Os índices de poluição crescem nos invernos das regiões metropolitanas graças à inversão térmica. Esse fenômeno climático natural ganha força com a baixa umidade e com o frio, aprisionando poluentes mais perto do solo.
As medições diárias do Ceftru ocorrem em dois pontos da capital, nas asas Sul e Norte. São avaliadas as concentrações de poeira e de gases como NO2 (Dióxido de Nitrogênio) e SO2 (Dióxido de Enxofre). Novos pontos de teste são projetados pela UnB. O Instituto Brasília Ambiental – Ibram faz medições semanais em cinco pontos, quatro deles fora da região central. “Normalmente são ultrapassados os padrões regulares para qualidade do ar”, conta Leilane Lara Moreira, da Gerência de Monitoramento Ambiental do Ibram, ligado ao Governo do DF.
Segundo ela, se no central Plano Piloto e na cidade satélite de Taguatinga os veículos são os vilões, em regiões como a Fercal, fábricas de cimento e outras indústrias são as grandes poluidoras. “Elas lançam muito material particulado (poeira) no ar e há muitas estradas de terra, sem pavimentação”, comenta.
Frota do milhão
Apesar das vendas crescentes de veículos bicombustível (flex), Sete em cada dez carros da frota distrital bebem gasolina. Quando queimada, contribui para o aquecimento do planeta. Da frota, oito em cada dez são carros de passeio. O resultado são engarrafamentos irritantes nos horários de pico, maior consumo de combustíveis e poluição de sobra. “Em média, um carro com motor ligado e parado em um engarrafamento consome 750 ml de gasolina e libera 1,8 Kg de CO2 em uma hora, além de outros poluentes”, conta Silva, do Ceftru.
De tão dependente do transporte individual, o Distrito Federal tem até uma Cidade do Automóvel. O bairro sem moradores fica a poucos quilômetros de Brasília, na rodovia que dá acesso à Taguatinga, e foi construído especialmente para alojar quase duas centenas de revendas de automóveis novos e usados. Sucesso absoluto para quem foge dos ônibus velhos e lotados.
Melhorias tecnológicas, programas e normativas federais ajudam a regular a poluição veicular no Distrito Federal e outras cidades brasileiras. No entanto, se a frota seguir crescendo, manter a qualidade do ar que adentra os pulmões da população será quase impossível. Um estudo feito em 2007 pela Universidade de São Paulo mostrou que Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte, São Paulo e Recife estão acima dos padrões mundiais para poluição do ar. Brasília, por enquanto, ficou fora da lista. “Mas podemos chegar a um horizonte onde a quantidade de veículos será tão grande que dificilmente se manterá a poluição dentro do aceitável”, avalia o químico formado pela UnB.
A situação se complica no DF pela falta de inspeções veiculares para controle da poluição, como pedem normativas federais. De acordo com Leilane Moreira, do Ibram/DF, o governo distrital publicará em breve um edital para contratação de uma empresa especializada nesse tipo de serviço. As medições devem começar em meados de 2009. “A inspeção pode levar os motoristas a se adequarem às regras e poluir menos”, comenta.
Uma das primeiras medidas anunciadas pelo novo ministro do Meio Ambiente Carlos Minc foi a revisão, para baixo, dos parâmetros nacionais de poluição atmosférica. Chamando os índices brasileiros de “frouxos”, prometeu alterar resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama e reduzir os limites para emissões.
Outro problema, pouco lembrado, é a barulheira provocada pelo trânsito urbano. Segundo Silva, do Ceftru/UnB, várias medições na região central de Brasília apontaram entre 70 e 75 decibéis de ruído, níveis dignos de zonas industriais. Zonas urbanas e comerciais devem apresentar entre 50 e 60 decibéis de poluição sonora. “O tipo de pavimento, o modo de dirigir e o tipo de motor contribuem para esse problema”, diz.
Ataque à saúde
Barulho e poluição excessivas atacam diretamente o bem estar e a saúde de motoristas e pedestres. Além de provocar estresse, respirar ou entrar em contato com ar sujo pode causar tosse seca, cansaço, ardência nos olhos, nariz e garganta e dores de cabeça. Exposições contínuas à poluição veicular são vistas como causadoras de doenças gástricas, cardiovasculares e cânceres. “A irritação e o estresse prolongados podem levar a efeitos físicos. É preciso se adaptar à situação, fugir das ruas congestionadas e buscar vias alternativas, mesmo que o percurso seja um pouco maior”, recomenda a psicóloga Raquel Almqvist, da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego – Abramet.
Até mesmo níveis regulares de poluição podem prejudicar grupos mais sensíveis, como crianças, idosos e pessoas com doenças respiratórias e cardíacas. Além disso, o vento carrega a poluição dos aglomerados urbanos a outros pontos, como zonas rurais. “Áreas próximas podem sofrer com a poluição da capital”, afirma Silva, do Ceftru/UnB.
Dos escapamentos dos veículos sai um verdadeiro coquetel de poluentes. Além de partículas em suspensão (poeiras) e fumaças, há gases como Dióxido de Enxofre (SO2), Dióxido de Nitrogênio (NO2), Monóxido de Carbono (CO) e Ozônio (O3). Essas substâncias podem provocar chuva ácida, corrosão em construções e monumentos, prejuízos a colheitas, contaminar o solo e são vistas como agentes de doenças como asma e bronquite. “O coquetel de poluentes que exala dos escapamentos prejudica a saúde humana e do meio ambiente”, diz Almqvist.
Enquanto capitais como Londres (Inglaterra) e Paris (França) apostam em pedágios urbanos, bicicletas e transporte público para desentupir ruas e avenidas, o Distrito Federal amarga décadas de atraso em planejamento e ação estatal. Recentemente o governo distrital lançou um plano bilionário para desafogar o trânsito regional. “Devemos prestar atenção e agir agora (contra a poluição) para evitar problemas ainda maiores no futuro”, ressalta Silva, do Ceftru.
Dica de leitura – Apocalipse Motorizado – A tirania do automóvel em um planeta poluído (Editora Conrad, 160 pp). Série de artigos organizada por Ned Ludd. Baixe aqui.
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