Reportagens

Transição para a extinção

Se o Ibama não agir rápido, pode sumir do mapa o raro encontro de Mata Atlântica com Cerrado, Mata de Cocais e Caatinga que ocorre numa pequena área do Piauí.

Carolina Mourão ·
16 de dezembro de 2004 · 20 anos atrás

No clima ameno das Serra dos Matões, no Piauí, a 740 metros acima do nível do mar, existe uma região de transição que reúne, num pequeno espaço, vários biomas brasileiros. O lugar precioso foi identificado no final de 2002 e está criticamente ameaçado pela retirada de lenha. O Ibama adia há mais de um ano uma visita ao lugar.

Na cachoeira do Salto, localizada no município de Pedro II, é possível tomar banho e apreciar, a menos de 100 metros de distância um do outro, a Mata Atlântica, quatro paisagens de Cerrado, a Mata de Cocais e a Caatinga. Em alguns trechos, tudo isso se mistura. Há também espécies híbridas, que são naturais de dois tipos de vegetação. É o caso das de algumas mini-orquídeas ainda desconhecidas pela ciência, que estão sendo catalogadas por biólogos da região.

Outra descoberta foram três espécies de bromélias, das menores do mundo, que não alcançam o tamanho de um indicador humano. Dois exemplares dessas espécies já haviam sido registrados, mas na Bahia e no Rio de Janeiro, lugares úmidos, diferentes da árida região do Piauí onde foram novamente identificadas. Os pesquisadores ainda não sabem explicar como essas espécies sobrevivem à falta de umidade da região. O pedaço de Mata Atlântica encontrado ali, tipicamente úmido, é o única registrado em todo o estado. A floresta teria desenvolvido uma “couraça” para evitar evaporações, mas não se alterou nas características primárias. Uma das teorias é que este trecho de mata seria uma reminiscência de uma antiga formação vegetal que não é mais característica de lá. Érico Gomes, geólogo e presidente da Fundação Grande Pedro II, coordena um trabalho de pesquisa e promoção do desenvolvimento sustentável nos municípios de Pedro II, Milton Brandão, Domingos Mourão e Lagoa de São Francisco.

A maior ameaça a este pequeno tesouro natural é a ocupação irregular e a retirada de lenha para consumo caseiro. Os municípios são pobres e a renda per capita das populações é uma das mais baixas do país. As pessoas que moram um pouco mais longe não têm, por exemplo, dinheiro para comprar um botijão de gás, muito menos um fogão, que chega a ser ambição de vida. A cada dia que passa, povoados periféricos destes municípios se aproximam mais da região que deveria estar preservada. Érico garante que em menos de um ano a área deve ser toda desmatada se, até lá, o Ibama continuar postergando a visita e a criação de um Parque.

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