A uma semana do início do verão, 25% das praias de Santa Catarina estão com a balneabilidade comprometida. O quadro é resultado das precárias condições do saneamento básico no estado e representa uma séria ameaça a paraísos naturais.
A poluição já chegou a locais como a Guarda do Embaú, na região metropolitana de Florianópolis e uma das praias mais procuradas por turistas e surfistas. Conhecida pela paisagem e natureza intacta dos morros que a cercam, a Guarda sofre com a poluição do rio da Madre, que dá acesso à areia.
A poluição causada pela falta de saneamento também começa a ameaçar a Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, localizada a 11 quilômetros da costa de Florianópolis e composta pelas ilhas Arvoredo, Deserta, Galés e Calhau de São Pedro. No total, a reserva detém 17,8 mil hectares que servem de abrigo para tartarugas marinhas, garoupas, lagostas, algas, esponjas amarelas, gorgônias, arraia-prego, moréias, golfinhos, tubarões e até pingüins no inverno.
Com 80% de sua área coberta de Mata Atlântica, o Arvoredo abriga ainda bem-te-vis, tico-ticos e sabiás de coleira e serve de refúgio para aves e espécies migratórias. A presença do homem só é permitida pelo IBAMA para estudos científicos e atividades de mergulho, que foram liberadas em 2004 em áreas específicas determinadas pelo plano de manejo.
Mas apesar de todo cuidado para manter a área livre do poder de degradação humano, o esgoto lançado ao mar chegou lá. O coordenador da reserva, Mário Luiz Martins Pereira, revela que um laudo feito pelo IBAMA em outubro constatou a presença de coliformes fecais dentro da unidade de conservação. “Não é nada alarmante ainda, mas nos preocupa demais pela riqueza de fauna e vida marinha que possuímos ”, confessa, sem revelar os níveis de contaminação detectados. “O que representa maior risco para o Arvoredo é a falta de saneamento, principalmente da bacia do Rio Tijucas e Baía Norte de Florianópolis, onde a contaminação é muito elevada”, diz.
Segundo relatório do órgão estadual de meio ambiente, a FATMA, divulgado no último dia 8 e referente ao mês de novembro, dos 182 pontos coletados no litoral, 45 apontam poluição. No laudo anterior, divulgado dia 17 de novembro e referente às análises coletadas em outubro e na primeira semana do mês, 31 praias eram consideradas inaptas.
A gerente do laboratório de balneabilidade da FATMA, Eliana Andrade, concorda com Mário Luiz e explica que no verão o problema de falta de tratamento de esgoto torna a situação ainda mais perigosa. O número de pessoas no litoral praticamente dobra e quem sofre as conseqüências acaba sendo o meio ambiente. Como boa parte do esgoto produzido na costa é lançada diretamente ao mar, a reserva e a vida marinha ficam expostas a poluição. Segundo os técnicos do laboratório, o aumento de áreas impróprias antes de começar a alta temporada foi causado pelo excesso de chuvas do mês de novembro, que levou as águas dos morros aos rios e, em conseqüência, ao mar.
Os índices de saneamento básico em Santa Catarina podem ser comparados ao de países como o Iraque, como retratou o relatório anual do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), divulgado no dia 18 de novembro. Em Santa Catarina apenas 13% da população urbana tem coleta e tratamento de esgoto. Em grandes cidades, como Palhoça, que conta com mais de 150 mil habitantes, o esgoto não atende a 3% da população e sequer um prédio público tem acesso à rede de tratamento. O estado conta com um dos piores índices do Brasil e é inferior ao quadro verificado em países como Paraguai e México. “Esgoto não dá voto, obra de saneamento não aparece e por isso assistimos há décadas de descaso das autoridades locais com o saneamento básico”, desabafa o engenheiro ambiental Maurício Teixeira. “Em nível federal, os investimentos até que aumentaram em Santa Catarina, mas é preciso muitos anos para reverter o quadro de descaso e evitar um desastre”, diz.
A análise do engenheiro é comprovada pelos fatos. Até mesmo a CASAN (Companhia de Saneamento de Santa Catarina) sofreu uma auditoria do Tribunal de Contas durante o ano de 2003 por despejar material de uma estação de tratamento de esgoto diretamente na Baía Norte, no centro de Florianópolis. Em janeiro de 2004, a Companhia foi notificada para que em trinta dias regularizasse a sua estação de tratamento. O prazo foi prorrogado para 60 dias e só então o problema foi resolvido parcialmente. Mesmo assim, quem caminha pela beira-mar da capital pode notar, em meio às placas de “Local Impróprio para Banho”, o esgoto correndo livremente para a água.
*Fabrício Escandiuzzi é jornalista em Santa Catarina e bacharel em Direito.
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