No ano em que completa seu 10ºaniversário, o FUNBIO (Fundo Brasileiro para a Biodiversidade) dá uma guinada de 180 graus nos critérios para financiar projetos. O objetivo é apoiar projetos que integrem vários parceiros, para aumentar a efetividade do dinheiro aplicado. Nos próximos meses, serão conhecidos os nomes dos projetos que terão à disposição volumes altos de dinheiro – entre US$ 4 e 6 milhões – por períodos que variam de 10 a 12 anos, formados por consórcios de ONGs, instituições de pesquisa, entidades governamentais e indivíduos que também têm a responsabilidade de captar recursos complementares.
“Ao fazer o balanço do nosso trabalho de 1995 para cá, descobrimos que a eficácia de projetos aumenta à medida que se trabalha de forma sinérgica, juntando vários pequenos projetos em um grande programa regional, que atue de forma complementar e integrada”, afirma o secretário-geral do FUNBIO, Pedro Leitão, citando, como exemplo, a baía da ilha Grande, no litoral Sul do Rio de Janeiro, onde coexistem inúmeros projetos de recuperação ou conservação, com resultado geral insuficiente.
Curiosamente, todos os sete projetos pré-selecionados entre os 25 candidatos que se inscreveram no último edital do Programa Integrado de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade do FUNBIO se situam na região da Mata Atlântica. É lá que a sociedade civil está mais organizada e que a consciência ambiental e a preocupação com a redução das florestas são maiores, supõe Pedro Leitão.
Embora situados no mesmo bioma, os projetos são bastante diversos. Em Alagoas, há uma área de Mata Atlântica que sobrevive como uma ilha em um mar de canaviais. No litoral da Bahia, região de Itacaré, a ONG Floresta Viva, o Ceplac (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira) e entidades de turismo tentam reavivar a cultura do cacau. Outro projeto tenta estimular agricultura alternativa em uma área pobre e degradada do norte de Minas Gerais. O Ibio (Instituto Bioatlântica) apresentou proposta de conservação em um trecho bem preservado no leste da baía de Guanabara. No Vale do Ribeira, em São Paulo, o Instituto Florestal pretende preservar uma área de quilombolas. No Paraná, há um projeto para salvar os remanescentes de araucárias e outro projeto de fomento de agricultura familiar.
“É possível que todos estes projetos sejam contemplados” antecipa Pedro Leitão, um engenheiro de formação que faz trilhas na natureza com os filhos e está convencido de que o interesse coletivo é pressuposto de ordem ambiental e conservação.
O FUNBIO foi fundado com uma dotação única de US$ 20 milhões do GEF (Fundo para o Meio Ambiente Global), que, somados às contrapartidas de parceiros e acrescidos de seus rendimentos no mercado financeiro, viraram US$ 28 milhões, tendo financiado cinco programas num total de 62 projetos. Um desses programas é o de Melhores Práticas para o Ecoturismo que, ao custo de R$ 4 milhões, gerou o primeiro manual de capacitação e uma cooperativa de prestação de serviços independente, que agora já anda com as próprias pernas.
Outro programa, este mais recente, é o de Áreas Protegidas da Amazônia, iniciativa do governo federal em parceria com estados e municípios da Amazônia, o GEF, o Banco Mundial, o Banco de Desenvolvimento Alemão KFW, o WWF-Brasil e o FUNBIO. A gerência financeira dos projetos de criação de novas unidades de conservação e consolidação das já existentes, bem como o fornecimento de bens e serviços, cabe ao FUNBIO, que, para isso, contratou técnicos especializados. Os objetivos do programa são ambiciosos: triplicar a superfície protegida na Amazônia até 2012, criando novas unidades de conservação, envolvendo comunidades locais e monitorando a biodiversidade nas respectivas áreas de atuação.
Dentro da nova filosofia de trabalho, o FUNBIO pretende agora fazer nova proposta ao GEF (Fundo para o Meio Ambiente Global) para mais uma tranche de US$ 10 milhões, enquanto põe seu think-tank a elaborar novos projetos que posam ser exemplares e replicáveis. Um deles, ainda na prancheta, junto com o Instituto Bioatlântica, é selecionar um trecho ao longo do Rio São Francisco ou do Rio Doce para recuperação de matas ciliares com espécies nativas.
Os empecilhos a enfrentar são espinhosos. O primeiro deles será assegurar, junto aos proprietários, condições contratuais de longo prazo para garantir a execução dos trabalhos necessários. A idéia é lançar mão de mecanismos de compensação, como o pagamento de uma taxa pelo uso da água. O segundo – e talvez mais complicado, dado o curto prazo dos períodos administrativos – será convencer os governos em todos os níveis das vantagens de um projeto desse tipo. Conversas preliminares já ocorreram, e o plano é fechar o pacote até o final do primeiro semestre.
Se for selecionada a região do rio Doce, próximo de Linhares, Espírito Santo, uma das regiões mais degradas ambientalmente e de mais baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país, o projeto poderia se beneficiar da proximidade do horto florestal da Companhia Vale do Rio Doce e de dois entusiasmados guerreiros pela causa ambiental: o próprio diretor do horto, o engenheiro florestal Renato de Jesus, e o renomado fotógrafo Sebastião Salgado, que – com ajuda do primeiro – replantou uma floresta nativa em uma área totalmente degradada.
“O Instituto Ambiental Vale do Rio Doce, nome oficial do horto da CVRD fundado em 2000, está hoje na vanguarda em recuperação ambiental e nas mais modernas técnicas de biotecnologia, replantio de espécies nativas e manejo geológico e tem cedido sua tecnologia para órgãos públicos e o setor privado”, orgulha-se o diretor de meio ambiente da companhia, Maurício Reis. Comandando uma equipe de 40 pessoas, Renato Jesus é responsável pela pesquisa de seleção de espécies e pelos trabalhos de biotecnologia com o uso de espécies vegetais que aceleram o processo de “colonização vegetal” ou a aplicação de bactérias que entram em simbiose com as plantas, acelerando, por exemplo, a fixação do nitrogênio no solo. As modernas técnicas de revegetação incluem inúmeros métodos de regeneração natural, plantio de espécies arbóreas e arbustivas e hidrossemeadura. No total, a equipe chefiada por Renato de Jesus trabalha com mais de 600 espécies.
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