Pesquisadores buscam novos indivíduos do passarinho em uma infinidade de fragmentos florestais no norte de Minas e sul da Bahia. “Ainda atemos algumas esperanças de encontrá-lo em algum fragmentos remanescentes do médio Jequitinhonha. Mas é como buscar agulha num palheiro e com o palheiro pegando fogo”, destaca ornitólogo Rômulo Ribon, da Universidade Federal de Viçosa (MG).
A pequena população do pássaro foi registrada pela bióloga Sueli Souza Damasceno, da Universidade Federal de Ouro Preto, durante o curso de mestrado. Encontrar o entufado-baiano foi um grande desafio. Ela precisou se mudar para uma fazenda, onde não tinha sequer uma linha de telefone à disposição, dormir em barracas montadas em velhas casas de fazenda, percorrer trajetos à pé na lama e a cavalo. Isto sem contar as três vezes que topou com jararacas pelo caminho.
Esta grande aventura teve como recompensa um tesouro para quem busca um pássaro raro: ela conseguiu não só encontrar, mas até filmar uma fêmea do entufado-baiano. “Nesse dia, eu nem consegui dormir, de tão excitada que fiquei, queria contar para o Rômulo e amigos, mas nem telefone e net lá tinha. E a filmagem foi perfeita, consegui pegar a fêmea cantando”, comemora Sueli.
Fragmento é rico em biodiversidade: Cuitelão (Jacamaralcyon tridactyla), uma das aves ameaçadas encontradas na reserva.
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O M. stresemanni foi descrito em 1960, a partir de espécimes de museu, mas só em 1995 foi encontrado na natureza, na Reserva Biológica de Una, Sul da Bahia. Apesar de muitas tentativas de reencontrá-lo, só foi registrado novamente quase dez anos depois, em 2004, e por acaso, durante o projeto “Biodiversidade e Conservação nos Vales dos Rios Jequitinhonha e Mucuri”, apoiado pelo Probio no fragmento que fica dividido em terras de três municípios: Bandeira e Jordânia, em Minas Gerais, e Macarani, na Bahia. Foi nesta área que Sueli concentrou suas pesquisas.
Mata dos Passarinhos
Depois de todas estas descobertas, parte deste fragmento, a fazenda Sossego do Arrebol 1, com 392 hectares, foi comprada em 2007, com doações da American Bird Conservancy (ABC), para ser transformada pela Fundação Biodiversitas na Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) da Mata do Passarinho, que só aguarda a averbação do Instituto Chico Mendes para ser oficializada. Algum tempo depois, foi comprada outra fazenda contígua. Infelizmente a reserva, formada pelas duas fazendas, só protege 600 hectares do fragmento, um rico pedaço da Mata Atlântica que abriga 22 espécies ameaçadas. O fragmento foi destacado pela Alliance for Zero Extinctions (AZE) com um dos pontos biodiversos mais ameaçados do planeta.
O gerente da reserva, Alexandre Enout, lembra que quando chegou à reserva, em 2009, encontrou “áreas de pasto recém-abandonadas, uma mata com impressionante qualidade ambiental, mas com sinais de exploração (madeira) e nenhuma infraestrutura”. Desde então, a pressão sobre a mata diminuiu bastante, mas ainda há ações predatórias de caçadores e madeireiros no entorno da reserva. “O fogo também é um sério problema todos os anos”, conta o biólogo.
“Continuam havendo queimadas, pequeno desmates pelas bordas e retirada de toras”, descreve Ribon. “As árvores são cortadas uma a uma, transformadas em pranchões com motosserra dentro da própria mata e arrastadas com juntas de búfalos até a borda da mata, na estradinha mais próxima, onde, após o acúmulo de certo volume são carregadas por caminhão e vendidas ou usadas nas propriedades”, completa.
Uma proposta que já foi apresentada para proteger a área seria a transformar o fragmento em uma uma Unidade de Conservação. Enout acredita que a ideia não encontrará resistência dos proprietários de terras do entorno, porque o que sobrou de mata está em áreas altas e inacessíveis. “Acho que eles veem nisto uma oportunidade para vender a mata, e creio que não haverá resistência”, afirma o gerente da Reserva.
Para que a reserva seja sustentável financeiramente, o plano é desenvolver um plano de turismo. A expectativa é que pelo menos 100 turistas estrangeiros visitem a reserva por ano, quando toda a infraestrutura necessária estiver pronta. “O interesse é principalmente no turismo de observação de aves (birdwatchers), pois lá encontram-se muitas espécies ameaçadas e raras da Mata Atlântica em um só lugar . E o entufado-baiano só existe lá”, esclarece. Enquanto isso, está sendo produzido um Guia das Aves da Reserva Mata do Passarinho.
Salvar o fragmento não basta
As chances do pássaro ser salvo existem, mas a perspectiva é pouco animadora. Ribon afirma ter consultado ornitólogos que juntos já visitaram cerca de 200 fragmentos no sul da Bahia e ninguém viu o bicho. E mesmo assim, para o biólogo, ainda há esperanças. Existem centenas, talvez milhares, de fragmentos de mata primária em fundos de vales nos municípios mineiros de Jordânia e Jequitinhonha, onde existe a possibilidade do pássaro ser encontrado.
Os pesquisadores pretendem retornar às áreas já visitadas por Sueli Damasceno e estender a busca a outras áreas, como a Rebio de Una, onde o bicho foi registrado em 1994. A procura vai incluir também grandes blocos florestais ao sul de Salvador e no Jequitinhonha, pelo menos da cidade de Jequitinhonha para o leste. “Existem ainda centenas ou milhares de fragmentos de floresta primária nos fundos dos vales entre Jordânia e Jequitinhonha que
devem ser vasculhados”, destaca Rômulo Ribon.
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