrentamento das mudanças climáticas no relatório três do IPCC será tão importante quanto a indústria e as ações de governo?
Schaeffer – Acho que não há muito como separar população e indústria porque a indústria faz o bem que a população exige. Na verdade, entende-se que cerca de 80% das emissões de gases estufa do mundo, na média, venham de energia. Em energia, a emissão se dá no ponto de consumo final – no caso de combustíveis – ou no ponto de geração de energia elétrica. O relatório três irá focar nos usos finais da energia, basicamente.
Como esse assunto será organizado?
Schaeffer – Tem um capítulo de transporte, outro sobre indústria, um que fala apenas de edificação. Esse capítulo vai falar que existe um grande potencial de eletrodomésticos mais eficientes. Em país de clima frio, janelas com vidraças duplas perdem menos calor para fora. O capítulo de transportes mostrará as alternativas, desde eficiência energética à substituição de combustíveis. O capítulo de indústrias vai falar que de fato existem muitas indústrias com perfis diferentes.
Quais perfis?
Schaeffer – Na indústria hoje coexistem tecnologias muito diferenciadas. O problema é, de maneira geral, o peso da energia é muito pequeno, cerca de 5% de seu custo. No fundo, diminuir o consumo em 30% é reduzir o seu custo em 1,5%. Então será que vale a pena eu mexer nessa minha planta, trocar motor e etc., por 1,5%? Normalmente a conta da indústria é: ela só mexe na sua planta se associado a um ganho energético expressivo. Como a vida média dos equipamentos é muito longa – uma caldeira de uma indústria dura 40 anos, 50 anos – ninguém quer trocar uma coisa que tem 20 anos de vida, que vai durar mais 20, só porque ele vai economizar 1,5% no seu consumo de energia elétrica.
E o que fazer para incentivar mudanças nessa lógica industrial?
Schaeffer – Há uma inércia muito grande que faz com que você tenha que começar bem devagar, ter legislações padrões muito mais em cima do novo. Por exemplo, ninguém está falando que o carro tem que ser 50% mais eficiente, mas o carro novo pode ser, de maneira que daqui a dez ou 20 anos, quando tiver a troca da frota total de carros, todos os novos sejam mais eficientes.
As pessoas relutam quando pensam se vale a pena o esforço pessoal quando os outros não colaboram. Que outros incentivos elas têm?
Schaeffer – Há vários mecanismos. O do preço, por exemplo. Quem consome de 0 a 100 watts paga 30 centavos por kw/h.
Na época do apagão o governo fez um cálculo que beneficiava quem desperdiçava energia.
Schaeffer – Aquilo foi um caso de emergência. O mais trivial era você usar um valor fixo para todo mundo. Com planejamento, você pode fazer isso de maneira mais inteligente. No caso da energia elétrica não há nenhum problema de você ter uma escala de preços. Pessoalmente, eu acho que o preço da energia ainda é muito barato. Outro dia eu jantei fora com três pessoas e a gente gastou cento e poucos reais. Eu não gasto isso de energia elétrica por mês na minha casa. Prefiro muito mais não comer no restaurante e ter energia elétrica. Se o meu gasto de energia elétrica fosse multiplicado por cinco, ainda assim eu teria energia elétrica em casa. É caro porque a gente diz que é caro. Essa minha calça aqui talvez seja um mês de conta, eu não preciso ter três calças dessas ou cinco, entende?
Dentro da academia, é possível ver que dá para começar a buscar solução, mas aí você bate em um cipoal de interesses particulares tão grande que o faz ficar paralisado.
Schaeffer – Esse é o problema. Grande parte da solução não é tecnológica. Mas há uma série de imbróglios institucionais que precisam ser resolvidos. Um exemplo é o setor sucroalcooleiro no Brasil. Quando você planta cana, pode produzir açúcar e álcool. Sobra a parte lenhosa da cana que é o bagaço. Como você precisa de calor e energia elétrica no processo, a indústria queima aquilo em uma turbina a vapor convencional, gera energia elétrica e calor também. Usa os dois para seu consumo próprio. Só que ela queima o bagaço de maneira mais ineficiente possível porque ela produz muito bagaço.
