Rio de Janeiro – Primeiro dia de setembro. O sol a pino na orla do Rio de Janeiro e um grupo de cerca de 40 pessoas se encontra no final da praia de Copacabana para debater a escolha do Conselho Consultivo do Monumento Natural das Ilhas Cagarras que fica há alguns quilômetros de distância dali. O fato é curioso porque a história revela que a criação de outras Unidades de Conservação ocorre primeiro, para depois chegarem os interessados em colocar esta iniciativa para frente. Mas na Cidade Maravilhosa, o arquipélago que pode ser visto há 5km das areias de Ipanema e Leblon, recebe olhares interessados de vários setores da sociedade.
“É inédito antes de você criar uma UC ter várias pessoas querendo participar, atuar, trabalhar junto desse Conselho. O mais interessante deste grupo é a predisposição ao entendimento e não para o conflito. Temos aqui os aquaviários, os pescadores, a Marinha, os pesquisadores. Isso é o carioca. Que se resolve na conversa nisso que estamos fazendo aqui”, explica Marcelo Pessanha, Coordenador do Regional Rio de Janeiro do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio).
O encontro realizado no Clube Marimbas contou com a presença das três esferas do poder executivo. Entre os membros da sociedade civil, estiveram presentes, ONG’s, representantes dos clubes náuticos e de esportes como canoagem, pescadores e pesquisadores da Uni-Rio, UFF, Jardim Botânico e UFRJ.
A presença no Conselho Consultivo do Monumento Natural significa participar de todas as decisões referentes ao local, daqui pra frente, inclusive o plano de manejo. Ao final das discussões venceu a democracia. Vinte e oito cadeiras foram criadas previamente para que sejam definidas na próxima reunião marcada para o dia 14 de outubro, ainda sem local definido. Sendo nove destinadas ao poder público, cinco para academia, e outras cinco para categoria desportos, onde estão os clubes náuticos, praticantes de esportes na região, duas cadeiras às ONG’s e sete para o setor pesqueiro, sendo cinco delas destinadas aos pescadores artesanais e duas aos pescadores industriais.
Vozes ativas
Todos os participantes tiveram voz. A presidenta da Colônia de pescadores Z-13, Kátia Janine, conta que já esperava esse interesse do poder público pela região há muitos anos.
“Os pescadores são os que têm o maior compromisso na conservação deste Monumento por que nós estamos todos os dias no mar. Com essa parceria com o poder público acredito que as Cagarras terão o valor que merecem. Vamos começar ajudar na renovação e conservação das espécies depois de muitos anos de pesca predatória o que gerou até uma escassez de peixes na região.”
Essa participação ativa na avaliação de Sylvia Chada é muito positiva. Ela é analista ambiental do ICMBio e foi responsável pelo o encontro. “Esse processo de criação de UC com a participação da população, vai evitar que a gente cometa muitos erros passados em que essas unidades eram impostas sem a opinião da sociedade. UC só tem sentido com sociedade. Nem os órgãos dos governos federais, estaduais e municipais sozinhos vão dar conta de cuidar desse patrimônio, enquanto a sociedade não reconhecer o Monumento como algo de sua responsabilidade também” comemora.
Primeiro Parque Marinho do Brasil
Foi há cerca de 70 km da costa baiana que surgiu o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, o primeiro deste tipo no Brasil. A década era dos anos 80, em que não se falava tanto de preservação ambiental, sustentabilidade, aquecimento global e outras pautas que hoje aparecem mais nos noticiários e nas discussões políticas. O atual chefe do parque, Joaquim Rocha Neto conta que se Abrolhos é o que é hoje, muito se deve ao suor de quem apostou que o lugar deveria ser conservado.
“O parque foi criado em 1983, e só no ano de 87 chegaram as primeiras iniciativas para que ele de fato existisse. Por ser uma área militar estratégica, houve muito apoio da Marinha. Mas o início do parque se valeu mesmo pelo esforço pessoal de quem se sensibilizou pela causa. Depois, com o tempo foi que ele se legitimou como instituição”, lembra.
O Brasil tem cerca de 9 mil km de litoral, as Áreas Marinhas Protegidas (AMPs) somam menos de 0,4% de toda a extensão do nosso mar territorial e da Zona Econômica Exclusiva. Apesar da aprovação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) existir através da Lei Nº 9.985 de 18 de julho de 2000, Neto revela que o cuidado com as AMPs é complexo e precisa de ajuda principalmente para a fiscalização dessas áreas.
“O grande desafio do mar é que não podemos delimitá-lo, como se fazem com as terras. A logística de operação é muito específica. Quando alguém está caçando ou derrubando árvores em terra é possível identificar logo, mas como provar que os recursos estão sumindo do fundo do mar?”, questiona Rocha Neto.
Um trabalho de conscientização tem aberto os olhos da comunidade de Caravelas, para a importância da conservação do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. A tarefa encurta as distâncias entre população e a UC.”A sede do parque fica em Caravelas, mas muitos que aqui moram não conheciam a região. Por conta disso estamos promovendo passeios com as lideranças locais para que percebam a riqueza natural que fica ali perto deles. E muitos disseram que depois de conhecerem o parque se sentem responsáveis pela preservação de Abrolhos”.
Responsabilidade que o grupo de cariocas reunidos para discutir o Monumento Natural das Ilhas Cagarras precisarão espalhar para que a Cidade Maravilhosa reconheça mais um cartão postal de sua geografia litorânea.
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