Reportagens

Líqüido e certo

Cada vez mais empresas investem em tecnologias para economizar e reutilizar água. Além do benefício ambiental, a prática rende dinheiro e ajuda o marketing.

Aline Ribeiro ·
28 de setembro de 2005 · 19 anos atrás

A presença de água potável em abundância no planeta pode acabar em vinte anos. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), em 2025 dois terços da população do planeta – cerca de 5,5 bilhões de pessoas – viverão em locais sujeitos a algum tipo de problema relacionado à água. Alarmismo à parte, o fato é que a iminente escassez dos recursos hídricos no mundo já faz a cabeça dos empresários.
Ao se darem conta dos prejuízos que a falta d’ água pode acarretar – ou simplesmente para cortar gastos e ainda sair bem na foto – várias empresas brasileiras estão tomando providências eficazes na redução do consumo.

O Hopi Hari, maior parque temático da América Latina, é um modelo de sucesso. Localizado ao lado de Vinhedo, noroeste do estado de São Paulo, o parque tem um sistema de tratamento de efluentes desenvolvido com tecnologia canadense, e toda água usada é tratada e reutilizada para fins sanitários, lavagem de pátios e irrigação dos jardins. A água vem de três poços profundos, com capacidade diária de armazenamento de 400, 600 e 700 metros cúbicos cada um. Após o uso, é represada num circuito fechado e passa por filtros especiais para a eliminação de resíduos, onde também recebe produtos químicos como cloro, cal, soda cáustica, sulfato de alumínio e cloreto férrico. Cerca de 300 metros cúbicos de água são reaproveitados diariamente.

“O fluxo é contínuo. A água não passa por um processo de decantação, por exemplo. Conforme é utilizada e jogada nos esgotos, já vai sendo purificada”, explica o operador da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) do Hopi Hari, Rogério Almeida Cardoso. Para não deixar nenhuma dúvida sobre a qualidade do serviço, a água é testada semanalmente num laboratório do parque. O sistema é a base do Estudo de Impacto Ambiental (Eia Rima) do Hopi Hari, aprovado pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema).

O mesmo processo já rendeu bons frutos à empresa de cosméticos Natura, em sua fábrica localizada na via Anhangüera, em Cajamar (SP). O sistema de uso racional da água permitiu ao grupo uma economia significativa, mesmo num ano em que a produção aumentou consideravelmente. Em 2004, a companhia conseguiu reduzir em 28% o consumo de água por unidade vendida. O consumo era de 0,87 litros por produto em 2003, e no ano passado foi de 0,67 litros. E a intenção é enxugar esses números ainda mais. A meta da empresa é aumentar a taxa de reutilização da água tratada de 39,5% para 49% até o final deste ano.

A Café Iguaçu, uma das maiores do país neste segmento, é outra empresa que atingiu bons índices de economia com o sistema de reuso da água. Nos últimos três anos, diminuiu em 19% o consumo na sua unidade de Cornélio Procópio (PR), um volume equivalente ao de 300 piscinas olímpicas. “Nosso consumo já é menor do que o das fábricas de café solúvel de regiões áridas da Europa, onde a água é escassa e cara”, ressalta Alexandre César Frasson, coordenador de Meio Ambiente da Café Iguaçu.

Cada vez mais, shopping centers, condomínios residenciais, indústrias, bancos e estabelecimentos comerciais têm mostrado preocupação com a economia de água. O interesse faz surgir consultorias especializadas na implantação de programas de uso racional. Em São Paulo, a H2C, que atua há sete anos no setor, já atendeu cerca de 200 clientes e tem experiências bem-sucedidas para contar. Uma das mais recentes foi a do hospital Albert Einstein, que permitiu a economia de 20 milhões de litros em um ano e barateou a conta de água em 270 mil reais. “Utilizamos tecnologia de ponta em equipamentos hidráulicos e sanitários. Em seis meses, o hospital teve retorno de todo o investimento que fez”, conta o diretor comercial da H2C, Paulo da Costa.

O hospital gastava muito com água e enfrentava entupimentos na canalização. O trabalho de consultoria baseou-se num diagnóstico inicial, com a instalação de um hidrômetro – um medidor de vazão – na linha de alimentação de água e um contador de ciclos na válvula de descarga de um apartamento do hospital. Após 20 dias de observação, foram constatados 402 acionamentos da descarga. Cada acionamento consumia 25 litros de água.

A H2C propôs a troca das bacias sanitárias do hospital, que tinham capacidade para 18 litros de água, por outras de 6 litros. Após 30 dias de observação, o número de acionamentos da descarga subiu para 600, mas o consumo por acionamento caiu quase pela metade, para 13 litros. Em seguida, os técnicos da empresa regularam a válvula de descarga e constataram, em igual período, que o consumo havia baixado para 7 litros por acionamento. “A importância do programa de uso racional da água transcende os ganhos econômicos e financeiros. Temos de ter consciência de que nossos netos poderão desfrutar no futuro de bens naturais não-renováveis, como a água”, destaca o consultor Paulo da Costa.

A empresa Owens-Illinois, especializada em vidros, teve uma experiência tão bem-sucedida quanto o Albert Einstein. Atendida pela consultoria EcoAqua Soluções, conseguiu reduzir em 50% o consumo de água no ano passado. “Utilizamos nesta empresa um sistema de circuito fechado com descarte zero, que trata 100% dos efluentes. De forma ecologicamente correta, preservamos este bem tão precioso e ainda evitamos o encarecimento do produto no futuro”, ressalta Vlamir Paes, presidente da EcoAqua.

Leia também

Reportagens
25 de novembro de 2024

Brasil quer colocar Oceano em destaque no Tratado de Plásticos

Países se reúnem a partir desta segunda-feira para última rodada de negociações do acordo para combater a poluição plástica no planeta

Podcast
24 de novembro de 2024

Entrando no Clima #42 | Texto final da COP 29 frustra em todos os pontos

A 29ª Conferência do Clima chegou ao seu último dia, sem vislumbres de que ela vai, de fato, acabar.

Podcast
22 de novembro de 2024

Entrando no Clima#41 – COP29: O jogo só acaba quando termina

A 29ª Conferência do Clima chegou ao seu último dia, sem vislumbres de que ela vai, de fato, acabar.

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.