Na bagagem que o professor Emílio Lèbre La Rovere, do Centro de Estudos Integrados sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (Centro Clima) da Coppe-UFRJ, levou para Bali há mais do que roupas e acessórios pessoais. Durante o evento, que teve início nessa segunda-feira e conta com representantes de mais de 190 nações para discutir medidas de combate ao aquecimento global a partir de 2012, ele vai distribuir cópias do Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Estado do Rio de Janeiro. Encomendado pela Secretaria do Ambiente e produzido sob a coordenação de La Rovere, o estudo acaba de ser concluído e é o primeiro nesses moldes realizado no país.
Antes da Indonésia, porém, os resultados do trabalho foram divulgados na sede da Secretaria de Ambiente do Estado do Rio de Janeiro. De acordo com a Superintende de Mudanças Climáticas e Mercado de Carbono, Suzana Kahn Ribeiro, o inventário seguiu a metodologia proposta pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) e usou o princípio da responsabilidade das emissões. Isso significa, por exemplo, que o álcool produzido em território fluminense e exportado para São Paulo entra nos cálculos do consumidor.
Toda a pesquisa foi baseada em dados de 2005 e mostra números que impressionam. Apenas naquele ano foram lançadas para a atmosfera 65,7 milhões de toneladas do que os pesquisadores chamam de carbono equivalente. Nesse cálculo entram o dióxido de carbono (CO2), com 87% de responsabilidade, o metano (CH4), com 10% e o óxido nitroso (N2O), com apenas 3%. “Enquanto no Brasil cerca de 70% das emissões de gases estufa vêm do desmatamento, no Rio de Janeiro o setor industrial é o principal culpado”, diz Kahn.
Os dados comprovam que os processos de produção, usos de artefatos e gastos com energia nas indústrias são os grandes vilões do lançamento de gases estufa do Rio de Janeiro: 38% do total de carbono equivalente emitido têm sua origem dentro das usinas. Em segundo lugar aparece o transporte rodoviário, com 15%, seguido de perto por um empate técnico entre mudanças no uso do solo, residências e edificações e um intrigante item nomeado “outros”, que engloba desde agropecuária até esgotos domésticos e comerciais. Cada um tem 10% de culpa. Vale lembrar que esses dados são baseados nas emissões totais, mas o estudo também separou seus cálculos por cada gás estudado.
“As emissões per capta do Rio ainda são muito pequenas”, explica Kahn. Em comparação com a média nacional de 1994 (data do último inventário realizado no Brasil), por exemplo, os habitantes fluminenses ganham com larga vantagem a disputa de cidadãos mais ecologicamente corretos. Enquanto uma pessoa lançava, em meados na última década, 9,4 toneladas de carbono equivalente em todo o país, no Rio de Janeiro de 2005 não passava de 4,4. Mas a superintendente aproveita para fazer uma ressalva. “O potencial hidrelétrico do sudeste está chegando ao seu fim, e a tendência é que se use cada vez mais combustíveis fósseis. Se nada for feito para mudar essa situação, a expectativa é que a quantidade de emissão cresça muito”, analisa.
Promessas do governo
Mas a partir daí, o secretário de meio ambiente do estado do Rio, Carlos Minc, tentou amenizar as previsões para o futuro. Fez questão de anunciar que, com base nos dados do inventário, uma série de ações para diminuir as emissões do Rio estão tendo início. Mas não tocou em metas de redução de gases.
A primeira medida levantada para o setor de transportes foi a obrigatoriedade, já em 2007, de incorporar 5% de biodiesel ao diesel. “Maior do que a meta do restante do Brasil, que é de 2% e será implantada apenas em 2008”, garantiu. Além disso, confirmou para o dia 19 de dezembro a assinatura de um termo de compromisso entre o governo fluminense e a Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) que prevê a redução de 30 a 40% de suas emissões até 2012. Para isso, a Fetranspor prometeu plantar árvores e melhorar a eficiências dos motores e freios.
Já para o setor energético as metas são um pouco menos ambiciosas. Em dezembro, deve ser assinado um decreto para obrigar todas as novas indústrias que produzirem combustíveis fósseis a gerar um potencial de energia limpa. A relação é a seguinte: para cada 100 megawatts (MW) manufaturado a partir do gás, cinco MW de fontes renováveis deverão ser produzidos. O mesmo vale para o óleo e o carvão, mas a compensação cresce para 10% e 15% de energia limpa, respectivamente. “E ainda impedimos a construção de uma térmica a carvão da empresa Inepar em Itaguaí [cidade da região metropolitana]. Só aí foram cortadas nove milhões de toneladas de carbono que seriam lançadas anualmente pelo estado”, explica Minc.
As áreas de resíduos sólidos e edificações também mereceram comentários do secretário. Para a primeira ele prometeu que só vencem os próximos consórcios de obras de aterros sanitários as empresas que apresentarem projetos de armazenamento e aproveitamento do metano. Já no setor de construção, certas ações já estão em prática. Segundo o secretário, as edificações do governo estadual, por exemplo, já são intimadas a equipar os telhados com placas para captar luz solar e a comprar madeiras com certificação ambiental. “E, na área de mitigação, pretendemos plantar 20 milhões de árvores em quatro anos. Serão um milhão no Parque Fluvial de Guandu e outros oito milhões em Macacu, no Arco Metropolitano e no Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro)”, diz Minc. As outras 11 milhões vão entrar nos trâmites de concessões para obras.
Ele também garantiu que, a partir de meados de 2008, os critérios de licenciamento ambiental vão levar em conta os resultados deste e de mais dois outros estudos esperados para os próximos meses, também encomendados pelo governo: um sobre a vulneralibidade de recursos hídricos e outro sobre a Mata Atlântica. Até lá, resta acreditar no sonho Tio Sam de Minc. “Apesar de ser governada pelo ex-Exterminador do Futuro, Arnold Schwarzenegger, um republicano como o Bush, a Califórnia é pioneira na luta contra o aquecimento global em seu país. Queremos que o Rio de Janeiro seja para o Brasil o que ela é para os Estados Unidos”, sonha.
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