O Serviço Florestal Brasileiro (SFB), órgão do Ministério do Meio Ambiente criado em 2006 para gerir o manejo florestal em terras públicas, enviou nesta quarta-feira o seu primeiro relatório de atividades ao Congresso Nacional. A prestação de contas, uma obrigação prevista na lei de gestão de florestas públicas (11.284/2006), é ainda um balanço do aparato de normas e regras que vão ser necessárias para as concessões de exploração à iniciativa privada. Resultados efetivos do uso econômico de áreas florestadas do governo devem aparecer só este ano.
Organizações não governamentais e empresários do setor florestal avaliam que em seu primeiro ano de atuação o SFB fez avanços que permitirão que algumas licitações ocorram em 2007. Existem, contudo, dúvidas sobre a qualidade dessas concessões. A principal questão diz respeito a regularização fundiária das terras que serão outorgadas para exploração. No relatório do SFB, as áreas que já estão melhor definidas para serem licitadas são aquelas que se encontram a 100 km das margens da rodovia BR 163 (Cuiabá-Santarém). Ali, já foram definidos 14 polígonos cujas concessões devem sair até outubro deste ano, segundo o diretor-geral do SFB, Tasso Azevedo.
O principal avanço das atividades do SFB foi detalhar nesta região o quê é passível de concessão e quais terras estão regularizadas. Não é tarefa fácil: o próprio relatório admite que dos 22 milhões de hectares estudados nas bordas da BR -163 em Mato Grosso, 64% não tinham informações sobre titularidade de terra. “Esse é o tipo de coisa que pode complicar as concessões”, analisa o pesquisador Paulo Barreto, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Segundo ele, só será possível ter concessões seguras quando o trabalho de “discriminação” estiver pronto. Ou seja, quando levantamentos no campo comprovarem que o processo de licitação não vai gerar conflitos.
Segundo Tasso, os estudos na área estão sendo conduzidos com perspectivas de que os polígonos sejam licenciados em junho, o que permitirá concessões em setembro. O relatório do SFB já identificou áreas de garimpo e de extração madeireira na área de influência da BR-163. Os polígonos em que se planejam as concessões somam cerca de 1,5 milhão de hectares, a mineração está presente 1,7% deste total; a madeira, em 0,2%. Embora dados mostrem que o desmatamento atinge 2,8% das áreas, a pressão humana terá que ser melhor detalhada, com identificação de posseiros e checagem de títulos com o INCRA.
O presidente do Fórum Brasileiro da Indústria de Base Florestal, Fernando Castanheira, afirma que o setor privado tem muita desconfiança quanto à viabilidade das concessões florestais exatamente por conta dos problemas fundiários. Segundo ele, os trâmites para regularizar terras públicas na Amazônia pararam o setor, pois planos de manejo não estão sendo aprovados durante este processo de legalização. “É difícil analisar a atuação do Serviço Florestal porque tudo ficou parado neste primeiro ano”, reclama. Ainda assim ele alerta que o setor está buscando brechas para atuar. O mercado de madeira tropical, predominantemente abastecido com espécies amazônicas, cresceu 15% em 2006, informa Castanheira.
A birra do setor privado se deve à transição que o SFB promoveu nos contratos de plano de manejo que estavam sendo feitos em áreas públicas. A revisão dos contratos está agora nas mãos do Ibama e do INCRA. Ao todo são 34, a maioria no Pará. Segundo o diretor-geral Tasso Azevedo, após o dia 30 de abril, quando terminam as chuvas e começa a temporada de corte, espera-se que todos estejam regularizados.
Florestas Nacionais
Umas das questões que deve facilitar a aprovação de concessões ainda em 2007 é a utilização de Florestas Nacionais (Flonas) com planos de manejo já aprovados. Os planos, em tese, definem as áreas que podem ser exploradas e quais devem ser preservadas, além de identificar pendências fundiárias nas unidades de conservação. O SFB apresentou em seu relatório mapas sobre as áreas que estão sendo trabalhadas. De acordo com o documento, a Floresta Nacional Jamari, em Rondônia é prioritária para a implementação de concessões ainda este ano. Assevedo cita ainda a Flona Jamanxin, na zona do Distrito Florestal da BR-163, e a Flona Saracá-Taquera, em Oriximiná (PA) como áreas com potencial concessão no curto prazo.
Outra atividade apontada como avanço em direção à exploração comercial das flonas é o apoio do SFB à elaboração dos planos de manejo de unidades na Amazônia. Tratam-se de oito áreas, todas no Pará, que juntas somam 4,5 milhões de hectares. O coordenador de Florestas na Campanha Amazônia do Greenpeace, Marcelo Marchesini, observa que uma das medidas importantes que ainda terá que ser tomada é a formação do cadastro nacional de florestas públicas, algo que permitirá ter informações mais detalhadas sobre as áreas a serem concedidas. Ele afirma que o Conselho de Gestão de Florestas Públicas (CGFLOP), uma das principais ações do SFB em 2006, tem trabalhado com transparência sobre estes pontos, mais é preciso esclarecer como será feita a destinanação prioritária a pequenas comunidades nas concessões. “É muito grande o número de normas que são necessárias para uma concessão ocorrer”, diz Marchesini, que tem participado do CGFLOP.
Um dos pontos do relatório do SFB em 2006 é considerado pelas ONGs uma vitória: as resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que normatizam a divisão de responsabilidades entre o governo federal e os estados na Gestão Florestal. Depois de pressionada por ambientalistas da sociedade civil, o Ministério do Meio Ambiente criou regras de como devem ser feitos os licenciamentos de desmatamento e concessão de exploração florestal. O relatório de atividades aponta os estados do Pará, do Acre, do Amazonas e do Amapá como exemplos de que a gestão florestal está criando estruturas locais e aos poucos saindo das mãos do governo federal. A maior independência dos estados na gestão das florestas públicas é uma aposta tão arriscada quanto a entrega de áreas para exploração pelo setor privado. Mas a equipe de Marina Silva está confiante de que o risco é necessário para se colocar ordem no mato.
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