Reportagens

O desafio de incluir as reservas extrativistas no Cadastro Ambiental Rural

A inscrição é obrigatória para todas as propriedades rurais do país, incluindo terras tradicionalmente ocupadas por populações tradicionais.

Observatório das UCs ·
3 de junho de 2015 · 10 anos atrás

A Reserva Chico Mendes é uma das 89 reservas extrativistas do Brasil. Foto: Aurelice Vasconcelos/ICMBio
A Reserva Chico Mendes é uma das 89 reservas extrativistas do Brasil. Foto: Aurelice Vasconcelos/ICMBio

Após anunciado o adiamento do prazo para o Cadastro Ambiental Rural (CAR), o grande desafio ainda está em cadastrar as 89 reservas extrativistas espalhadas por 17 estados no Brasil. Juntas, elas somam 14 milhões de hectares.

A RESEX é uma área utilizada por populações tradicionais que vivem do extrativismo de produtos da floresta e complementam a renda com a agricultura de subsistência e criação de animais de pequeno porte.

O grande objetivo de uma RESEX é proteger não apenas a natureza, como também a cultura de populações tradicionais através do uso sustentável dos recursos naturais. A reserva extrativista é uma das 12 categorias de áreas protegidas que foram definidas na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), Lei N° 9.985/2000.

Embora pouco se comente, não são apenas os imóveis rurais que devem ter seu Cadastro Ambiental Rural. As terras tradicionalmente ocupadas por índios, remanescentes das comunidades de quilombos e extrativistas também. Ou seja, a inscrição no CAR é obrigatória para todas as propriedades rurais sejam elas públicas ou privadas.

Os ministros do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, anunciaram no último dia 5 de maio a prorrogação do prazo para adesão ao CAR até maio de 2016.

O que é

No fundo, o Cadastro Ambiental Rural, ou simplesmente, CAR, nada mais consiste que o registro público eletrônico das áreas rurais. O grande objetivo é integrar as informações ambientais, por meio de georreferenciamento, das propriedades e posses rurais para fazer uma gestão ambiental e combater o desmatamento.

O CAR é uma ferramenta do novo Código Florestal, que completa três anos. Até agora teve apenas um quarto das propriedades rurais do país registradas e, por isso, seu adiamento pois 4 milhões de propriedades ainda não foram cadastradas. Por enquanto, do que já foi inserido no sistema eletrônico, corresponde a 52% da área, algo considerável.

Mas o desafio ainda é grande, admite Brenda Brito, advogada e pesquisadora associada do Imazon, pois o CAR em si não é suficiente para garantir a regularização ambiental.

“Para as reservas extrativistas, a princípio, o ICMBio é a instituição responsável por inserir os limites das reservas dentro do CAR, já as áreas quilombolas, não existe uma instituição específica. Os quilombolas são uma propriedade de terra privada de uso coletivo”, destacou.

Brito afirma que algumas RESEX já foram inscritas no CAR, mas ainda é uma minoria. “Provavelmente a maioria das áreas ainda não foi cadastrada”, disse ao Blog do Observatório de UCs.

As RESEX ficam sob a responsabilidade do ICMBio, órgão federal que administra as Unidades de Conservação, e é quem deve inseri-las no CAR.

Ainda não se sabe qual seria a melhor estratégia para implantação no CAR das áreas de uso coletivo, como também áreas protegidas de uso sustentável e projetos de assentamentos agroextrativistas.

Em 2014, o secretário de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável do Ministério do Meio Ambiente, Paulo Guilherme Cabral, já defendia a diferenciação das reservas extrativistas em relação às propriedades no campo.

“O CAR das Resex será diferente daquele dos imóveis rurais, por exemplo, por não requerer a identificação da Reserva Legal [área de uma propriedade que deve ser coberta por vegetação natural e pode ser explorada com o manejo florestal] pois toda a área destas unidades é semelhante às reservas legais, tendo restrições de uso”, afirmou Cabral.

O ICMBio tem feito um esforço para atualizar o cadastro das famílias que residem nas unidades de conservação, a maioria localizada na Amazônia.

Ferramenta para preservar a natureza

Reserva Extrativista do Rio Cajari. Foto: Cristiane Gois/ICMBIO
Reserva Extrativista do Rio Cajari. Foto: Cristiane Gois/ICMBIO

Contudo, na opinião da pesquisadora do Imazon, o CAR é uma “ferramenta extremamente valiosa” para a conservação e gestão ambiental. “É justamente uma ferramenta que possibilitará entender o status da gestão ambiental das diferentes propriedades no país. São vários os desafios, pois nem chegamos à fase de validar as informações cadastradas”.

Ou seja, não basta ter apenas o CAR, é preciso ter a sua validação o que significa que técnicos do governo devem confirmar que as informações no sistema são, de fato, verdadeiras.

Em seguida, se elabora um plano de recuperação ambiental para os casos de áreas que precisam restaurar espaços desmatados ou compensar com mais cobertura verde. Tudo isso levará tempo.

O CAR, segundo Brito, poderá ajudar na construção de políticas públicas para monitorar a preservação ambiental e reduzir o desmatamento. “Vai possibilitar fazer um diagnóstico para identificar o passivo ambiental de áreas que precisarão ser recuperadas. Mas a fase de avaliar esses dados ainda não começou”.

Segundo o Serviço Florestal Brasileiro, 1,4 milhão de imóveis rurais estão no sistema nacional. Dos quais, 45% indicaram intenção de entrar em um programa de recuperação ambiental. Contudo, o Serviço Florestal ainda não soube informar quantas reservas extrativistas já tem seu CAR.

Incentivo para reflorestar

Além de ampliar a transparência das informações sobre as áreas rurais e unidades de conservação onde vivem comunidades tradicionais, será preciso criar mecanismos de incentivo para recuperar e preservar as matas nativas. Ainda existe um longo caminho para se definir incentivos econômicos a fim de recompor as florestas nativas.

São poucas as linhas de crédito, como o Fundo Constitucional de Financiamento do Norte FNO-Biodiversidade do Banco da Amazônia, que apoiam empreendimentos de regularização e recuperação de áreas degradadas.

“Provavelmente não é suficiente para cobrir a necessidade. É preciso que existam mais linhas de financiamento e outras formas de estímulo”, comentou Brito.

 

*Este texto é original do blog Observatório de UCs, republicado em O Eco através de um acordo de conteúdo.

 

 

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