Como assim?
Schaeffer – Ela poderia produzir três a quatro vezes mais de energia elétrica do que precisa. Só que ela não consegue vender isso para a rede porque isso se chama tarifa de “back up”. Qualquer pessoa, de vez em quando, tem que desligar a sua fábrica, fazer uma manutenção. E nesse momento tem que recorrer à rede para comprar energia, mas as empresas fazem um terrorismo de cobrar uma tarifa absurda quando se precisa de energia. A tarifa é tão absurda que é a mesma coisa se você estivesse comprando o ano inteiro direto energia elétrica por um dia. Resultado: você desestimula que o cara seja mais eficiente, que gere excedente de energia elétrica para vender porque o setor quer ser gerador de energia, e não comprador de energia.
Quem perde é o país.
Schaeffer – Isso é um pequeno exemplo de uma tecnologia madura, que a gente sabe fazer, tem um potencial enorme. Só no estado de São Paulo o potencial é maior do que Itaipu, ou Belomonte, rio Madeira e etc. Mas por vários interesses não acontece. Ainda que faça sentido econômico para o setor sucroalcooleiro vender energia elétrica, ele sabe que ganha mais dinheiro plantando ainda mais cana.
“AINDA QUE FAÇA SENTIDO ECONÔMICO PARA O SETOR SUCROALCOOLEIRO VENDER ENERGIA ELÉTRICA, ELE SABE QUE GANHA MAIS DINHEIRO PLANTANDO AINDA MAIS CANA.”
Em que estágio o Brasil está em relação às mudanças de comportamento e de uso de tecnologias mais eficientes?
Schaeffer – Em relação a países em desenvolvimento, seguramente nós somos os mais avançados.
Em relação a quê?
Schaeffer – Em relação a tudo, em termos de legislação, preocupação da classe média, preocupação da mídia e dos governos. A China é um escândalo completo. É um acidente que ela ainda esteja crescendo 10% ao ano. É só questão de meses ou anos para aquela coisa quebrar lá. Tem colegas meus que falam que os prédios da China vão começar a cair qualquer dia. Lá não existe controle de qualidade em nada: o aço não tem controle de qualidade, nem o vidro, tudo vai colapsar lá. Eu fui à China duas vezes, em 1988 fiquei três meses por lá e a única maneira de se movimentar era de bicicleta. Há seis meses, em uma reunião do IPCC, quase não vi bicicleta. Quando você chega no aeroporto do Rio, sente cheiro de esgoto; lá você sente cheiro de enxofre.
Quando se discute uma suposta a crise energética no Brasil, o que o país precisa realmente fazer?
Schaeffer – Estamos falando de curtíssimo prazo. Hoje quase 90% da nossa energia ainda vem de hidrelétrica. Isso varia um pouco em função dos regimes de chuvas. Nesses últimos dois anos, São Pedro tem mostrado que é do PT e claramente não do PSDB, porque o problema que tivemos em 2001 agora está invertido. Os reservatórios do Nordeste bateram 97% de suas capacidades. O Sudeste está em 87%, o Sul está em 80%. Como nossos reservatórios mais ou menos têm água para dois anos, 2007 e 2008 estão garantidos. Esse possível risco é 2009.
Quer dizer que se chover não vai faltar energia nunca?
Schaeffer – Se o consumo de energia não crescesse mais no Brasil, sim. Por isso que os problemas que a gente enfrenta são muito diferentes dos americanos e europeus. Na medida em que lá a população não cresce mais, o serviço é manter o se tem. Aqui, espera-se (e eu discordo), que o consumo de energia elétrica continue a crescer segundo sua média histórica: 5% ao ano.
O que está acontecendo hoje com a nossa política energética?
