O combate ao desmatamento não é apenas uma guerra contra grileiros, pecuaristas e madeireiros ilegais. É também uma luta contra a falta de informação. Isso ficou claro nesta quarta-feira (dia 10) com o lançamento, em Londres, do primeiro relatório do projeto Forest Footprint Disclosure (Divulgação da Pegada Florestal, em tradução livre).
Lista completa das empresas brasileiras que não forneceram informações sobre pegada.
*ArreBeef, *Bertin, *Caramuru, *Coamo, *Companhia Brasileira de Açucar e Álcool, *Copersucar, *Cosan, *Crystalsev, |
Questionadas sobre a origem das commodities agrícolas que consomem, apenas 35 de 217 grandes multinacionais se dispuseram a abrir o jogo. Entre as empresas, as companhias brasileiras de agronegócio também não forneceram informação.
Liderado por um grupo de organizações britânicas, o Forest Footprint Disclosure busca clarear a teia de relações comerciais que levam ao desmatamento de florestas tropicais. Para isso, enviou um questionário para as empresas consideradas as maiores dos setores de madeira, soja, carne, óleo de palma e biocombustíveis. As perguntas concentram-se sobre as práticas ambientais e o nível de conhecimento da cadeia de fornecedores .
Grandes marcas, como Nestlé, Univeler, Adidas, Nike, L´Oreal, Carrefour e Stora Enso destacaram-se por informarem a origem de seu suprimento. No entanto, muitas outras recusaram-se a responder, entre elas o Grupo Danone, da França, a Johnson &Johnson, nos EUA, e a britânica Shell. Nenhuma empresa brasileira se recusou expressamente a responder. Mas entre os maiores do mundo no setor agrícola, grupos como André Maggi, Bertin, Marfrig, JBS e Copersucar simplesmente não retornaram os pedidos de informação. A Fibria, do setor de papel e celulose, e a Independência, do setor pecuário, foram as únicas a fornecerem dados.
“O silêncio das empresas é preocupante”, avaliou a conselheira técnica do projeto, Liz Crosbie. Segundo ela, o que se observou como padrão nas respostas é que as empresas européias foram as mais engajadas em participar do projeto. Uma explicação possível seria a força da sociedade civil em pressionar as companhias por bom desempenho ambiental. Ela avalia que a mudança para um consumo mais sustentável de commodities é bastante devagar. “Nenhuma das empresas relatou ter 100% de informações sobre sua pegada florestal”, conta.
Entre as conclusões do relatório do Forest Footprint Disclosure é que de fato há muito jogo de aparências quando grandes empresas falam de ‘sustentabilidade’. “Diversas grandes empresas que gastam pesado em fazer merketing de seus produtos “ecologicamente corretos” não mostram qualquer comprometimento com sustentabilidade em seu consumo”, lê-se em um dos trechos destaque.
O presidente do comitê gestor do projeto, Andrew Mitchell, julga que a noção de pegada florestal ainda tem que amadurecer dentro das empresas. Talvez isso explique o baixo nível de respostas aos questionários. “É um processo educacional. Muitas destas empresas nem sabem o que pegada florestal quer dizer”, comenta.
Certificação e incentivo
A pecuária e a indústria da carne no Brasil foram um dos principais destaques deste primeiro relatório do Forest Footprint Disclosure. Isso porque não há no mundo um setor que tenha tanto impacto direto sobre as florestas tropicais como é o caso da produção bovina na Amazônia brasileira.
Além disso, as empresas brasileiras, como JBS, Grupo AMaggi e Marfrig não estão apenas na ponta produzindo carne. Elas já são as maiores no setor globalmente e controlam toda a cadeia produtiva, tornando o Brasil no maior exportador de carne do mundo. Apenas na Amazônia, calcula-se a existência de 70 milhões de cabeças de gado, ou 35% do total nacional. Até 2018, o rebanho deve dobrar no país, elevando ainda mais a pressão sobre a floresta.
Por outro lado, é o setor que está mais visado por organizações ambientalistas e políticas públicas para melhorar sua performance ambiental e implementar certificados de rastreamento de origem. Em 2009, a publicação do relatório do Greenpeace sobre pecuária na Amazônia deflagrou ações do Ministério Público Federal contra produtores ilegais, criando um cadastro de quem está em conformidade com a lei.
No entanto, o fundador e diretor da não-governamental Amigos da Terra/Amazonia Brasileira, Roberto Smeraldi, que esteve em Londres nesta quarta para o lançamento do relatório, defendeu que estratégia de sustentabilidade do setor pecuário no Brasil vá além da elaboração de uma lista-negra de produtores ilegais. Sua opinião é de que deve haver mais incentivos aos produtores para que participem de um esquema de certificação voluntário, no qual haja transparência por toda a cadeia de fornecimento. “Ter uma lista-negra por si só não adianta. Precisamos pensar um sistema de certificação efetiva”, pontuou.
Veja lista de sugestões para um sistema de certificação proposto por Roberto Smeraldi (em inglês)
Próximos passos
A expectativa dos autores do relatório sobre a pegada florestal é de que ao longo dos próximos anos mais empresas vão participar e responder. A informação serviria para desenhar ou melhorar sistemas de certificação de origem de produtos agrícolas. Alguns setores, como o de madeira e soja, parecem estar mais maduros para isso, avalia o relatório. “O setor de biocombustível é decepcionante”, aponta, por outro lado, Liz Crosbie.
A rodada de perguntas em 2010 também deve incluir empresas da China e da Índia, uma vez que são mercados consumidores cada vez maiores. Por parte da empresas brasileiras, houve apenas o comprometimento da Marfrig, gigante do setor de carne bovina, em responder os questionários.
Judson Valentim, chefe-geral da Embrapa-Acre, é um dos autores do relatório Forest Footprint Disclosure e defende nesta entrevista que é possível à pecuária brasileira tornar-se mais sustentável |
Atalho
Relatório completo do Forest Footprint Disclosure
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