Reportagens

Dia da Árvore não basta

O Paraná comemorou a Semana da Árvore com replantio recorde de 5 milhões de mudas nativas nas margens de seus principais rios, em todos os municípios.

Andreia Fanzeres ·
23 de setembro de 2005 · 19 anos atrás

Dia da Árvore é sinônimo de… árvore! Geralmente plantada pelas mãos de alguma autoridade sensibilizada com a causa. Mas no Paraná, em vez de uma mudinha simbólica, o governo do estado resolveu plantar logo 5 milhões. Achou muito? O plano anunciado pela Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos vai ainda mais longe: quer somar 90 milhões de mudas até 2006.

Os números são dignos de registro no livro dos recordes. Mas, por uma questão burocrática, não foi desta vez. “Não foi possível registrar no Guinness porque teríamos que trazer 100 observadores, com o estado arcando com todos os custos. É uma judiação, porque é realmente um recorde mundial”, afirma o secretário de Meio Ambiente, Luiz Eduardo Cheida. Segundo ele, no ano passado o replantio de 1 milhão de mudas no Dia da Água, 22 de março, já foi destaque internacional.

Para celebrar a Semana da Árvore, sua secretaria mobilizou todos os 399 municípios do Paraná para tentar recuperar a vegetação das margens dos rios do estado com 64 espécies nativas, entre elas capixingui, bracatinga-de-campo-mourão, canafístula, aroeira, açoita-cavalo, araçá e pitanga, além da árvore-símbolo local, a araucária. Para cobrir o estado com tantas mudas em tão pouco tempo, a Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) selecionou as propriedades que têm suas áreas cortadas por rios importantes para a região e se comprometeu a prestar assistência técnica aos produtores rurais. Segundo o governo, o crescimento saudável das mudas vai ser garantido por esse acompanhamento e pela fiscalização do Instituto Ambiental do Paraná (IAP). “A intenção foi escolher as propriedades seguindo a idéia da formação de conectividade de remanescentes florestais nos municípios”, explica a coordenadora do Programa Mata Ciliar, Ângela Carvalho.

As mudas repassadas aos proprietários vêm dos 22 viveiros do IAP, que têm capacidade de produção estimada em até 1 milhão de mudas por ano, e dos cerca de 550 viveiros implantados nos municípios e junto a entidades parceiras do programa, que podem cultivar 100 mil mudas por ano. “Recebemos 10 mil mudas e estamos dando apoio aos 12 proprietários cadastrados pela Emater”, diz Luciana Garcia, bióloga da Secretaria de Meio Ambiente de Prudentópolis. Ela conta que, apesar do tempo ruim no interior do Paraná, as atividades da Semana da Árvore transcorreram bem, com uma diferença fundamental em relação ao plantio da Semana da Água de 2004: este ano, vai ter monitoramento. “Não adianta fazer “oba-oba” e desaparecer. Como muitas mudas do ano passado não vingaram, replantamos nos mesmos lugares para reforçar, e a Emater nos orientou a isolar as áreas para a criação de animais não comprometer o crescimento das mudas”, diz Luciana.

O secretário Cheida esclarece que o esforço concentrado para recompor a mata ciliar do estado não é apenas uma jogada de marketing associada à Semana da Árvore. Ele diz que a data comemorativa é apenas uma chance de dar visibilidade à causa. “A produção e o plantio são feitos no dia-a-dia. O que aconteceu nesta semana foi a oportunidade de comemoração e sensibilização”. Cheida estima que 35 mil produtores estejam ajudando na recomposição da mata ciliar e garante que a adesão é crescente. “O importante é plantar e mudar a cultura. Há um tempo atrás o próprio governo incentivava o desmatamento até a borda dos rios. Quanto mais o proprietário desmatava, mais ele era respeitado”, conta.

Esse pensamento não parece ter mudado e é justamente por constatar a continuidade do desmatamento desenfreado no Paraná que organizações ambientalistas têm críticas a essa estratégia do governo estadual. Clovis Borges, diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), concorda que o programa de restauração da mata ciliar pode ter bons resultados, mas acha importante discutir até que ponto o governo está sendo eficiente na conservação da biodiversidade. “Por mais que seja simpático recuperar áreas degradadas, a troca entre perder as poucas áreas naturais que ainda existem e investir no plantio de uma floresta que só vai crescer daqui a dezenas de anos não se justifica”, opina. “O slogan dessa gestão é plantar 90 milhões de árvores, mas isso não vai recuperar a biodiversidade perdida nos desmatamentos. A restauração depende da existência de áreas bem conservadas”. Clóvis lembra que, se o ritmo da devastação continuar como está, os corredores ecológicos que o estado quer montar com o replantio das mudas vai ligar nada a coisa nenhuma.

Cheida se defende e diz que o governo não deixou de fazer proteção do que resta para plantar árvores. “Este é apenas um dos programas do estado. Além do Mata Ciliar, há outro chamado Paraná Biodiversidade, que estimula a proteção dos fragmentos que existem numa área superior a 2 milhões de hectares”, rebate o secretário. Ele afirma que estão sendo executadas cerca de dez ações importantes para preservar os remanescentes de araucária no estado. Mas elas não têm tanto apelo quanto fazer mutirões para plantio em semanas comemorativas como a da árvore.

  • Andreia Fanzeres

    Jornalista de ((o))eco de 2005 a 2011. Coordena o Programa de Direitos Indígenas, Política Indigenista e Informação à Sociedade da OPAN.

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