Schaeffer – No Brasil de hoje, 90% da energia vem de hidrelétrica, e a gente só usa 30% desse potencial. Desses 70% que estão por ser utilizados, metade está na Amazônia. Mas desde a década de 70 não existem estudos sobre a vulnerabilidade desse setor lá. Então não se sabe quanto que dá para fazer e quanto não dá, e ao mesmo tempo o governo diz que o consumo aumenta 5% ao ano. Estamos com problemas de gás da Bolívia, o carvão do Brasil não é de boa qualidade, o que sobra é hidrelétrica. E nuclear, eu acho que não é a solução.
Por que não?
Schaeffer – Por várias razões. Do ponto de vista ambiental e local, é uma beleza. Mas se der um probleminha… E outra questão é que nenhum lugar do mundo ainda equacionou o problema do rejeito nuclear. Alguns deles têm uma meia vida de 20 mil anos. Ou seja: leva 20 mil anos para a radioatividade daquele elemento cair à metade. Nenhum lugar do mundo achou ainda um lugar ou conseguiu concordar com a sociedade onde colocar o rejeito radioativo. Além disso, o nuclear hoje é muito caro. Nesse momento geração elétrica de cana é mais barata, eficiência energética é mais barata, eólica é mais barata, há muita hidrelétrica no Brasil que pode ser feita de maneira inteligente que é mais barata.
O Brasil precisa de energia no futuro…
Schaeffer – Precisa, muito menos do que está se falando.
Então, de alguma energia a gente vai precisar. Qual é a nossa opção de curto prazo?
Schaeffer – Uma porção de coisa. Eu começaria pela eficiência energética, quer dizer, você passar a ter padrões mínimos de eficiência para eletrodomésticos. Hoje, quando você vai a uma loja comprar uma geladeira, já existe um selo PROCEL [Programa Nacional de Conservação da Energia Elétrica] que o vendedor da loja geralmente tira, porque ele não tem interesse que você fique sabendo que aquela Brastemp consome mais. Além disso, você tem que ter, eventualmente, uma tarifa que finalize o verdadeiro custo. Eu sou contra, por exemplo, tarifa subsidiada para baixa renda. Vários programas do mundo mostram que faz mais sentido você dar o dinheiro na mão para o sujeito do que você ter uma tarifa menor.
Por quê?
Schaeffer – Se você dá uma tarifa menor o cara consome energia de maneira ineficiente. Se você recebe 50 reais por mês por uma conta de luz desse mesmo valor tem estímulo para reduzir a conta para 25 reais e colocar no bolso o restante para aumentar o padrão de consumo.
Que mais alternativas nós temos?
Schaeffer – Bagaço de cana inutilizado no Brasil. Dependendo da conta que se faça, você pode chegar a um potencial de no mínimo uns dez gigawatts de bagaço de cana que não estão sendo usados. Ou seja: uns dois ou três anos de Brasil já parado que poderia ser utilizado. Se você pegar esses dois, três anos de Brasil e parar no bagaço com conservação, talvez nos próximos cinco anos já houvesse energia garantida para o país.
“DEPENDENDO DA CONTA QUE SE FAÇA, VOCÊ PODE CHEGAR A UM POTENCIAL DE NO MÍNIMO UNS DEZ GIGAWATTS DE BAGAÇO DE CANA QUE NÃO ESTÃO SENDO USADOS.”
Sem precisar construir uma hidrelétrica?
Schaeffer – Isso. Não existe energia limpa.
Nem a solar?
A solar é sujíssima. O processo de mineração para fazer um painel fotovoltaico é sujíssimo. Às vezes tem que ter bateria, que também é ruim.
Então qual é a solução?
Schaeffer – Você teria que ter eventualmente uma certa indústria que tivesse a capacidade de queimar ou trabalhar com múltiplos combustíveis.
Uma indústria Flex.
Schaeffer – É isso. Eu acho que a solução é um pouco de cada, onde a minha hierarquia seria hidrelétrica primeiro, eficiência, bagaço de cana, termoelétrica, eólica. A eólica tem problema de sazonalidade e flutuação, mas o Brasil é muito grande, e é um pouco da característica da energia elétrica brasileira essa complementaridade entre as diferentes bacias.
