Reportagens

Aula magna

Prefeito do Rio convoca secretariado para um aulão de Sergio Besserman sobre aquecimento global e lança protocolo de intenções para reduzir emissões de gases de efeito estufa.

Andreia Fanzeres ·
14 de fevereiro de 2007 · 19 anos atrás

Todos os secretários municipais do Rio de Janeiro, alguns vereadores, deputados e o prefeito acordaram cedo nesta quarta-feira para uma aula sobre aquecimento global no Planetário da Gávea. A palestra, proferida por Sérgio Besserman, diretor de informações geográficas do Instituto Pereira Passos, foi um primor em detalhes, rigor científico e linguagem clara para políticos de todas as espécies entenderem. Eles foram literalmente convidados a compreender a importância das mudanças climáticas e as consequências para a vida não só no Rio de Janeiro, mas em todo o planeta. Sorte de quem soube aproveitar a oportunidade.

No início da palestra, a sala estava lotada. E o prefeito visivelmente interessado pelas explicações do especialista. Houve quem colocasse óculos escuros para disfarçar o cochilo e quem conversasse paralelamente, mas diante dos dados apresentados de forma enfática por Besserman não havia como não prestar atenção. Ou pelo menos fingir. Mas foi a palestra terminar e o tempo para perguntas se abrir que metade da platéia saiu.

Apesar de ter um enorme conhecimento sobre a cidade do Rio de Janeiro, Besserman preferiu conduzir a palestra de maneira mais ampla. Explicou o fenômeno do aquecimento global da escala molecular à mundial, fez um histórico das emissões desde a revolução industrial, apresentando o crescimento avassalador de mais gases na atmosfera, detalhou os estudos científicos, as previões otimistas e pessimistas quanto aumento da temperatura e do nível dos oceanos, relacionou padrões de consumo internacionais com a capacidade do planeta de suportar tais impactos, falou das dificuldades cada vez mais próximas de sobrevivência e de aproveitamento econômico em lugares como a Amazônia e a região Nordeste do Brasil, as consequências sociais e finalmente a necessidade de conscientização da população para mudanças de comportamento efetivas, diante dessa nova realidade que todos devemos enfrentar.

Talvez tenha sido realmente difícil fazer uma conexão direta entre tudo isso e a gestão da cidade do Rio de Janeiro. Tanto que, fora os comentários que não diziam rigorosamente nada, algumas idéias de minimização dos impactos do aquecimento recaíram sobre medidas ambientalmente básicas para o município, como mais investimentos na regeneração de encostas na expectativa de tempestades mais intensas daqui para frente. Ou a recuperação dos corpos hídricos, que ficarão ainda mais ameaçados com o aumento da temperatura no planeta. Em momentos assim, César Maia interferia. “Lembrem-se que isso não é reunião sobre meio ambiente. É sobre aquecimento global”.

Na prática

A frase mostra que o próprio prefeito ainda está um pouco confuso sobre o que o espera. A decisão de fazer o aquecimento da Terra o tema principal da reunião de início de ano com seus secretários veio depois de uma viagem recente à Europa. Ele se disse impressionado com o impacto que esse assunto e a divulgação do relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) causaram na população mundial. Decidiu, então, mudar o teor da reunião ás pressas e “dar um passo a frente” com a elaboração de um Protocolo de Intenções que compromete a prefeitura do Rio com uma série de ações para reduzir as emissões de gases danosos à atmosfera.

“Nós vivemos de opinião pública. Pela primeira vez ouço as pessoas tratarem desse assunto”, disse o prefeito a O Eco. As propostas mais relevantes, idealizadas com ajuda do próprio Besserman e aprovadas pelo prefeito César Maia, referem-se à implementação de um programa de educação ambiental sobre aquecimento global na rede escolar, ampliação de 12.500 para 25 mil árvores plantadas anualmente em ruas, praças e parques urbanos, criação de uma “usina verde” para aproveitar resíduos de poda, estruturação de corredores de ônibus, com integração a trens e metrô sem sobreposição de linhas para reduzir o número de veículos nas vias, além do plantio de 1,2 milhões de mudas de Mata Atlântica por ano no município.

Para Besserman, aumentar a cobertura florestal do Rio de Janeiro não significa necessariamente esverdear áreas já favelizadas, embora seja sempre importante cuidar para que cada vez menos as florestas dêem lugar às construções irregulares. “Nossa intenção é focalizar as ações nas áreas de pressão demográfica mais recentes, como na zona oeste da cidade. O entorno do Parque Estadual da Pedra Branca está entre as prioridades de recuperação florestal”, explicou.

Discutir aquecimento global durante as comemorações do bicentenário da chegada de Dom João VI ao Brasil, no ano que vem, e instituir o “dia carioca de mobilização contra o aquecimento global” também constam da lista de intenções do protocolo. Mas, como gosta o “prefeito do Pan-americano”, a medida politicamente mais impactante é fazer do Rio de Janeiro a cidade candidata a sediar a 15ª Conferência das Partes da Convenção Quadro sobre Mudança Global do Clima da ONU, em 2009. César Maia informou que quer encaminhar essa sugestão nos próximos dias para o governo federal. E vai enviar até sexta-feira, dia 16 de fevereiro, uma cópia do protocolo ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para que “tome conhecimento das ações e possa estimular outras cidades a fazerem o mesmo”.

  • Andreia Fanzeres

    Jornalista. Coordena o Programa de Direitos Indígenas, Política Indigenista e Informação à Sociedade da OPAN.

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