Reportagens

Da noite para o dia

Cigarrinhas invadem o estado do Rio de Janeiro e instigam a curiosidade de muitos. Quem são estes pequenos insetos e por que se multiplicaram tão rapidamente no último mês?

Felipe Lobo ·
27 de março de 2007 · 18 anos atrás

No fim do verão, um inseto milimétrico, de corpo verde e asas transparentes invadiu os lares cariocas. Ele aparece à noite, aos bandos, atraído por luzes. É vulgarmente chamado de cigarrinha, mas não é da família das cigarras, nem canta como elas. O máximo que faz é fisgar a pele humana achando que se trata de um tipo exótico de planta.

O inseto é uma novidade na cidade. Pesquisadores acreditam que sua súbita aparição esteja relacionada à estiagem que padeceu sobre o Rio de Janeiro durante quase todo o mês de março. Segundo estudos feitos pela entomóloga Lucí Coelho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é provável que a espécie seja a Balclutha hebe, que reúne cigarrinhas verdes com uma média de 3,5mm e se hospedam em arbustos de pequeno e médio porte. “Acredito que, com a estiagem e conseqüente aumento da temperatura, o ciclo de desenvolvimento foi acelerado, passando os jovens a adultos mais rapidamente. Desta forma, os adultos migram à procura de vegetação menos seca”, afirma Coelho.

As cigarrinhas estão longe de se resumirem às Balclutha hebe. Há aproximadamente 21 mil espécies entre 2mm e 30 mm catalogadas ao redor do mundo. O Brasil possui uma das maiores quantidades do planeta graças às suas florestas tropicais, onde elas encontram grande variedade de plantas para lhe servirem de alimento. Há gosto para tudo. “O tipo de alimentação varia conforme a espécie. De acordo com Gabriel Mejdalani, entomologista pesquisador do Museu Nacional, o minúsculo inseto pode se alimentar de nutrientes presentes nas seivas bruta e elaborada, encontradas nos tecidos vasculares dos vegetais.

As cigarrinhas vivem em quase todas as regiões da Terra que têm plantas – recurso que serve não só de alimento, mas de berçário seguro para os ovos. De acordo com o professor Mejdalani, como elas alimentam-se apenas de líquidos vegetais, não oferecem risco à saúde humana. Já às plantas…Estima-se que uma dúzia de espécies de cigarrinhas sirva de vetor para uma doença conhecida como CVC (Clorose Variegada dos Citros), que entope os alguns vasos de plantas cítricas como laranjas e tangerinas e os impedem de reter água do solo para fotossíntese. Além disso, existem outras pragas transmitidas por esses insetos que atacam plantações de algodão, cana-de-açúcar, café e tabaco.

A sorte é que as cigarrinhas não são exímias voadoras. Elas se deslocam por distâncias muito curtas e ficam em plantas próximas umas das outras. Às vezes, um arbusto pode estar ocupado por cigarrinhas de diferentes espécies que possuem colorações diversas. Ali elas se comunicam através de um processo conhecido como estridulação, um conjunto de vibrações emitido por estruturas do abdomen do inseto, transmitido pelo substrato da planta em que estão hospedadas, e pode ser percebido por outros indivíduos encontrados no mesmo lugar. Mas levar a vida em uma folha não é sempre tão simples. “As cigarrinhas são importantes porque costumam ser abundantes e são presas de vários animais, como os pequenos lagartos, aves, aranhas e outros insetos.”, diz o entomologista Márcio Felix, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz, que reforça a importãncia do inseto até desconhecido da sociedade para o equilíbrio ambiental das florestas da cidade.

  • Felipe Lobo

    Sócio da Na Boca do Lobo, especialista em comunicação, sustentabilidade e mudanças climáticas, e criador da exposição O Dia Seguinte

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