Como é que o Brasil pode reduzir sensivelmente suas contribuições de emissões?
Schaeffer – Nossa emissão é muito baixa e sempre vai ser. A questão do desmatamento é outra história, mas eu vejo como uma vantagem brasileira e não como uma desvantagem porque é tranqüilo controlar. Você tem lei, tem tudo, mas não há uma grande vantagem política, ou não há pressão popular. O dono da terra ou o grileiro ganha dinheiro cortando a mata. E não cortando ele não ganha. Só que o que ele ganha é muito menor do que o valor daquela floresta. Então não é difícil começar a pensar em regimes internacionais de pagamento pelo serviço que a floresta proporciona.
Mas isso é dificílimo. Quem quer pagar por isso?
Schaeffer – Ninguém quer pagar. Mas recentemente a gente está entendendo essa relação.
Se você tivesse um horizonte para dar, em quanto tempo os serviços ambientais vão aumentar?
Schaeffer – Eu acho que em menos de 15 anos porque já está começando a haver esse tipo de movimento. O próprio Brasil apresentou em Nairóbi uma primeira proposta de um fundo internacional para não pagar pelo desmatamento.
Mas a proposta brasileira é atrasada porque não quer se comprometer com metas de desmatamento.
Schaeffer – Neste momento não quer se comprometer. Mas, crescentemente, eu começo a ver as pessoas começarem a trabalhar com essa possibilidade. Pessoas importantes do meio. E o Brasil vai tirar isso de letra. Se, por acaso, a gente tiver que medir nossas emissões, na medida em que ¾ dela vêm do uso da terra, significa reduzir o desmatamento por ano em cerca de 8%. E isso não é nada. Se você colocar 50 homens armados lá em cima você já reduziu os 8%. Qualquer cobrança que o Brasil venha a ter, ele é o que mais tem a ganhar. Matriz de energia limpíssima e ¾ de desmatamento onde você, de um ano para o outro, consegue reduzir a metade. Nesse ponto eu sou otimista. Na medida em que as pessoas reconhecerem que o cenário que se avizinha é pior do que se fala mesmo, vai ser só uma questão de tempo para entender que é preciso mudar.
Nós somos da geração da Dilma Roussef. E a gente mudou, ela não.
Schaeffer – Mas eu acho que o empresário está mudando. Eu sinto certa oxigenação na indústria paulista.
A gente não falou de adaptação.
Schaeffer – Adaptação é uma das novidades desse relatório três. Vem pela primeira vez com uma força razoável você agora não só falar mais de mitigação, mas de entender que chegou-se a um ponto tal que só a mitigação não será suficiente. Você agora não tem vergonha de falar que se chegou a um estágio tal que a adaptação já é necessária sim.
O que é considerada uma medida de adaptação diante dos cenários colocados pelo IPCC?
Schaeffer – Há que começar a pensar em novas espécies de soja mais resistentes a regimes menos chuvosos, novas construções, novas pontes mais resistentes a vendavais mais fortes. Há que se considerar agora, quando fizer uma casa de frente para o mar, de repente colocá-la em um pilar mais alto. Já se fala em adaptação da própria infra-estrutura. Há que se pensar em hospitais maiores na área de doenças infecto-contagiosas, em criar um curso mais especializado em dengue, malária, no sentido de antecipar problemas que vão ocorrer. As hidrelétricas precisarão ter um reservatório maior, menor, de repente o biodiesel terá que ir para essa região ou para aquela, a cana vai ter migrar para cá porque no Sul do Brasil e no Sudeste não vai ter água suficiente para ela crescer. Quer dizer, em função desses primeiros resultados, começa-se a olhar com mais cuidado para a questão da adaptação a essa vulnerabilidade que você já detecta sem dúvida nenhuma. Isso já é um reconhecimento da gravidade da coisa.
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