Cancun – Delegados vestidos de ‘guayabera’ (roupa tradicional da Costa do México), sem gravatas, e delegadas em trajes leves de algodão, para poderem debater num ambiente mais confortável e gerar menos emissões pela diminuição no ar condicionado, serão vistos, às centenas, circulando a partir desta semana pelos corredores do hotel Moon Palace de Cancun. As negociações de mudança climática iniciam uma nova rodada na COP16, numa cidade com a temperatura entre 18-27 graus centígrados e a umidade maior de 85 por cento. Cristina Figueres, a nova Secretária Executiva da Convenção sobre Mudanças Climáticas, instou aos delegados a evitar gravatas, como uma estratégia de adaptação climática por parte da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas e seguindo os interesses do México, que quer fazer uma reunião de emissões zero.
Mas, os desafios para Cancun vão muito além do ar condicionado. Durante as próximas duas semanas, os 192 países participantes vão assumir de novo a responsabilidade de salvar o planeta. As chuvas sem precedentes em várias partes do mundo, os verões extremamente quentes e as epidemias de dengue na América do Sul e no Caribe em 2010 expuseram a realidade da mudança climática e a urgência para os países se comprometerem a reduzir as emissões.
Segundo informações da Organização das Nações Unidas para o Ambiente (PNUMA), o ano de 2010 teve um recorde de temperatura, o que ocasionou a redução de 20% da colheita. Daí a urgência de avançar em direção a acordos multilaterais. No entanto, há pouca esperança de que os países desenvolvidos se comprometam na COP16 em metas suficientes de redução de emissões.
Mas outras expectativas pesam sobre Cancun. Será esta a chance de assinar acordos para reduzir o desmatamento? Os países em desenvolvimento terão financiamento para crescer com economias de baixo carbono e para se adaptarem e enfrentarem as consequências que já estamos vendo das mudanças no clima? Em recente coletiva de imprensa na Cidade do México, com jornalistas da América Latina, Cristina Figueres, reconheceu que a COP16 não terá resultados completos, mas enfatizou que, nesta reunião, é necessária a vontade política para traduzir em ações efetivas questões como a proteção das florestas e a adaptação.
“É possível que em Cancun as partes adotem uma fase paralela para começar a criar os instrumentos para trabalhar a questão do desmatamento ao nível nacional”, disse. “Espera-se que os países industrializados capitalizem um fundo multilateral para isso”, continuou ela.
Figueres acha possível na COP16 concretizar um fundo para apoiar os esforços de mitigação e adaptação e a criação de um outro fundo para apoiar o desenvolvimento de tecnologias limpas. De outro lado, segundo ela, está se esperando que os Estados Unidos formalizem a proposta que fizeram em Copenhague o ano passado, de cortar em 17% as emissões, e a China de reduzir as emissões em relação ao crescimento do PIB.
Neste momento as promessas feitas em Copenhague são informais, pois o acordo que foi negociado no ano passado, na COP15, não teve a assinatura de todos os membros e, por isso, não está dentro da Convenção-Quadro de Nações Unidas.
O financiamento, de quem e para quem?
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Na COP15, os países signatários comprometeram-se a destinar um fundo inicial, entre 2010-2012, de 30 bilhões de dólares para ajudar os países em desenvolvimento em adaptação, mitigação e redução do desmatamento (REDD).
Os Estados Unidos comprometeram-se a doar 3,6 bilhões de dólares, a União Européia 10,6 bilhões de dólares e o Japão 11 bilhões de dólares. Mas, até agora, não se conhecem os detalhes do sistema de pagamento ou quem vai receber o dinheiro. Esse é um dos desafios de Cancun.
Especialistas dizem que é necessária a inovação financeira (talvez organizações de microfinanças) para chegar até mesmo às comunidades menores e mais vulneráveis, pois os mecanismos que existem atualmente são insuficientes.
Também é esperada a definição sobre os 100 bilhões de dólares por ano que, segundo o acordo de Copenhague, são necessários até o ano 2020 para combater as alterações climáticas. Ainda não se sabe quem vai fornecer o dinheiro ou para onde vai.
Quanto ao REDD, é esperado um avanço no sistema de financiamento para que esta iniciativa possa continuar.
Segundo Gabriel Labbate, coordenador regional para América Latina e o Caribe da Iniciativa de Pobreza e Meio Ambiente (IPMA) e do Programa ONU- REDD, há várias opções para o financiamento: o mercado de carbono, com créditos; um fundo multilateral financiado pelos países mais ricos ou uma combinação de ambos.
Isso, segundo Labbate, é um ponto de discórdia que ainda existe e que poderia torpedear o processo em Cancun. Além disso, ainda não se definiu como será o monitoramento para garantir a redução do desmatamento. “O REDD vai precisar de um menor custo de transação do que tem os mecanismos de desenvolvimento limpo (MDL) para que seja viável”, disse ele. Mas o REDD já tem uma evolução positiva. A Noruega, juntamente com a Espanha e a Dinamarca, deu 105 milhões de dólares para questões como o fortalecimento da governança (fortalecimento das comunidades locais) e o monitoramento.
Neste 28 de novembro começa a reunião das Nações Unidas sobre alterações climáticas e terminará em 11 de dezembro. Veremos se as centenas de homens e mulheres de todo o mundo, relaxados em seus trajes arejados no calor de Cancun, avançaram nas decisões sobre o futuro do planeta.
*Maria Clara Valencia é jornalista colombiana com estudos em literatura e forte interesse em meio ambiente. Ao longo dos últimos cinco anos, ela trabalhou como jornalista para o jornal El Tiempo na Colômbia. Correspondente de ((o))eco na COP 16
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