Uma moda inaugurada pelo dublê de sojeiro e governador de Mato Grosso – a extinção de Parques Estaduais por decreto legislativo – ameaça se alastrar pelo Congresso Nacional. Dois deputados federais do Espírito Santo, Marcelino Fraga do PMDB e Neucimar Fraga do PFL, subiram à tribuna para defender seus respectivos projetos de lei para sustar o decreto federal de 19 de dezembro de 2002 que criou o Parque Nacional dos Pontões Capixabas. O Parque protege uma nesga importantíssima do que ainda resta de Mata Atlântica no país e formações de granito semelhantes ao Pão de Açúcar. Seus 17.496 hectares espalham-se por três áreas distintas localizadas nos municípios de Pancas e Águia Branca, no Espírito Santo.
O Parque tem os últimos remanescentes de Mata Atlântica no Estado e uma fauna formada por espécies raras, como a onça-pintada, preguiça-de-coleira e tucano-de-bico-preto. Até a década de 30, no século passado, a área era habitada por índios bravios. Depois foi colonizada por imigrantes mineiros. Na década de 50, a região foi ocupada por imigrantes europeus. “Eles desmataram até topo de morro de granito”, conta um funcionário do Ibama, dizendo que a região sempre foi imprópria para atividades agrícolas.
Antes mesmo da criação do Parque, a área já tinha sido tombada pela UNESCO como Reserva da Biosfera. Seu entorno está bastante detonado e a demarcação serviu para barrar as extrações irregulares de granito e a expansão indevida de atividades agrícolas sobre a área. E é justamente isso que parece estar incomodando os dois deputados capixabas. Eles argumentam que na área do Parque vivem cerca de 400 famílias pobres, descendentes de imigrantes pomeranos e donos de ampla consciência ecológica – o que, na visão dos dois políticos, dispensa a necessidade de se ter no local uma Unidade Conservação.O que eles chamam de consciência de preservação dessa comunidade são as atividades agropecuárias que ela desempenha, a criação de búfalos e o plantio de café e hortaliças. Gado e agricultura, historicamente, sempre cresceram às custas do desmatamento. Mas isso não parece fazer diferenca para os dois deputados, que afirmaram em seus discursos na Câmara que seus projetos, apresentados este ano, tinham o apoio de toda a bancada capixaba.
Eles têm também o apoio da gerência local do Ibama, que deveria ter iniciado o levantamento das pessoas que habitam a área dos Pontões para cadastrá-los, indenizá-los e livrar o Parque de sua presença. “Mas o trabalho se arrasta há três anos e parece longe da conclusão”, diz a pessoa que pertence ao quadro do Ibama e prefere guardar seu anonimato por conta da possibilidade de retaliação. Pode parecer surpreendente, mas a chefia local do órgão torce para que o Parque acabe.
Tudo isso é uma pena. Mas não chega a ser surpreendente. Na busca de votos, políticos sempre parecem dispostos a fazer qualquer coisa. Até tacar fogo no mato. E infelizmente, parece que a moda de acabar com Parques Nacionais por determinação do Congresso anda de vento em pôpa em Brasília. Nesta quinta-feira, acontece na Câmara dos Deputados audiência pública para discutir projeto de lei do deputado Carlos Melles (PFL-MG) que prevê a redução do Parque Nacional da Serra da Canastra dos seus atuais 200 mil hectares para exíguos 70 mil hectares.
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